ODE AO CHINELO DE COURO

Eu não gosto de sapato

Pois sendo um bom nordestino

Não encontro no meu tino

Um só motivo sensato

Pra usar este artefato

Que tanto meus pés maltrata.

Eu sou mais minha alpercata

Com duas tiras de couro

Tiradas do melhor touro

Da minha zona da mata!

Eu não sou um burocrata

Pra ter nos pés um sapato

E para ser mais exato

Não vejo coisa mais chata

Nem ação mais inexata

Do que no calor da peste

Do mormaço do nordeste

Um caboclo se vestir

Com sapatos pra sair;

Isso é coisa pro sudeste...

Donde eu vim, homem se veste

Nos moldes de lampião

Onde o pé que toca o chão

De “percatas” de reveste.

Meu apreço é inconteste

Pr’essa veste que figura

Nos pés da nossa cultura

No andar do nosso povo

Por isso digo de novo

Sapato não me fulgura!

E que digam ser loucura

Essa minha posição

Qu’eu digo de supetão

- Desculpe a minha postura

De não seguir ditadura

Dos costumes de outrem

E ainda vou além

O meu chinelo de couro

Nem num sapato de ouro

Eu não troco com ninguém!

E você por que não vem

Descalço de obrigação

Pra sentir a sensação

Que da “percata” advém?

Dispa os seus pés também

Dê-lhes um respiradouro

E descubra esse tesouro

Da cultura nordestina

Que pro mundo se empina

Sobre um chinelo de couro!

João Pessoa, 11/10/2010.