Amadis de Gaula - Parte III
RIMANCE III
De como Amadis chegou ao Barro Branco e derrotou o gigante Dardán, tornando-se Rei. E de como surgiu a União Sagrada
Amadis e Aleixo viram
O reino um pouco distante.
Porém se deram com gente
Na vista logo adiante.
Um silêncio prosseguiu,
Ao romper daquele instante.
Então uma voz cortou
Silêncio tão imponente:
“- Quem são os tais cavaleiros
Que estão bem a minha frente?
Preciso danar-lhes pólvora
Ou vão dar de penitente?”
Era um grupo bem armado
Formado por bandoleiros.
O líder que lhes falara
Era um bruto cavaleiro.
Amadis com atenção
Lhe foi muito lisonjeiro:
“- Bom dia, bravos senhores,
Senhoras que vêm em bando.
Me chamo Amadis de Gaula
E ao reinado vou chegando.
M’amigo se chama Aleixo
E que vem me acompanhando.”
O líder do bando tinha
Uma lente em sua mão.
Era um simples par de óculos,
Um objeto de feição.
Com voz firme, já brejeira,
Disse que era Lampião.
“- Sou um renegado, filho,
E tomo rumo na vida.
Vou com os meus nas paragens
Com a alma perseguida.
E o que queres neste reino
Que te fez tomar partida?”
E Amadis foi respondendo:
“- Busco por meu pai, um rei.
Dizem que ele tem sumido
Pelas serras, não bem sei.
E aqui faço já chegada
Pra saber o que saberei.”
O bando riu-se demais,
Inclusive Lampião:
“- Então és um dito príncipe,
Cujo pai não tens noção?
És um errante bastardo,
Que deseja algum tostão!”
O bando caiu-se em risos
Junto com seu comandante,
Que ao ver escudo de Gaula
Inda emendou ignorante:
“- E tem um milho com folhas
No seu escudo galante!”
Aleixo Peito-de-Pombo
Tomou as dores do amigo:
“-Respeitem a flor-de-lis
Senão os ponho em jazigo.”
Lampião se defrontou
Com iminente perigo:
“- O senhor, me chama à faca,
Cavaleiro mais mofino?”
Aleixo peitou o cabra,
E disse sem desatino:
“- Se quiser escolha um seu
Para encontrar bom destino.”
Lampião sacou punhal
E foi riscando seu chão.
Olhou bem para Amadis
E disse com precisão:
“- Qual dos dois é mais afoito
Para cortar Lampião?”
Aleixo se adiantou,
Mas Amadis disse: “- Calma.
Antes de ofender a ti,
Ele me feriu a alma.”
E a Lampião foi dizendo:
“- Contigo, me lanço à palma.”
Lampião puxou punhal,
Amadis a sua espada.
Num instante aqueles dois
Cortaram em navalhada
O vento daquele dia,
No rebentar da alvorada.
E foi duelo medonho
Cada qual com seu partido.
Lampião com seu punhal,
Espetava sem alarido.
Enquanto Amadis travava
Qualquer golpe mais temido.
Amadis girava a lâmina
Lampião escapulia
Como fosse um vil demônio
Pulando com agonia
O cruzado dava golpes
O cangaceiro sumia!
Lampião era mais rápido
E assim se danava em dança.
Um mocó maldiçoado
Cheio de gesto e pujança
As chinelas se arrastando
Parecia até festança!
Mas Amadis tinha técnica
E dotou de presunção,
Quando aquele cangaceiro
Fez um giro com a mão
Amadis com jeito e força
Lhe tirou o seu facão.
Lampião foi desarmado
A cabroeira temeu.
Mas Amadis cheio d’honra,
Ao chão seu florete deu.
A espada lá encravada
Demonstrou seu jubileu.
Quando se esperava um choque
De uma luta corporal,
Lampião se ajoelhou
Sem esconder o bornal.
Algo tinha visto o cabra
Pra ficar do jeito tal.
“- Amadis, nobre cruzado,
Perdão peço desde já.
Pois já vejo que não mente
Sobre por que vem pra cá.
Esta é a primeira vez
Que um rei a me ver está.”
Lampião dissera isso
Porque olhara a espada.
Visto o nome Perión
Notou postura maldada.
E para os dois cavaleiros
Se fez pessoa educada.
“-Amadis, nobre cruzado,
Seu pai tem o meu respeito.
Agora entendo seu trato,
Não lhe tratei por direito.
Peço perdão ao senhor,
Porque só mostrei despeito.”
O cruzado perdoou
Por todo aquele engano.
Lampião contou depois
Sobre o castelo e seu dano.
E disse: “- Um gigante aí
É quem se diz soberano!
É chamado por Dardán;
É tão alto quanto igreja.
Escravizou todo povo
Para lhe fazer cerveja.
Matou anciãos, profetas
Sem mesmo chamar peleja.”
“- Há quanto tempo ele está
Tratando as gentes assim?”
“- Desde que seu vô morreu
E não se seguiu Delfim.
Então ele apareceu
E se fez de rei por fim.”
“- Então meu pai não voltou
Para assumir a coroa?”
“- Nem ele nem sua mãe
Nos compartilham a loa.”
Então Amadis se fez
D’ave que bem alto voa!
Ele decidiu reaver
O seu reino por herança.
Lutaria com quem fosse
Não mediria balança.
Ao povo contra o gigante
Ele daria vingança.
Quando entraram nos portões
Eles puderam mirar
O que o gigante Dardán
Só fez para maltratar
Um reino pobre e sem vida
Estava a se apresentar.
Amadis disse a Aleixo:
“- Não necessito de ajuda.
Vá ajudar as pessoas
Que querem que alguém acuda.
A terra do rei, meu pai,
Não ficará mais muda!”
E partiu dali sozinho
Para travar seu duelo.
Encarar o vil Dardán
Para pô-lo no chinelo.
E tomar de volta o reino
Pra deixá-lo sempre belo.
Enquanto o cruzado ia
Encontrar-se c’o gigante,
Aleixo com Lampião
E seu bando militante
Passaram pelos cafofos
A dar aviso constante:
“Amigáveis cortesãos,
De suas casas já venham,
Pois um nobre cavaleiro
Não deseja que retenham.
Matar o gigante irá
E alegrias quer que tenham!”
Aleixo dissera ao cabra
Qu’isto devia ser dito.
Lampião não entendera;
O visou muito maldito.
Porém, Aleixo insistira
E o disse seguindo o rito.”
As pessoas então foram
Contudo, com certo espanto.
Nunca alguém tivera ousado
Desafiar tal quebranto.
Aquele gigante estava
Ali, por algum encanto.
Em verdade, o mago velho,
Arcalaus, assim fizera
Para conter Amadis
Colocou ali a fera
E retirá-la dali
Amadis então quisera.
O gigante residia
Num castelo monstruoso,
Que mais da metade do
Reino era seu lar pomposo.
À porta o cruzado foi
E se mostrou corajoso.
Aquele castelo tinha
Duzentos metros de altura.
A porta tinha uns oitenta
Sem contar sua largura.
Dardán era tão imenso
E Amadis a tanajura.
Quando o gigante saiu,
Amadis subiu um monte
Só para encarar Dardán,
Vendo-se desafiante.
O gigante ao ver o bravo
Riu-se sem ser hesitante.
“-Então és tu Amadis,
Que dizem ser vencedor,
Que derrotou Endriago
E a Quimera com valor,
Herdeiro de Perión
E deste reino senhor.
Saiba desde já, cruzado,
Que invencível eu sou.
Não temo a tua postura
E vencer-te assim me vou.
Posso te amassar agora,
Já que pra isso aqui ‘stou.”
“- Então, arme-se do jeito
Que convier desejar
E vista sua armadura
Para comigo lutar.
Armado aqui já estou
Para o meu reino tomar.”
Dardán vendo seriedade
Nas palavras do cruzado,
Decidiu então lutar
Em pouco tempo esperado.
Em uma hora teriam
Seu confronto começado.
Amadis desceu o monte
E surpreso então ficou
Quando viu a multidão
Que por ali se formou.
E olhando aquele furdunço
Para Aleixo perguntou:
“- O que estas pessoas fazem
Por aqui perambulando?”
Lampião disse ligeiro:
“- Eu fiquei foi estranhando,
Mas Peito-de-Pombo aí,
Disse: “ – Faça o que eu lhe mando!”
Amadis se chateou,
Mas Aleixo fez seu uso:
“- Amadis, tu deves já
Deixar de ser um difuso.
Conheça todo este povo
Não o trate com abuso.”
O cavaleiro sentiu
Naquela prosa razão.
Apresentou-se ao seu povo
Lhe mostrando o coração.
E discursou desse jeito
Que agora faço menção:
“Ó povo do Barro-Branco,
Sou Amadis, cavaleiro.
Sou filho de Perión
E de nosso reino herdeiro.
E vim libertar a todos
Deste cárcere caseiro.
Se caso vença Dardán,
Somente aqui ficarei.
Preciso que bem me ajudem
Na luta que travarei.
Caso estiverem comigo,
Digam, e terão um rei!”
A multidão festejou
E dez homens se chegaram.
Eram os bravos do reino
E para Amadis juraram
Estar com ele na luta
E deste jeito ficaram.
Amadis traçou um plano
Para o gigante vencer.
Chegando-se para Aleixo,
Ele foi logo dizer:
“- Obrigado, meu amigo,
Por do conselho valer.”
O cruzado percebera
De seu amigo intenção.
Aquele conselho era
O segundo do jargão:
“A inteligência de um rei
É ter no povo um irmão.”
E chegada deu-se a hora
Do duelo perigoso.
Amadis subiu o monte
Como um bravo corajoso.
Uma longa corda tinha
Nas mãos seu véu belicoso.
Na ponta daquele monte
Ali Amadis ficou.
Mal Dardán pôs-se em combate,
O cavaleiro atacou.
E entrando no seu nariz
A peleja começou.
Amadis fora mui rápido
E com um simples arpão
Furou nariz do gigante
Saindo pelo outro então.
E desceu puxando a corda,
Prendendo aquele vilão.
Dardán ficou com a corda
Bem presa no seu nariz.
Parecendo um bicho preso
Com postura da infeliz.
As duas pontas da corda
O povo puxou feliz.
Ajudado pelos homens,
Os dez que ali se chegaram,
Amadis mais o seu povo
O tal gigante fisgaram.
Dardán já lacrimejava
Quando aqueles o puxaram.
E o gigante veio a chão
Num estrondo insuportável.
E num pronto de magia
Aquele ser condenável,
Tornou-se cinzas medonhas
De uma maneira implacável.
Na noite daquele dia
Explodiu-se a emoção.
Houve bastante festança,
Também comemoração.
E Amadis foi aclamado
Um rei por coroação.
Ela fora feita pelo
Monsenhor Lins que passava
Por viagem pelo reino
E ao Manjoléu viajava.
Um reino não muito antigo,
Mas que amigo já ganhava.
E o rei nomeou a guarda
De Cavaleiros Reais.
Nomeou Aleixo com
Aqueles dez homens mais.
Juntos juraram ao reino
Serem cruzados leais.
Mas o rei Amadis tinha
Alguém em seu pensamento.
“- Por onde andava Oriana
Ali naquele momento?”
Amadis quis procurá-la
Mas Aleixo deu portento:
“- Majestade, há um problema,
Que se faz como um quebranto.
Quando vencemos Dardán
Em ti caiu um encanto.
Terás de ficar aqui
Reinando neste teu canto.
Arcalaus tivera o feito
Por das dúvidas, as vias.
Ele quer o senhor longe
De D’Avelós por mil dias...”
... E assim Amadis reinou
Barro Branco por mil dias.
O Reino do Barro Branco
Tornou-se um reino distinto.
Lá, eram só alegrias,
Sobre as quais eu sequer minto.
Com muitos reinos fez coro,
Mas com um, não teve tinto.
Esse reino era Calais,
Regido por Galaor.
Que só tinha em Amadis
Inveja, raiva e rancor.
Pois Oriana por Gaula
Preservava seu amor.
Foi quando num certo dia
Dom Amadis recebeu
Uma carta perfumada,
Oriana que escreveu!
Ela narrou como estava
Mais o que se sucedeu.
Dizia: “- Meu Amor, soube
Que te tornaste um bom rei.
E que não vens a me ver
Por um mal que já o sei.
Rezo a Deus que te abençoe,
Porque sempre te amarei.”
Essa carta de Oriana
Chegou depois de passados
Cerca de oitocentos dias
Após o reino empossado.
Amadis não via a hora
Pra tornar-se homem casado.
Porém, cem dias após
Ler a carta de Oriana.
Amadis fora chamado
A prestar arte mundana.
Calais decretou a guerra
Àquele reino bacana.
Deu-se um tal de um fuzuê
No castelo de Amadis.
A nobreza se avexava
Por armas nada sutis.
Os cavaleiros reais
Foram mais que homens gentis.
E assim cem dias se foram
Passando rapidamente.
Entretanto, o Barro Branco
Não dispôs de contingente.
O exército de Calais
Dotava de muita gente!
À manhã daquele dia,
Dom Amadis liderou
O seu pequenino exército
Que de bravura dotou,
Sem temer e sem fugir
Para a campina marchou.
Lá já estava Calais
Com quarenta mil soldados
Mais cavaleiros e feras
De corpos mais que dobrados.
A batalha começou
Sangrenta para ambos lados.
O exército de Calais
Logo tinha mais vantagem.
Galaor o liderava
Sem lhe discorrer bobagem,
Barro Branco já temia
Por aquela desvantagem.
Cavaleiros detonados
Por pedras cruzando o ar.
Flechas ferindo os escudos,
Mas ligeiras em matar.
Espadas cortando gente
Prontas a decapitar!
Era um cenário de horror
Que se via nessa terra.
Um reino já quase extinto
Pela lâmina que cerra
Sem piedade e sem justiça,
Sem perdoar se alguém erra.
Amadis de poucos homens
Dotava para lutar:
Os cavaleiros reais
E soldados por contar.
Galaor via-se rei
De mais um novo lugar.
Eis que surge no horizonte
Dez legiões bem armadas
A defender Barro Branco
Com seus escudos e espadas.
Quatro reinos amistosos
Tiveram dores tomadas!
Os soldados de Guirlanda
A mando do Duque Adão,
A Ordem do Setestrelo
Do Manjoléu de Dom J’ão,
Os vaqueiros de Canudos
De Conselheiro a menção.
Porém, outro grupo viu-se
Tornando viva a lembrança.
Um grupo menor, mas bravo
Que o tempo prediz bonança:
Senhor El-Rei Carlos Magno
E os Doze Pares de França!
Os Doze Pares de França
Eram cruzados incríveis.
Sem ter medo dos malogros
Se mostravam invencíveis.
Eram Roldão, Oliveiros,
Guarim e Gui, os temíveis.
Também Gerardo, Ricarte
Tietri, Bosim mais Urgel.
Todos eram conhecidos
Por um tratado fiel
Com eles ainda vinham
Nemé, Lamberto e Hoel.
E a guerra ficou honesta
Pelo número de soldados.
Agora lá guerreariam
Sem serem injustiçados.
Aquela União Sagrada
Deixou povos admirados!
E antes que o dia findasse
A União Sagrada fez
Jus ao nome que foi dado
Sem abater sua tez.
Barro Branco estava livre
Para reinar outra vez.
E por encerrada a guerra,
O Duque Adão logo quis
Pôr o Reino da Guirlanda
Na coroa de Amadis:
“- Lá também um rei não há
Por ele o melhor eu fiz.”
Mas Amadis recusou
Por nada compreender:
“Como ganhar esse reino
Se não fiz por merecer?”
Carlos Magno riu-se muito:
“- O porquê vou lhe dizer:
Esse Reino da Guirlanda
Ainda tem dinastia.
Ela se chama por Vega
E tem tradição tardia.
Dona Elisena, rainha
Desse tal reino seria.”
Após ouvir esse nome
“Elisena”, o cavaleiro
Cutucou sua lembrança
E falou ao companheiro:
“- O reino de minha mãe!”
E chorou-se por inteiro.
Assim o Duque Adão quis
Resolver logo falar:
“- Esta guerra, meu senhor,
Serviu-nos para acabar.
Um rompimento de anos
Para um novo rei buscar!”
Amadis lembrou-se então
Do que lhe dissera Urganda:
“Unir reinos inimigos
Barro Branco e a Guirlanda.”
E Amadis também pensou:
“E ela por onde anda?”
Urganda estava por lá
E riu-se também do rei.
E nesse instante surgira
Alguém que já narrarei,
Galaor, muito ferido,
Disse: “- A ele falarei.”
Todos por ali ficaram
Com tal rei emocionados.
Embora Galaor fosse
Um homem não muito honrado,
A história de Calais tinha
O seu passado ilustrado.
E Galaor de Calais
Para Amadis indagou:
“- Inda amas Oriana
Ou teu amor se acabou?”
Amadis bem respondeu:
“- Ele nunca vacilou.”
Assim Galaor seguiu:
“Então volte para ela.
Vá salvar a tua terra
Para ter o reino dela.
Pois Arcalaus já comanda
Espalhando vil querela!
Oriana o ama, rei
Amadis Vega de Gaula.
Siga pra Del Avelós
E a retire dessa jaula.
Vá. Ensine a Arcalaus
Uma belicosa aula!”
E dando um último fôlego
Galaor caiu já morto.
Seu corpo foi enviado
Por um navio do porto.
Em Calais foi enterrado
No Real Sagrado Horto.
A União Sagrada foi
Seguir nova expedição
Depois de colher despojos
Daquela guerra de então.
Libertar Del Avelós
Era mais nova missão.
Dom João e Duque Adão
Carlos Magno e Conselheiro,
Todos juntos c’Amadis
Partiram mais que ligeiro.
Eram trinta e cinco mil
Homens rumo ao estrangeiro.
Depois de já quase um mês
Em Del Avelós chegaram.
As legiões de descanso
No momento precisaram.
Foram dias mui ruidosos
Aqueles que se passaram.
Ainda naquela noite
Rei Conselheiro ordenou
Dois vaqueiros de Canudos
Visarem o que restou
Do reino Del Avelós
E de como ele ficou.
Foram Sinhô Chico Tripa
Mais Julião dos Gambás.
Chegando lá os vaqueiros
Observaram coisas más.
Ao voltar para o reduto
Reportaram com seu ás:
“- Lá, tudo é sinistro e fosco
Vivalma não encontramos.
As pessoas ‘stão trancadas,
Pois têm medo, assim achamos.
Arcalaus prendeu o rei
E a princesa não visamos.”
Amadis se preocupou,
Mas lembrou bem Dom João:
“- Se estivesse morta, a nova
Saberíamos então.”
Carlos Magno completou:
“- Tracemos a revolução!”
Então todos decidiram
Agir com honra e direito.
Mandaram dois diplomatas
Para agir com nobre eito.
E Roldão mais Oliveiros
Seguiram bem do seu jeito.
Duas horas depois, eles
Voltaram malassombrados:
Os dois falar não podiam;
Estavam mal encantados.
Até que Peito-de-Pombo
Fez daqueles dois curados.
Então, Roldão foi dizendo:
“- Ele logo concordou,
Diz que vencer Amadis
É o que sempre esperou.
E disse que D’Avelós
O seu rei se proclamou.
Ele marcou a batalha
Para o meio-dia então.
Tem cinquenta mil soldados
Todos são assombração.
Meus senhores, não sabemos
Como vencer tal questão.”
Todos os reis mais o duque
Ficaram mui desolados.
Foi quando Peito-de-Pombo
Os deixou bem avisados:
“Deem-me seus atributos
Para deixá-los sagrados.
Nos Cavaleiros Reais,
Temos o padre Tomé.
Ele pode abençoar
Pois é sacro pela fé.
Com água benta nas armas
Podemos vencer ralé.”
As armaduras e espadas,
Escudos, lanças, cavalos,
Cavaleiros, elmos, facas,
Adagas, flechas e calos
Tudo foi abençoado
Para o Senhor ajudá-los.
E antes da manhã raiar
Um Padre-Nosso rezaram.
Armaram-se pra batalha
E preparados ficaram.
Os taludos cavaleiros
Aquele monte ocuparam.
O exército D’almas Mortas
Emergiu como fumaça.
O falso-rei Arcalaus
Era um gênio de trapaça.
Covarde tivera sido
Por não mostrar sua raça.
E a batalha começou
Ao pino do sol reinante.
A União Sagrada tinha
Um inimigo gigante.
D’almas Mortas maioria,
Porém também vacilante.
Amadis correu ao centro
Com seu cavalo Vizir.
Num flanco, Magno e Adão
No direito por seguir.
No esquerdo Dom João
E Conselheiro a tinir!
D’almas Mortas tinha um líder
Por Madarque era chamado.
Entidade tenebrosa,
Detentora de um machado
Com Amadis ele teve
Um duelo disputado.
Carlos Magno disputou
Com o temido Dragão,
Cavaleiro desdenhoso
Que um dia fora cristão.
Mas se vendera ao diabo
Por um saco de tostão.
Duque Adão travou a luta
Com o sinistro Tropeiro.
Assaltante das estradas,
Um maldito cavaleiro.
Em vida, fora assassino,
Mas morto por bandoleiro.
Conselheiro lutou com
O demônio do Encourado.
Cangaceiro cabeludo,
Porém sem-fé no roçado.
Nas caatingas do sertão
Teve seu corpo queimado.
E Dom João guerreou
Com o demônio Dinato.
Invejoso dos humanos,
Um ente muito do ingrato.
Junto com o Belzebu
Mostrou-se muito insensato.
As espadas se batiam
Dando no ar um corisco.
Os escudos defendiam-se
Das lâminas e seu risco.
Não havia quem danasse
Como fosse pinto em cisco.
As almas penadas iam
Se sumindo pelo ar.
Ao terem corte mortal,
Choravam com o queimar,
Que a água benta danava
Com acidez de amargar!
Muitos cavaleiros foram
Mortos por aqueles entes.
Mas a guerra parecia
Não ter os seus “finalmentes.”
Tudo ainda se guardava
Nos lances dos entrementes.
O arrebol já se lançava
No céu com vermelhidão.
O lusco-fusco chamava
A noite lhe dando a mão.
Ventos traziam o cheiro
Do sangue posto no chão.
Recife, 05 de setembro de 2010.