CARTA AO CUPIDO

Um homem entra no bar tendo nos olhos uma expressão intensa, porém vaga. Solitário ele afunda numa cadeira e roga ao garçom por uma dose de cachaça! (Como pôde ela tê-lo deixado? Como pôde aquele homem, outrora tão forte, estar tão fraco?)

Já se passaram duas horas desde que ele adentrou no recinto e já se foram duas garrafas de cachaça...

O homem, então, pede ao garçom um retalho de papel. Está bêbado e mais poeta do que nunca. Está decidido: vai escrever uma carta!

É então que o ébrio poeta começa a inundar de tristezas, derramadas nos traços do grafite, aquele pedaço de papel. Ele escreve com a voracidade de quem muito esperou e pouco tempo tem. Ele escreve sem parar, mal respirando. Sua dose agora continua no copo, sem a menor pretensão de ser consumida. Ele apenas escreve, escreve e escreve...

Desta forma, sem fazer uso do sobejo de sanidade que lhe restava, ele compõe esta epístola para o tal cupido, que tanto o fizera sofrer:

Ilustríssimo arqueiro,

gostaria de saber

por que desferiste a flecha

que hoje me faz sofrer?

Será que eu merecia

amar quem não me queria

ou será que foi você

que esqueceu de alvejar

e assim fazer me amar

quem me fizeste querer?

Sublime senhor cupido,

eu tenho toda razão

de estar aborrecido

com esta situação,

pois depois da tua flechada

não vejo graça em mais nada

que não me lembre daquela

que tu displicentemente

colaste em minha mente

sem me colocar na dela...

Agora veja você,

analise a conjuntura,

hoje eu vivo a beber

afogando a amargura

no álcool, esse elixir

que me ajuda a reprimir

a imensa dor que carrego

por não ser o detentor

da dona do meu amor,

da flor que eu tanto rego!

E assim, divino ser,

deixo-lhe aqui minha queixa

torcendo pra o senhor ler

e lendo, então, que se mexa;

pois no ponto em que me encontro

logo mais me desencontro

da razão de se viver

e eu digo: Falta bem pouco

qu’eu já tou ficando louco

e escrevendo pra você!

PS.: Senhor cupido

deixo uma sugestão

não desfaça seu encanto

só conclua sua missão!

Pegue uma flecha amarela

escreva meu nome nela

e arremesse no meu bem

pra que ela se derrame

e para que sempre me ame

como eu a amo também!

João Pessoa, 21/03/2010.