Quando é seca no sertão> Mini cordel com onze estrofes em décimas de sete pés> Autor: Damião Metamorfose.
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Quando é seca no sertão,
É um caos, é um inferno.
Sertanejo sem inverno,
É ave de arribação.
Perde o humor e a razão,
Fica velho sem idade.
Triste e sem felicidade,
Olha para o firmamento.
Sertão sem chuva é cinzento
E cheira a calamidade.
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Às vezes vai à cidade,
Só para ouvir os mais velhos.
Discutir os evangelhos
E experiências da idade...
Mas perde a sobriedade,
Para se sentir mais forte.
Às vezes arrisca a sorte,
Em uma banca de jogo.
O sertão sem chuva é fogo
E o ar tem cheiro de morte.
*
Açudes de médio porte,
Quando é seca no sertão.
Sobra a água do porão,
Lama racha feito corte.
Por mais que alguém suporte,
A alta temperatura.
Finda perdendo a ternura,
Com seus vinte e poucos anos.
No sertão sem chuva os danos,
A chuva às vezes não cura.
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Por a mesa sem mistura,
Trabalhar sem ter salário.
Vigiar o calendário,
Ver a terra seca e dura.
Olhar pro céu na secura,
De vê raio e ouvir trovão.
Caminhar sentindo o chão
Quente, exalando o vapor.
Sertão sem chuva é calor,
Poeira e devastação.
*
É cortar a plantação,
Para alimentar o gado.
Ver a enxada e o arado,
Enferrujar no galpão.
Filho chorando sem pão,
Bolso sem nenhuma prata.
E o cachorro vira lata,
Morre de tanta magreza.
Sertão sem chuva é dureza,
Fumaça e fogo na mata.
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A seca é tão ingrata,
Que leva o que não se tem.
E muitas vezes também,
Atinge o magnata.
Quem usa terno e gravata,
Não aguenta e agoniza.
Imagine o sem camisa,
O sem teto e o emergente?
Sertão sem chuva é tão quente,
Que o redemoinho é brisa.
*
Cada lugar que se pisa,
Parece uma fornalha.
Quando a poeira se espalha,
A visão perde a divisa.
Nem a sombra suaviza,
O mormaço do calor.
Juazeiro perde a flor,
As folhas ficam amarelas.
Sertão sem chuva as sequelas,
É morte, tristeza e dor.
*
A pastagem perde a cor,
Fica cinzento o seu manto.
A cigarra muda o canto,
Poe tristeza em seu teor.
Do nascer ao sol se por,
Nenhuma nuvem aparece.
A terra que só se aquece,
Parece que está queimando.
No sertão sem chuva é quando,
Nada de bom acontece.
*
Sertanejos fazem prece,
Exercendo a sua fé.
Fieis “roubam” são José,
Pra ver se a chuva desce.
Às vezes até parece,
Que o santo atende ao pedido.
Cai chuva e fica florido,
Logo depois seca tudo...
Sertão sem chuva é sisudo,
Abandonado e sofrido.
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É ter coração partido,
Sem ver sementes brotando.
É ver os filhos chorando,
Fome, sede e desnutrido.
É ver mulher sem marido,
Porque o mesmo foi embora.
Buscar recursos lá fora,
Pra família desvalida.
Sertão sem chuva é sem vida,
Que tem um coração chora.
*
Nos versos que fiz agora,
Fiz denuncia e refleti.
Pois tudo isso eu vivi,
No meu passado de outrora.
Também fui buscar melhora,
Para mim e pros meus pais.
E entre humilhação e ais,
Eu me acho um vencedor.
Sertão sem chuva, oh senhor!
Por favor, nunca, jamais.
*
As plantas e os animais,
Sofrem com a estiagem.
Porque não nasce pastagem
E nem cresce os matagais.
Temperaturas brutais,
Queima e atrofia a flora.
As abelhas vão embora,
Por falta de flor e água.
Sertão sem chuva é só mágoa
E a cada dia piora.