Amadis de Gaula - Parte II

RIMANCE II

De como Amadis de Gaula travou sua primeira batalha com Galaor de Calais, noivo de Oriana, e embrenhou-se no distinto Reino da Pedra Fina, onde encontrou três magos e a terrível Quimera.

No reino Del Avelós

A notícia se espalhou.

Dom Lisuarte ligeiro

A sua guarda ordenou

Buscar Amadis de Gaula

Pois sua filha raptou.

Galaor de Calais, príncipe

Prometido ao casamento,

Jurou desde já a morte

Para o jovem de talento.

Ele recebeu do ódio

Esse desejo avarento.

A guarda real partiu

Com cento e vinte soldados

Mais quarenta cavaleiros

Muito bem orientados.

Por Galaor, o tirano,

Eles eram comandados.

Em terras muito distintas

Oriana e Amadis

Batalhavam contra o tempo,

Um senhor muito infeliz.

Corriam pelas veredas

Com a vida por um triz.

Os amantes viram terras

Por eles desconhecidas.

Vilas, cidadelas, praças

Lembradas ou esquecidas,

Onde a morte castigava

Uma montanha de vidas.

Mas depois de cinco luas

Toda paz foi abalada,

Os cruzados Del Avelós

Cruzaram em disparada.

O casal de jovens viu-se

Com a vida encurralada.

Oriana e Amadis

Com o cavalo Vizir,

Dispararam pelas matas

Que se fizeram por vir.

Mas Galaor e os demais

Tinham sentença a cumprir.

O grupo de cavaleiros

Estava disposto então.

Lá estavam José Carlos,

Neto de Souza Leão,

Eduardo de Borgonha

E os filhos de Catão.

Havia também Lisandro,

Filho de Luiz Pereira,

Anrique de Souza Costa,

Luciano d’Oliveira,

Seu Eliezer do Monteiro

E Juvenal de Figueira.

Todos natos cavaleiros

Cuja honra têm prezado,

Vinham ali desbravando

O relevo castigado

Às ordens do rei senhor

Que estava contrariado.

Não demorou muito para

Que o casal eles visassem,

Desciam uma ladeira

Com o vento onde passassem.

Galaor inda de longe

Pediu para que parassem.

Mas Amadis preocupado

Com Oriana seguiu

Não tomou conhecimento

Daquilo que bem ouviu.

A sua mulher consigo

Era o melhor, consentiu.

Então eles embrenharam-se

Numa floresta fechada,

Amadis acreditou

Numa fuga calculada:

“- Escondidos nessa mata

Eles não acharão nada.”

Mas o ledo engano deu-se

Como o pior dos temores,

Os cavaleiros com flechas

Machucavam os amores

De Oriana e Amadis,

Sendo malvados senhores.

Até que no triste passo

Com a fuga interrompida,

Amadis prezou por tudo

Pela de Oriana a vida

Pois já sabia direito

Que não havia saída.

Sem poder mostrar reação

Amadis abaixou guarda

Oriana foi rendida

Por uma mão desarmada.

Mas pela ordem do príncipe

Teve de ser amarrada.

Nesse instante de tensão

Galaor assim falou:

“- Amadis, à tua vida

Sessenta mil-réis eu dou,

Quem aqui dos cavaleiros

Esse dinheiro ganhou?”

Galaor perguntou isso

Cheio de grande ironia.

Como nenhum cavaleiro

Prezou a tal “ousadia”,

O príncipe de Calais

Aumentou sua quantia:

“- Quem de vocês cavaleiros

Somará bastantes réis?

Pois aumento minha conta

Para além dos coronéis.

Quero a vida de Amadis

Por trinta contos de réis!”

Mas nenhum daqueles homens

Moveu um dedo da espada.

Foi quando um desses honrados

Teve a palavra falada

Anrique de Souza Costa

A Calais disse guinada:

“- Ó senhor meu príncipe,

Nós, cruzados, temos fé

Só em Deus e Jesus Cristo

E no qual nosso rei é.

Nossa promessa costura

Laços de Deus com José.

Não sujaremos as mãos

Para matar um de nós.

Amadis é nosso irmão

E disso temos retrós.

Se quiser assim o faça

Que os deixaremos a sós.”

Os cavaleiros soltaram

Suas espadas no chão.

Oriana estava presa

Sem buscar consolação.

Foi quando Dom Galaor

Desceu de seu Alazão.

O príncipe de Calais

Dotando uma má figura,

Segurou sua bainha

Com confiante estatura

Dela retirou o brilho

Duma espada na cintura.

Amadis ficou sereno,

Na sua vez calmamente,

Sacou a espada Gaula

Em grande gesto imponente

O homem da flor-de-lis

Tinha um florete luzente.

Os rapazes se apearam

Com estudo e maestria.

Eram mestres no tratado

De domar escuderia

As espadas tudo cortam

Sem contestar alforria.

Galaor abriu ligeiro

Rasgada certeira enfim,

Amadis defendeu golpe

Com ataque mesmo assim.

Depois deu um chute forte

Que Calais quase tem fim.

Amadis se sobrepôs,

Mas Galaor revidou

Com um soco bem no rosto

Que por pouco não sangrou.

Calais partiu para cima

Mas de Gaula o esmurrou.

Calais recobrou juízo

E disse: “- Amadis, venha

Com sua técnica chula

Aprendida nessa brenha.

Daqui sairás para morte

Fazer-te o que lhe convenha.”

Amadis assim lhe deu:

“- Cante já sua vitória,

Pois sonhar não custa nada

Cada um tem sua história.

Não quero feri-lo, siga

Seu caminho sem vanglória.”

Galaor muito irritou-se

Com aquela proseação.

Partiu com toda brabeza

Guardada no coração.

Tentou ferir Amadis

O derrubando no chão.

Calais pisou-lhe no rosto,

Amadis se comprimiu

No tempo que Galaor

A ponta de luz tiniu.

De Gaula com sua astúcia

A perna do outro feriu.

Calais recuou fraco,

Mas o ódio levantou

Seu corpo com ruindade

Que ninguém jamais mirou

E num gesto alfineteiro

Seu rival logo acertou.

Os senhores gladiavam

Com a macheza a limpar.

De Calais pela mulher

Que Amadis veio roubar.

E este porque Galaor

Não o deixou se casar.

Ambos tinham seus orgulhos

Feridos como assim tingem

A couraça d’ hombridade

A qual os homens não fingem.

E lavar essa desonra

É dever que os nervos cingem.

Galaor soltava a lâmina

O escudo de lis vinha,

A faísca se soltava

Com um frio na espinha

Assim ficava Oriana

Na tremedeira que a tinha.

Ambos caíram sangrando,

Suas armas já saindo

Das mãos agora dormentes

Com as vistas se esvaindo.

Foi quando Dona Oriana

Um mal-estar foi sentindo.

Oriana passou mal

E por ali desmaiou.

Os cruzados a levaram

Como seu rei ordenou

Calais também foi levado

Só Amadis que ficou.

Os cavaleiros saíram

Cabisbaixos e abatidos.

Queriam ajudar Gaula,

Porém partiram sentidos.

Só mais tarde alguns dos mesmos

Se deram arrependidos.

Naquela noite de tropas

Mais sombrias que o costume

Seu Eliezer do Monteiro

Em casa acendeu seu lume

Sob a luz de um lampião

Rezou com bastante aprume.:

“- Virgem Maria da Glória,

Concedei por meu irmão,

O cavaleiro Amadis,

Um valoroso cristão.

Para que ele não faleça

Nesse tratado de então.

Proteja-o, Santa Mãe

Das pessoas desta terra,

Para que ele não carregue

O cajado de quem erra

Pelos sertões e os agrestes

Que ligeiro nos enterra.”

Amadis só despertou

Quando a noite era uma idosa

Os ferimentos profundos

Danavam a dor maldosa

Com muita dificuldade

Seguia via ruidosa.

A noite cambaleava

Com seus perigos e entranhas

Muitos uivos assombrosos

De extravagância tamanha

Por entre a floresta escura

Onde nenhum homem se acanha

Amadis se rastejava

Por lá vagarosamente

A febre lhe dominava

Por demais, muito veemente.

Fraco, abatido e sangrando

Ele se desfez doente.

No palor daquela noite

O cavaleiro caiu

Teve sonhos, pesadelos,

Algo que jamais sentiu.

E num delírio medonho

Rapidamente esvaiu.

Acordou dali por mais

De três noites e três dias.

O corpo quente de febre

Remexer-se mal podia.

Mesmo assim, seguiu seu rumo

Da tal maneira que havia.

Somente Vizir estava

Com o valente cruzado.

Tinha ficado c’o dono

Fielmente lado a lado.

Mas juntos os dois agora

Tinham um rumo tomado.

Chegaram a uma casa,

Mais parecia tapera.

Amadis estava fraco,

Pois mal sabia quem era.

Foi salvo por três senhores

Que temiam a Quimera!

Ali Amadis foi visto

Por remédios naturais.

Eram ervas e raízes

Em seus chás descomunais

Que, no passar de um só dia,

As forças eram normais!

O herói acordou cedo,

Saliente e bem disposto.

Os três senhores contentes

Daquilo tiveram gosto.

Contaram que muitos dons

Nos seus chás haviam posto.

Amadis estava forte,

Já um novo cavaleiro.

Em seu bornal inda havia

Um quão pouco de dinheiro.

Porém, aqueles senhores

Rejeitaram por inteiro.

Disseram: “- Nós sabemos

Quem tu és, nobre Amadis.

E em vez de aceitarmos isso,

Faremos de ti feliz

Com esses três conselhos

Terás honrada matriz.”

O primeiro foi dizendo:

“- Rapaz, não seja orgulhoso,

Pois o homem que assim é

Acaba sendo invejoso.

Use a razão, não a raiva

E serás bem vantajoso.”

O segundo prosseguiu:

“- Rapaz, só a inteligência

Tem poder de construir

Um homem por competência.

E a de um rei preza a virtude

Para amar sem ter demência.”

O terceiro assim lhe disse:

“- Rapaz, seja bem fiel

Ao amor, a Deus e a tudo

Que desenham teu papel.

Não vá perder-se que nem

Os humanos de Babel.”

Esses três homens sabiam

Magias descomunais

Protegiam sua terra

De poderes infernais

Esses três distintos homens

Tinham nomes de animais

Aleixo Peito-de-Pombo

Era exímio cantador.

José Boi Soares era

Valente desbravador

Leitão Cochino pintava

As maravilhas do amor.

Naquela terra medonha

Havia um monstro malino

Chamava-se por Quimera

Tinha o mal como seu tino.

Quem se encontrava com ela

Achava triste destino.

A Quimera tinha feito

A gente dali escrava.

O rei era seu palhaço

Não se tinha uma voz brava.

A cada dia comia

Um homem junto com fava.

Ela tinha corpo d’onça

C’a cabeça no lugar.

Mas no dorso outra cabeça

De uma cabra por berrar.

A cauda era uma cobra

Cascavel a sibilar.

O Reino da Pedra Fina

Sofria com o monstrengo,

Que tratava cada qual

Como fosse um mamulengo.

Criou a seca e a fome

Matança, cobiça e dengo.

Naquele reino, feliz

Era quem matava gente.

Quem tinha a moral correta

Morria como demente.

Amadis ao saber disso

Quis impor sua patente.

A Quimera residia

Na ponta de uma colina

Quando dava seis da noite

Ela danava na sina:

Comer um ser humano

Com uma fome canina.

Daqueles três gentis magos

Só um seguiu Amadis.

Fora o tal Peito-de-Pombo

De quem a verseja diz.

E juntos foram à corte

Achar aquela infeliz.

Ninguém nas ruas estava

Só Vizir e os dois rapazes.

Foi quando deu seis da noite

E a lua refez as pazes

Com o céu escuro e quedo

Para mudar suas fases.

Foi quando um barulho deu,

Vindo como uma corrida.

A Quimera ia caçando

Vivalma desprevenida.

Achou um triste pedinte

E o teve como comida.

Ao verem aquele monstro

Seu Aleixo se mijou.

Amadis não a temeu

Mas assustado ficou.

O monstro mirou os três

E uma carreira mandou.

Amadis logo desceu

De Vizir, seu companheiro

(Peito-de-Pombo correu

Para detrás dum facheiro).

Com seu escudo no braço

Preparou-se o cavaleiro.

O monstro fez seu ataque:

A onça lançou unhadas,

A cabra punha a cabeça

Para dar duas chifradas

A cascavel retorcia

Dando cem abocanhadas!

Mas Amadis conseguia

Aqueles golpes deter

Seu escudo o protegia

Dando conta do poder

Que a Quimera tem em força

Que ninguém possa descrer.

Entretanto houve um momento

Que a segurança cedeu

A onça com dez dentadas

Seu escudo assim mordeu.

Amadis levou chifrada

Da cabra, mas não morreu.

O cavaleiro rodou

Igualzinho a um pião.

Mas seu golpe foi certeiro

Que não deu um vacilão

Decepou a cascavel

Que a cabeça foi a o chão!

Olhando aquela cabeça

No chão, assim estendida,

Amadis, Pombo e Vizir

Temeram a vista tida:

A cabeça virou pó

E ganhou de novo a vida!

Assustado, Amadis fez

Golpe certeiro na cobra.

A cabeça caiu, mas

Se refez de tal desdobra.

A Quimera gargalhou

Pela sua grande obra!

E por mais de quatro horas

A batalha sucedeu.

Mais cabeças cortadas,

Depois vivas... ‘conteceu.

O monstro para Amadis

Bravura reconheceu.

“- Amadis, nobre guerreiro,

Cavaleiro corajoso.

Lutar contra teu juízo,

É por mim mui valoroso.

Farei contigo o que fiz

Com quem me foi venturoso.”

Te lançarei três enigmas

Para revelares bem.

Caso não possas fazê-lo

Te devorarei além

Da tua armadura mais

Os teus amigos também.

Amadis ia dizer

Que não estava vencido

Para a Quimera valer-se

Daquele discurso tido.

Mas viu Vizir preso com

Peito-de-Pombo ferido.

A Quimera fora astuta

E seus amigos prendera.

“- Covarde”, ele a chamou.

Contudo, de que valera?

Prezar pela vida deles

Era o que reconhecera.

Então, Amadis valeu-se

Daquela situação:

Responder as três charadas

Que deram obrigação.

E dizendo às três cabeças

Completou lá seu mourão:

Eu não me chamo por Édipo

E também não sois Esfinge.

Mas este vem como regra,

Um cinto que muito cinge.

Lançai vossos tais enigmas

Sobre o sangue que me tinge!

Então a Quimera riu

E por zombá-lo foi tendo.

Começou seu tal rimado

Com a cascavel se atendo.

Sibilando sua língua

A danada foi dizendo:

“- Comi carne sem ser caça,

Que minha boca gostou.

Assei-a com as palavras

Que Deus para mim falou.

Bebi água que nem chuva

Nem a terra me mandou.”

Amadis achou difícil

Aquela tão vil charada.

A Quimera percebeu

E botou-se na risada.

Ela dizia palavras

De postura depravada!

Chamou Amadis de ingênuo,

E de nenhuma ciência.

O cavaleiro irritou-se;

Quis tomar má aparência.

Puxou sua espada Gaula

Por estar sem paciência.

Então a Quimera fez

O seu cavalo sofrer.

Amadis consentiu erro

Que acabara de fazer.

Responder as tais charadas

Era mais do que um dever!

Foi então que Aleixo disse

Com ua voz açucarada.

Amadis, recorde bem,

Do dito a noite passada.

Usar um dos tais conselhos

Tinha já hora chegada!

E Amadis se recordou

Daquele dito jargão:

“Não seja assim orgulhoso,

Pois ganhará ambição.

Não faça valor da raiva,

Use somente a razão.”

Assim Amadis, pensou

Para uma resposta obter.

E com muita paciência

O cruzado foi valer.

Respondendo a charada

Como vou já escrever:

“- A caça estava já morta

E por sacro ritual

Foi assada, pois na Bíblia

Um anjo tostou igual.

A água vem do suor,

Que é um líquido animal.”

A Quimera se assustou

Com essa resolução.

“- Está certo”, ela falou

Sem crer e sem ter noção.

Assim a cabra lhe disse:

“- Esta não responde, não!”

“- Beijei uma mulher bela,

Cujo brinco reluzia

Meu amor por ela inteiro

Que carrego todo dia.

Toda vez que eu cochilava

A danada me fugia.”

Fazendo-se de razão

Amadis ficou pensando.

A Quimera já sorria

De seu orgulho se inchando.

Foi quando Amadis lhe disse

O que estava calculando:

“- A lua parece um brinco

Quando minguante ou crescente.

O que reluz é a luz

Que o sol lhe dá de presente.

Porém eles não se encontram

Vivendo um amor ausente.”

A Quimera se tremeu

Com a resposta valida.

“- Está certo”, ela falou

Com a voz quase partida.

Assim a onça lhe disse:

“- Com esta não tem jazida!”

“- Sou carne morta, mas vivo.

Não sou jogral nem poeta,

Mas a minha língua fere

Mais que boca de profeta.

Quando calada temida

Quando aberta, sem meta.”

A Quimera novamente

Achou-se muito garrida.

Amadis achou difícil

Mas deu resposta querida.

Foi explicando com calma

Pois custava sua vida:

“- O couro de bicho é morto,

Mas vivo, por qualidade.

A espada é língua de ferro

E fere como a verdade.

Quando guardada imponente

Quando na mão crueldade...”

A Quimera sorriu muito

E já ia devorar

O três amigos dali

Mas algo veio a calhar.

Amadis lhe disse: “- Calma,

A resposta inda vou dar!”

“- A resposta da charada

É “A bainha” acredito.

Pois é a boca da espada,

Assim um fato temido.

A espada quando tirada,

A bainha sem sentido!”

A Quimera já dotava

Com os dentes no cruzado.

Depois daquela resposta

Ela se virou de lado.

As cabeças se morderam,

Caindo no chão rachado.

A terra se abriu ligeiro,

Engolindo aquela fera.

De lá, daquele buraco,

Emergiu tal ave mera,

Que brilhava como o sol

No calor da primavera!

“- É um nambu encantado”,

Gritou Aleixo feliz!

Vamos chamá-lo pra ver

O que isso nos prediz.

E com um bom arremedo

Ele fez som de raiz.

O nambu veio vistoso

Muito calminho e andando.

Amadis o pegou logo

E foi carinho lhe dando.

Uma pena d’ouro estava

Entre todas já brilhando!

Ao retirar bela pena,

O reino da Pedra Fina

Encantou-se como mágica

Num sorriso de menina.

O povo e o rei vibraram

Pelo fim daquela sina.

O rei a Amadis deu

Uma vistosa medalha.

Pelo mérito da honra,

Que nunca se fez de falha:

“- Bendito és tu, cavaleiro,

E que Deus sempre te valha!”

Os três passaram ali

Mais dois dias por valer.

Quando Amadis decidiu

Seu caminho percorrer.

O Reino do Barro Branco

Eles iam conhecer.

O rei dera ao caro Aleixo

Um cavalo modelar

Peito-de-Pombo o chamou

Pelo nome de Estelar

Pois o “Cinturão de Órion”

Ele estava a contemplar.

E andaram por seis semanas,

Cruzando aquele sertão.

Amadis em Oriana

Pensava com emoção.

E só a ela jurava

Amor de seu coração:

Minha Senhora, por ti

Deserdo minha cruzada

Deixo escudo e mais a lança

Mais armadura e a espada.

Pois ao cavaleiro vale

Só a mão de sua amada.

Minha Senhora, por ti

Canto desejos ao vento

Morro pelo teu amor

Para tirar-me o tormento.

Pois ao cavaleiro resta

Tua voz no pensamento.

E d’outro lado da terra

Oriana lastimava

A dor ferir o seu peito

Pois triste ela se encontrava.

E por Amadis, seu bem,

Ela chorando cantava:

Vento que chora no prado,

Vem para falar comigo.

Verseja-me alguma nova

De meu amoroso amigo.

Ó Senhor Deus, qual caminho

Por este país eu sigo?

Vento que chora comigo,

Vem para falar de lado

Alguma nova nos versos

De meu desdenhoso amado.

Ó Senhor Deus, qual caminho

Eu sigo por este prado?

Assim choravam os dois

As desventuras do amor.

Oriana estava prestes

A casar com Galaor.

E Amadis errava ao longe

A buscar o seu valor...

Depois daquelas semanas

Eles visaram um castelo

De um reino mais que encantado

Às margens de um monte belo.

Por Canudos se chamava,

Reino de trato singelo.

E naquela madrugada

Conheceram o tal rei,

Dom Antônio Conselheiro,

Seu nome já escutei.

Ali dormiram em paz,

Também por lá já passei.

Amadis pediu ao rei

Para Aleixo consagrar.

Então o rei o louvou

Cavaleiro por dotar

De tamanha maestria

Pra com Amadis andar.

Pra aquele rei, Amadis

Perguntou com mui respeito

Sobre o Barro Branco e como

Chegar a ele por eito.

Conselheiro foi dizendo:

“- É seu reino por direito.”

O cruzado lhe mostrou

Aquela pena dourada.

Dom Antônio Conselheiro

Decifrou a tal charada.

E aos cruzados foi dizendo

Pra tomar melhor jornada:

“-Ele fica a vinte noites.

Entenda, pois vou contar.

Tome o Norte e vá ao Leste

E prossiga sem parar.

O Reino do Barro Branco

Fica bem perto do mar.”

Na manhã seguinte foram

Os cavalos bem ligeiro

Naquela Estrada Sagrada

Cada qual com cavaleiro.

Os quatro seguiram trilha

Ao destino traiçoeiro...

Depois de cinco semanas

Viram exército franco:

Cavaleiros mais que armados

Lhes fizeram um estanco,

Porque haviam chegado

Ao Reino do Barro Branco!

Recife, 31 de agosto de 2010.