ROMANCE  DE  CORDEL

Uma bebida fresca em copo de pé alto, a ventoinha enorme a girar no tecto, a música dos vários grupos da moda no gira-discos, um par a dançar alheado, na velha pista...

Cá fora a tarde está quente e luminosa.

É dia de matiné dançante e as mamãs acompanham as filhas casadoiras para as vigiar de perto mas com a doce esperança que haja um jovem ou mesmo um homem maduro que por uma se encante e a leve ao casamento, menos uma preocupação, menos uma boca...

Mas o dia está demasiado quente e eles preferem percorrer a avenida à beira-mar com olhares cobiçosos para as banhistas de fim de dia.
Há-as principalmente estrangeiras e já maduras. Chegam em grupos, espalhafatosas... Trazem na bagagem desejos de prazeres fáceis em terras distantes... Os maridos ficaram nos seus empregos enfadonhos, com as suas amantes exigentes.


Há uma que se destaca pela sua discrição. Está sentada sob um chapéu colorido alugado e limita-se a olhar o mar tranquilamente. Trouxe um livro mas está sobre a toalha, fechado. Idade indefinida, entre os 30 e os 40...
Pela tez clara e cabelos loiros pensar-se-á que não pertence àquela latitude caracterizada por gente morena... E quem o pensou, acertou. Veio de longe, do norte da Europa. Não pertence a nenhum grupo.

Do outro lado da avenida chegam-lhe acordes monótonos da música tocada no velho e decadente clube.
De súbito desejou ir e ver o que por lá se passava. Arrumou o livro e a toalha no saco e vestiu sobre o fato de banho um vestido de algodão branco e solto. Atravessou o areal alheia aos olhares que despertou e dirigiu-se para o salão.

Um jovem moreno seguiu-a e entrou logo depois dela.

O salão estava mal iluminado e para quem vem da claridade ainda mais na obscuridade se apresentava. Parou pouco depois da entrada para habituar a vista à penumbra. Um grupo latino cantava em inglês com o sotaque característico dos latino-americanos. Achou delicioso esse facto e sorriu.

Alguém lhe tocou no ombro e ela voltou-se. Olhou o jovem que lhe sorriu, um sorriso cativante, daqueles que obrigam a sorrir quem os vê e ela sorriu mais abertamente...

_Quieres bailar? Yo soy buen bailarin... _ e apontou com o indicador a pista, fazendo movimentos circulares com ele e ela entendeu e aceitou.
_Como te llamas? Yo soy Javier Manzanero.
Ela, pelo pouco que entendia de espanhol, percebeu a apresentação.
_Yo, Ingrid Palm.

Pousou o saco no chão obedecendo ao gesto de Javier e juntaram-se aos dois pares que dançavam.
'Isto parece o início de um romance de cordel'_ pensou Ingrid... Dos que ela escreve e vende para ganhar a vida... Achou irónica a situação e voltou a sorrir levando Javier a pensar que ela se sorria para ele pelo que reagiu e a enlaçou mais a si.

As jovens casadoiras que esperavam em vão por um par olharam invejosas para essa estranha loira que lhes roubava um dos seus...

...E aconteceu o romance de cordel...


Beijinhos,
Teresa Lacerda
Enviado por Teresa Lacerda em 20/09/2010
Reeditado em 20/09/2010
Código do texto: T2508889
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