Matuto no Carnavá

Eu vou contar pra vocês

Um caso que aconteceu

Com um pobre dum matuto

E quanto ele sofreu,

Num carnavá da cidade

E pra falar a verdade,

Esse matuto sou eu!

Matuto, é matuto mermo.

É matuto de verdade!

Que diabo qué matuto

Se enfiando na cidade?

Brincando inté carnavá!

Eu brinquei, mas me dei má,

Num conto nem a metade!

Eu, um matuto veio,

Num seio o que é gozá...

Mas arranjei um dinheiro,

Fiquei doido atrás de amá.

Dissí lá do meu sertão:

Pra brincá de folião

E gozá no carnavá!

Chegando na capitá

Fui numa loja inlustrada,

Comprei um fantasião

Toda bonita e bordada!

Fui muito bem recebido

Pelo povo todo entendido

E umas moças inducada!

Vesti o fantasião, bonita!

Melei a cara tombem,

Ouvi o povo dizer:

Menino, o bróco já vem!

E um mueirão sem receio

Me agarrou pelo meio

E saiu chamando meu bem!

Eu também agarrei ela,

Dei mais de trinta buquinha!

Intrancei a perna nela

E ela, a dela na minha.

Ela arriou-se em meu braço,

Saímo marcando o passo

Como quem coze bainha.

A nega me agarrou!

Eu tombém agarrei a nega

Como duas chamichuga,

Parecia duas pega.

Eu tava tão animado

Que só cabrito amarrado

Quando a cabra veia chega.

Numa folia danada

Tudo agarrando e pulando,

Tudo que eu tinha na vida

Com ela eu tava gastando.

Cheguei até a pensar:

Que adispois do carnavá

A gente findava casando!

Proguntei o nome dela,

Ela me disse: é Maria!

Você quer casar comigo?

Ela disse que queria.

Quando ela deu a resposta

Quase que caio de costa,

Doido, doido de alegria!

Ela perguntou baixinho:

Você tem algum dinheiro?

Eu disse: tenho, pru que?

Ela respondeu ligeiro:

Então, me dê preu guardá

Pus ladrão num lhe robá,

Que aqui só tem marreteiro.

Foi pegando meu dinheiro,

E tratando de correr

Como quem ia guardá,

Mas se virou pra dizer:

Qué qui pensa matutão?

Eu num sou Maria não,

Sou machão que nem você!

Eu parti para matá-lo

Irado como um leão.

Mas a policia avançou

E me deu voz de prisão.

Me levaram pra cadeia.

Me deram muito de peia

Fui quem passei por ladrão!

Eles me encontraram bebo,

Liso, sem nem um tostão!

Documento é uma coisa

Que ninguém tem no sertão.

Fui pra cadeia, apanhei...

Veja o que foi que gozei

Brincando de folião!

Que diabo qué matuto

Com história de gozá!

É pra sofrer como eu sofri,

Ficá preso e apanhar!

Digo de idéia ativa,

Cem anos qu´eu inda viva

Num vou mais im capitá!

Só quarta-feira de cinza

Foi que pude me sortá;

Viajei para o sertão,

E fui de pés até lá!

Sofri muito, passei fome,

Nunca mais falo no nome

De diabo de carnavá!

AUTOR: José Saldanha Menezes Sobrinho ( Zé Saldanha) – nascido em 23 de fevereiro de 1918, produziu poesias até julho/2011, com 93 anos, foi um dos últimos, e autêntico Cordelista que ficou mais tempo em atividade no Rio Grande do Norte e talvez no Brasil!

ENDEREÇO: Recanto do Poeta ( zesaldanha@hotmail.com )

Rua Irineu Jóffili, 3610, esquina com Rua Piató -Candelária -Natal(RN)

LEIA MAIS OBRAS DO AUTOR: www.bit.ly/zesaldanha

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