A FAZENDA LAGOA DE BELAMENTE.
FAZENDA LAGOA DE BELAMENTE.
FUI DRUMI IMBRIAGADO
PASSEI A NOITE DRUMINDO
E SEM SÊ INCOMODADO
ASSONHEI UM SONHO LINDO.
FUI NA LAGOA DE BELAMENTE
QUI ME FUTUCA A LEMBRANÇA
LUGÁ ONDE ANTIGAMENTE
EU PASSEI A MINHA INFANÇA.
VI A CASA E O BARRÊRO
FÁBRICA DE QUEJO TOMBÉM
A ISCOLA E O ARMAZÉM
O CURRÁ E O XIQUÊRO.
NA ENTRADA DO TERRAÇO
SINTI AQUELA EMOÇÃO
QUI ISFRIA O ISPINHAÇO
E ACELERA O CORAÇÃO.
PRA ENTRÁ LÁ A CRIATURA
NUM CARECE MAIS DE CHAVE
SE ACABÔSSE FECHADURA
FERRÔIO, TRAMELA E TRAVE.
JÁ TINHA CASA DE ABÊIA
TINHA BURACO DE RATO
TAVA CHÊI DE PÉ DE MATO
E MARIBONDO NAS TÊIA.
CASA DE ARANHA E PUÊRA
E UMA PRAGA DE CUPIM
QUI JÁ TINHA DADO FIM
A METADE DA MADÊRA.
INTÉ A CRÚIS DE PAIA BENTA
QUI MAMÃE PREGÔ NA JINELA
AQUELA PRAGA NOJENTA
JÁ TINHA CUMIDO ELA.
O BUZO QUI PEGUEI TANTO
PRA CHAMÁ OS TRABAIADÔ
PERCUREI PUR TODO CANTO
NUM SEI QUEM DIABO LEVÔ.
AINDA DEU PRA CUNHICÊ
O PREGO DA PARMATORA
QUI MEU PAI MANDÔ FAZÊ
PRA GENTE APRENDÊ A HORA.
NO QUARTO DO SANTUARO
QUATO FITINHA AMARELA
QUATO CONTA DUM RUSARO
NO BATENTE DA JINELA.
ALEVANTEI MINHA VISÃO
PRA AS TÊIA QUI FARTAVA
VI AS NUVE QUI PASSAVA
FAZENDO RESTA NO CHÃO.
CUM O MEDO QUI EU TINHA
DAQUELAS TÊIA PINDURADA
VORTEI DA SALA DE ENTRADA
NUM VI QUARTO NEM CUZINHA.
ARRUDIEI PELO O OITÃO
VI A ROSETA DUMA ISPORA
QUI FICÔ INTÉ AGORA
MAIS A PERNA DUM GIBÃO.
UMA CADÊRA SEM PERNA
TAVA NO CHÃO INTERRADA
ABRI A TAMPA DA CISTERNA
TAVA ISCURO NUM VI NADA.
A PORTINHA DA PRIVADA
TAVA NO CHÃO ISTENDIDA
AS TÊIA TUDO QUEBRADA
A FOSSA TAVA INTUPIDA.
FOI UM ISPANTO PRA MIM
QUI NA PORTA AINDA HAVIA
UMA LINDRA PUISIA
QUI O VERSO DIZIA ASSIM:
NESSA PRIVADA MUDESTA
ONDE A VAIDADE SE APAGA
TODA MOÇA BOTA FORÇA
TODO VALENTÃO SE CAGA.
TIVE MAIS ÔTA SURPRESA
DE VÊ NO CHÃO ISPAIADO
COISAS DE FAZÊ LIMPEZA
QUI NUM TINHA SIDO USADO.
TUDO MUITO ORIGINÁ
BEM CONFORTAVE E BARATO
PAPÉ DE IMBRÚI E JORNÁ
SABUGO E FÔIA DE MATO.
NO ARMAZEM NUM VI MAIS
OS VASO GRANDE DE ZINCO
QUI ERA UNS QUATO Ô CINCO
DE GUARDÁ OS CERIAIS.
VI CACO DE FOICE E ABANO
AS BÊRA DUM AGUIDÁ
UM BISACO COM UM CANO
DE DÁ CRISTÉ IM ANIMÁ
UMA BANDA DE PILÃO
O RESTO DUMA MACACA
DUAS VARA DE FERRÃO
DÉIS APIADÔ DE VACA.
DUAS RODÊRA DE CARRO
UM LAMPIÃO SEM PAVIO
UMA PONTA DE CIGARRO
FEITA NA PÁIA DE MIO.
UM CAXÃO DE FERRAMENTA
O TORNO DE BUTÁ SELA
UMA CRUIS DE PÁIA BENTA
APREGADA NA JINELA.
UM CHIFRE CHÊI DE AZEITE
DOIS CANZÍ E TRÊIS FUÊRO
TRÊIS BULE DE TIRÁ LEITE
DÉIS PAVÍ DE CANDIÊRO.
A TAMPA DUM TABAQUÊRO
E UM MATULÃO DE CORO
UMA MASCRA DE VAQUÊRO
UMA CARETA DE TORO.
UM BARBICACHO DE CHAPÉU
UM ARREMEDO DE ROLINHA
UMA CAXA REDONDINHA
CUM ISPOLETA DE PAPEL.
FERRO DE BATÊ INCHADA
PEDA DE MÓ TOMBEM VI
E A RABICHOLA RASGADA
DO JUMENTO BEM-TE-VI.
A MÁQUINA DE CAPÁ BOI
TAVA NUM CANTO ISCUNDIDA
CERTAMENTE ARRIPINDIDA
DE TÃO MARVADA QUI FOI.
UMA MANTA SEM O PELO
DUAS CORDA DE LAÇÁ
UM CABRESTO DE CABELO
E UMA CORDA DE CROÁ.
UM INCHÓ INFERRUJADO
SERRA DE TIRÁ CAPIM
UMA PERNA DE ARADO
CUMIDA PELOS CUPIM.
UM CABRESTO SEM O RABO
UM CABO SEM O SERROTE
UM CANECO SEM O CABO
DE TIRÁ ÁGUA DO POTE.
QUENGA DE COCO E PENÊRA
TRÊIS CORDA DE VIOLÃO
VI UM CABO SEM PEXÊRA
TRÊIS FUÊRO E UM COCÃO.
TAMPA DUM BULE VREMEIO
CUMIDA PELA FERRUGEM
UMA LATINHA DE RUJE
DOIS PEDAÇO DE ISPEIO.
A CORREIA DUM CHUCÁI
O GANCHO DUMA PETECA
E O RESTO DUM BARÁI
DA GENTE JOGÁ SUECA.
VI UMA FORMA DE BOLO
UM CARDERÃO SEM AZÊIA
BOLO DE CERA DE ABÊIA
FORMA DE FAZÊ TIJOLO.
VI UM ANZÓ NUMA VARA
CHAPÉU DE PÁIA DE COCO
INCHADECO DE ARRANCÁ TOCO
GANCHO DE FAZÊ COIVARA.
UMA ARAPUCA NO CHÃO
RODA DE ARAME FARPADO
UM FERRO DE FERRÁ GADO
UMA XIRINGA DE INJEÇÃO.
DUM MACHADO VI UM TACO
UM TAMBURETE E UM RALO
E A CORREIA DUM BISACO
DE BUTÁ MIO PRUS CAVALO.
UM BADALO DE CHUCÁI
UMA ISPORA SEM ROSETA
O SACRATAPO DA VARETA
DA RIÚNA DE MEU PAI.
UMA AGÚIA DE COCHÉ
UMA BANDA DE DIDÁ
CACO DE TORRÁ CAFÉ
UMA ARATACA DE PREÁ.
UM POTE CHÊI DE BURACO
UMA TAMPA DE QUARTINHA
BARBANTE DE CUZÊ SACO
LITO DE MIDÍ FARINHA.
A PERNA DUM LAVATORO
UMA CUMBUCA DE BANHA
DUAS FIVELA DUM LORO
CACO DE TORRÁ CASTANHA.
UMA FIVELA SEM FRIVIÃO
UM FERRO VÉI DE INGOMÁ
TRÊIS PEGADÔ DE CARVÃO
DUAS ISTÊRA E UM BORNÁ.
SE O SONHO NUM ME INGANA
VI A METADE DUM CANZÍ
MAIS PRECUREI E NUM VI
O INGÉM DE MUÊ CANA.
O PEITURÁ DUM GIBÃO
PINDURADO NUM ISTÊIO
AS CORDAS DUM MATULÃO
AS DUAS RÉDIA DUM FREIO.
CEXTO, CAÇUÁ E BALÁI
TUDO FEITO DE CIPÓ
UM BADALO SEM CHUCÁI
UMA CABAÇA SEM GOGÓ.
NA COCHEIRA EU SINTI SÓ
SAUDADE DE AVUADÔ
O CAVALO MAIS MIÓ
QUI O SERTÃO JÁ CRIÔ.
NA GARAGE NUM VI NADA
QUI ME CHAMASSE ATENÇÃO
A NUM SÊ A CRÚIS APREGADA
NUMA BANDA DO PORTÃO.
VI O BARRÊRO INTUPIDO
MEU CORAÇÃO SE ALEGRÔ
QUI FOI ELE QUEM MATÔ
NOSSO AVUADÔ QUIRIDO.
LÁ NO PÉ DE MULUNGU
TINHA UM CÔRO ISPICHADO
UMA CORDA DE CORO CRU
UM CHIFRE DIPINDURADO.
NO TERRÊRO ME ALEMBREI
DAS FESTA DE SÃO JUÃO
E POR PERTO AINDA ACHEI
A TABOCA DUM FUGUETÃO.
NO MULUNGU NUMA MESA
DUM CARRO-DE-BOI QUEBRADO
FIQUEI INRIBA ASSENTADO
ISPIANDO A REDONDEZA.
ADONDE AS VISTA ARCANÇÔ
FOI ATRÁIS MEU PENSAMENTO
E CUM ELE O SUFRIMENTO
DA SAUDADE QUI FICÔ.
MUITA TRISTEZA ME TRAIS
A LAGOA DE BELAMENTE
QUI QUEM VIU ANTIGAMENTE
HOJE NUM CUNHECE MAIS
NO MUNDO NADA TEM FIM
PORÉM TUDO SE TRANSFORMA
SÓ SE ISPLICA DESSA FORMA
MUDANÇA TÃO GRANDE ASSIM.
NA FAZENDA BELAMENTE
AGORA SÓ TEM TRISTEZA
NUM CARICIA A NATUREZA
DÁ TANTO CASTIGO A GENTE.
PRA NUM TÁ ME ALEMBRANDO
QUEM A MINHA TERRA FOI
DEIXEI O CARRO-DE-BOI
SAÍ NO TERRÊRO ANDANDO.
FUI NO XIQUÊRO DE PÔICO
OS AMPARO TINHA CAÍDO
O CHÊRO DISAPARICIDO
A CERCA SÓ TINHA OS TÔCO.
VI UM TACO DE PANELA
UM OSSO DE CORREDÔ
UM COCHO E DUAS GAMELA
QUI O CUPIM ISTRAGÔ.
NO PULÊRO DAS GALINHA
SÓ O ISTRUMO FICÔ
ADUBANDO UMAS PRANTINHA
CARREGADA DE FULÔ.
TINHA TAMBEM NESSE CANTO
EVABABOSA, ARRUDA E PINHÃO
ALICRIM, HORTELÃ, MANJERICÃO
EVA CIDREIRA E CAPIM SANTO.
TUDO ISSO MÃE PRANTAVA
PRA FAZÊ CHÁ E LAMBEDÔ
E NÓIS NUNCA PRICISAVA
DE MEIZINHA DE DOTÔ.
E PUR FALÁ IM MEIZINHA
VEIO NO SONHO O DISEJO
DE TOMÁ UMA CERVEJINHA
CUM TIRAGOSTO DE QUEJO.
ENTREI NA FÁBRICA E SINTÍ
SAUDADE DE ONTÕI FERRERA
E PARECE INTÉ QUI UVI
O SOM DA DISNATADÊRA.
QUANTA SAUDADE ME TRAIS
AQUELE TEMPO DE FARTURA
DO QUEJO DE MANTEGA PURA
QUI JÁ NUM SE INCONTRA MAIS.
RAPA DO TACHO QUENTINHA
UMA QUAIADA ISCURRIDA
A SABANATA CUM FARINHA
E A MANTEGA DIRRITIDA.
VI AS FORMA PINDURADA
DE FAZÊ QUEJO DE QUÁI
VI UMA PEÇA QUEBRADA
DA BALANÇA DE MEU PAI.
AS FORMA FEITA DE FRANDE
UMAS REDONDA, ÔTAS QUADRADA
UMAS PIQUENA E ÔTAS GRANDE
TAVA TUDO INFERRUJADA.
VI NO TERRAÇO DA CUZINHA
A JARRA GRANDE QUEBRADA
E NA PORTA UMA CRUIZINHA
DE PÁIA BENTA APREGADA.
VI UMA LATA DE PÓ
DE CASCA DE JUAZÊRO
O ARAME NO TERRÊRO
DE BUTÁ CARNE DE SÓ.
VI UM CALUNGA NO BRAÇO
DUMA BUNECA SEM FRANJA
UMA CASCA DE LARANJA
NO TEIADO DO TERRAÇO.
LÁ NO MUNTURO DA CASA
VI UM BICO DE CHALÊRA
UM PINICO SEM A ASA
SEM O FUNDO E SEM AS BÊRA.
NAQUELE TEMPO O PINICO
ERA A PEÇA PRINCIPÁ
QUI NUM PUDIA FARTÁ
NEM PRU POBE NEM PRU RICO.
FOI O MOVE MAIS USADO
PELO POVO DO SERTÃO
E ERA TÃO CONSIDERADO
QUI SE CHAMAVA CAPITÃO.
A IMFILIZ DA PARMATORA
TAVA LÁ DO MERMO JEITO
ISPERANDO ARGUM SUJEITO
QUI NUM SABE LÊ A HORA.
INTÉ CRÚIS DE PÁIA BENTA
É CUMIDA PELOS CUPIM
E AQUELA PESTE NOJENTA
NUM TINHA LEVADO FIM.
APANHEI ELA DO CHÃO
ALIMPEI TIREI O CISCO
PRA LEVÁ PRA O SERTÃO
JOGÁ NO RI SÃO FRANCISCO.
UM ARCO VÉI DE BARRICA
SINGANCHÔ NA MINHA PERNA
ERA DE AMARRÁ A BICA
QUI ROBARO DA CISTERNA.
VI UM TACO DA OSSADA
DO MEU CACHORRO PIRIM
EU ISPIANDO A QUEXADA
OS DENTE SIRRIU PRA MIM.
UMA ISCOVA, UM PENTE FINO
UMA PONTÊRA DE PINHÃO
RUPEMBA DE CESSÁ FEJÃO
UMA APRAGATA DE MININO.
VI UM ROSTO DE SAPATO
FEITO DE CORO DE VERNIZ
BRIAVA TANTO O INFILIZ
QUI EU VI O MEU RETRATO.
VI MUITA CASCA DE BALA
DE RIFE QUARENTA E QUATO
QUI MEU PAI TINHA UM NA SALA
ÔTO NA PORTA DO QUARTO.
UM BIRILO INFERRUJADO
SE INFIÔSSE NO MEU DEDO
EU DEI UM PULO CUM MEDO
E ME ACORDEI ASSUSTADO.
TEM MUITA COISA GRAVADA
ÔTAS QUI NUM LEMBRO MAIS
E A DÔ QUI O SONHO TRAIS
TÁ IM MEU PEITO GUADADA.
NUM VI CURRÁ NEM PURTÊRA
NEM ISCOLA NEM CERCADO
NUM VI CAVALO NEM GADO
NEM O BÁ DE ZÉ FERRÊRA.
AS PRANTAÇÃO DE CAPIM
DE PALMA, MILHO E FEJÃO
QUI INFEITAVA O SERTÃO
TUDO ISSO LEVÔ FIM.
SE EU PUDESSE TÊ ENTRADO
PRA ISPIÁ DE CASA A DENTO
CUM CERTEZA O SUFRIMENTO
NUM ERA ASSIM TÃO PESADO.
MAIS CUM MEDO DE ENTRÁ
E CAÍ TÊIA LÁ DO ARTO
NUM VI SALA DE JANTÁ
CUZINHA, DISPENSA E QUARTO.
AGORA EU SÓ VÔ DRUMI
QUANDO BEBÊ AGUARDENTE
PRA ASSONHÁ NOVAMENTE
E VÊ AS COISA QUI NUM VI.
E QUANDO ASSONHÁ NOVAMENTE
EU QUEIMO A POPRIEDADE
PRA LAGOA DE BELAMENTE
NUM ME MATÁ DE SAUDADE.