Martelo Alagoano
Seu Ribeiro X Mestre JAC
Ribeiro
No cenário operário da nação,
A Parteira é preciso destacar!
A criança, não tem hora de chegar,
Nos rincões mais distantes do Sertão!
Anda léguas pra cumprir a missão
Sob o sol da caatinga, soberano,
Quando chega à cabana do cigano,
Em suas mãos, o bebê vem aflorar!
Vendo a filha em mãe se transformar,
Nos dez pés do Martelo Alagoano!
JAC
Já eu lembro o trabalho de um Cantor:
Passa a vida varando o meu Sertão,
Vai levar o seu canto, com emoção,
Vem firmar o seu nome vencedor!
Iletrado, mas bom conhecedor
Da ciência de todo ser humano,
É capaz de sorrir sem desengano,
Quando o mundo parece ser cruel,
E, do amargo da vida, ele faz mel,
Nos dez pés do Martelo Alagoano!
Ribeiro
Sobressai a figura do Vaqueiro,
Nos ofícios mais rudes dos Gerais!
Sendo ele o pastor dos animais,
Sempre salva a boiada do atoleiro!
Enfrentando a trovoada de janeiro,
Ele aparta o gado fazendo plano!
Na batalha do seu cotidiano,
Seu cavalo veloz conhece a terra,
O aboio é o seu cantar de guerra,
Nos dez pés do Martelo Alagoano!
JAC
Lembro agora o Carreiro Zé Cirino,
Forte, honesto, valente, em seu direito,
Que merece medalhas em seu peito,
Homenagem ao homem nordestino!
Trabalhando demais, desde menino
Nascimento, ele não se lembra o ano,
Chapéu velho lhe serve de abano,
E o bom carro, cantando no cocão,
Bois pisando e marcando o mesmo chão,
Nos dez pés do Martelo Alagoano!
Ribeiro
Não se pode esquecer do lavrador,
Que a terra fecunda, com a mão,
Enquanto ele semeia o seu pão,
Faz promessas ao Santo Protetor!
Vendo a seca frustrar o seu labor,
E matar de sede o burro cabano,
Ele enfrenta o agreste inumano,
Cultivando de novo o pé-de-serra,
Sabe quê a chuva é amiga da terra,
Nos dez pés do Martelo Alagoano!
JAC
Curador sempre tenho no cercado,
Protegendo o meu gado contra a cobra!
Na sua frente, a serpente até se dobra,
Bicho mau, de peçonha, sai enxotado!
E o vaqueiro já não fica assustado,
Trabalhando mais livre, segue um plano,
Melhorando seu gado, ano a ano,
Com o saber desse bom conhecedor,
Agradecendo as bênçãos do Senhor,
Nos dez pés do Martelo Alagoano!
Ribeiro
E no bom cumprimento do dever,
Professor nem sempre é reconhecido,
Já faz tempo, vem sendo escarnecido,
Com o que ganha para sobreviver!
Mesmo assim ele ensina com prazer,
Do alfabeto ao algarismo romano,
Quando chega as férias do meio do ano:
Passa o mês revisando o exercício!
Ainda tem quem desdenha deste oficio,
Nos dez pés do Martelo Alagoano!
JAC
Nhá Zefinha, Comadre Benzedeira,
No Sertão é quem cura o doente,
Sabe reza pra quem toma aguardente,
Dor no rim, catapora e tremedeira!
É o puxado no peito, é a chiadeira,
É um osso partido, sem tutano,
É o bucho inchado, mancha ou pano,
O catarro, a frieira e a ferida!
Trabalhando de graça, toda vida,
Nos dez pés do Martelo Alagoano!
Ribeiro
O coveiro, por muito esquecido,
Recebeu do Divino a pior sorte,
Vive a vida de frente com a Morte,
Sepultando na terra o falecido!
Ele sofre a dor do ente querido,
Que lamenta um destino tão tirano:
Tantas vidas ceifadas por engano,
Mais um jovem perdido na balada,
Vê a dor no olhar da mãe calada,
Nos dez pés do Martelo Alagoano!
JAC
Quem primeiro levanta lá na roça,
É aquele bom tirador de leite,
Cumpridor de rotina, sem enfeite,
Abandona o quentinho da palhoça!
No momento que o gado inda se coça,
Ele veste uma capa de serrano,
Com suas mãos calejadas, veterano,
Vai tirar leite morno e espumoso,
Um alimento que é bom, forte e gostoso,
Nos dez pés do Martelo Alagoano!
Ribeiro
Dizem que a mais antiga profissão
É o oficio cruel da meretriz,
Se deitando com qualquer infeliz,
Satisfaz o homem sem compaixão!
É tratada com descriminação,
O seu leito é taxado de profano,
Por saciar o desejo do mundano,
Não encontra na Igreja uma guarida...
Mas Jesus salvou uma arrependida,
Nos dez pés do Martelo Alagoano!
JAC
Velho cego, que é tocador de feira
E carrega uma sanfona pé-de-bode,
Com um menino que adora um pagode,
Seu pandeiro parece brincadeira!
Faz o povo ouvir “Mulher Rendeira”,
E a morena já roda com um fulano
Na cabeça, já não tem mais o pano,
E a poeira já sobe, no baião,
Tem conhaque, tem pinga e tem quentão,
Nos dez pés de Martelo Alagoano.
Ribeiro
João de Barro, um amigo construtor,
Foi tropeiro, trocou de profissão,
Pra viver a ralar, na construção,
Mão-de-obra barata pro empregador!
Não consegue encontrar um fiador,
Pra alugar um barraco suburbano,
Hoje ele é só mais um paulistano,
Com saudade da terra que deixou,
Sofre longe da terra que abandonou,
Nos dez pés do Martelo Alagoano!
JAC
Perigoso labor do fogueteiro,
Que ilumina o escuro do Sertão,
Alegrando os festejos de São João,
Para isso trabalha o ano inteiro!
Ele faz isso pra ganhar dinheiro,
Mas descuido, cochilo ou engano
Poderá provocar um grande dano
E deixar a família sem guarida,
Ao perder, no trabalho, a própria vida,
Nos dez pés do Martelo Alagoano!