A mulher que benzeu a “prissiguida” e pariu uma flor
Baseado numa história real
Nas ruas, nas avenidas,
Nos becos e nas cidades,
Há gente que conta tudo
Sem vergonha e sem vaidade.
Tem gente que fala muito
Com razão e sem intuito
Contrariando a verdade.
Essa minha prosa besta
Que esse verso dá partida
Ocorreu num cafundó
Duma cidade valida.
Acredite quem quiser
Mas é sobre uma mulher
Que benzeu a “prissiguida”.
Mariquinha festejou
Sua graça debutante
Com quinze anos no rosto
Era muito da adiante
Todo sábado já ia
Pro salão da freguesia
Cortejar um hidratante.
Lá no salão de um amigo
Sempre arrumava o cabelo
E pintava suas unhas
Tirando da perna o pelo.
Vivia chique e vaidosa
Com a bundinha pomposa
E cordão no tornozelo.
Gastava muito dinheiro
Com sua bijuteria
Mais perfumes e sapatos
Cada um com o seu dia.
Só vivia desfilando
E os homens assobiando
Porém nenhum lhe valia.
Mariquinha, bem prendada,
Só queria homem rico.
Dono de mansão em praia
Ou veleiro em Porto Rico.
Todo mundo ia atrás
Da perseguida no mais,
Querendo enfiar o bico.
Ela só dava a “danada”
Pra boyzinho ou seu doutor.
Viajava pela Europa,
No mundo visando cor.
Mas ela sequer contava
Que o destino reservava
As duras vias do amor.
Mariquinha retornou.
Foi para o seu cafofão.
Uma noite, na janela,
Avistou José Pilão,
Homem cheio da má sorte,
Que até mesmo a dona morte
Foi pra palma da s’a mão.
Mariquinha logo foi
Pro seu quarto maquiar
O seu rostinho bonito
Para o galã avistar.
Só que ela não sabia
Que aquela sua agonia
Ia botar pra quebrar.
A danada se chegou
Pro homem querendo dengo.
Ele, que não era besta,
Lhe falou com realengo.
Ligeirinho se pegaram
Num bequinho e levantaram
O pião do mamulengo.
E foi um vira virado,
Mexe-mexe do mexido.
Mariquinha se danando
Deu no pé, deu no ouvido.
José Pilão todo em brasa
Acabado fogo em casa
Barulhinho d’estampido.
As pernas dele nas dela
Uma mão que vem por cá
No braguilha com braguilha
Tá já chegando por lá.
O chamego de tei-tei
Que nem se eu fosse bom rei
Ia poder “agüentá”.
Mariquinha ficou zonza
Presa nele pelo cós
Do vestido que usava
Acabaram-se em nós.
Ela tava tão ardida
Que danou na “prissiguida”
Oito quilos d’hipoglós.
No dia seguinte, em casa,
Mariquinha sonhadora
Enquanto deitada estava
Na compressa de salmoura
Só cantava apaixonada
O melô da batucada
Da descabelada loura.
E lá, sonhou e sonhou
Com aquele novo amor
Ia ver no seu encontro
O seu homem de sabor.
Mas a pobre Mariquinha
Já abrigava uma tinha
Na sua mimosa flor.
Os amantes se encontraram
Partiram para um motel
Com luzes tão coloridas
Que nem em um carrossel.
Um estalar de champanhe
Para que nada se acanhe
No soltar do carretel.
José se deitou aceso
E o pilão escapuliu
Quando foi na “prissiguida”
O bicho logo saiu.
Mariquinha balançou
Mas ligeiro se assustou
Quando o pitoco caiu.
Pilão se virou cotó
E saiu gritando assim:
- Mulher, esse teu negócio
Lascou a desgraceira em mim.
Agora virei viado
Por causa do mal olhado
Que tem esse teu sagüim.
Mariquinha se danou
Correndo toda assustada.
Não acreditava ela
Que estava mal olhada.
Foi dando pra todo macho
Logo uma porção de cacho
Encheu mais de uma estrada.
Um rebuliço se viu
Um monte de homem capado
- Essa tal “prissiguida”
É um bicho desalmado!
Saiu berrando o prefeito
Me parece pelo jeito
Que perdeu o seu danado.
Foi então que Mariquinha
Adoeceu, quase morre.
Passava todas as noites
Se embebedando num porre.
Chamaram o Padre Bento,
Um senhor de sacramento.
- É esse quem lhe socorre.
Padre Bento veio cedo
Num domingo de setembro
Começou a oração.
Deu outubro, deu novembro.
Organizou a novena
E todo mundo com pena
Rezou até o dezembro.
Até que num dia límpido
De sol no meio da fava,
O Padre duma romã
Catou os galhos que dava
E com as folhas do pé
Ele abençoou com fé
O que de doente estava.
Esse instante tão sagrado
O povo olhando ficou
E naquela primavera
Da “prissiguida” brotou:
Uma flor vermelha e linda
Que ninguém na terra ainda
De seu perfume cheirou.
Mas Mariquinha deixou
A “prissiguida” na vila.
E a partir daquele dia
Decidiu prostituí-la.
E já no seguinte mês
Começou a dar de vez
E eu me entranhei na fila!
Vitória de Santo Antão, 03 de maio de 2007.