Puta que o Pariu! (Pedaço de Cordel)

I

Voismicêis me adiscurpe, usar deste palavrão

Sei qui ele é muito pesado, imbora sempre usado

Quando a cafifa si isquenta, deixando o cabra arretado.

De cara feia, amuado, vendo tudim mal-parado – parece inté coisa do Cão.

II

-Num tem ixpressão mió, pras pinima liberá – Maricota me garante

No seu rude linguajar. - Eita mundão sem porteira! Parece inté gafieira,

Neguim fazenu besteira, sofre qui nem fio sem pai juntanu xepa de feira.

Seguir essa boiada me assusta, pois sei o quanto me custa, o domínio deste gigante.

III

Prefiro ser Dom Quixote, com os Moinhos a labutar, numa luta sem final.

Trago Sancho aos pinotes, resmungando sem parar. –“Quero logo minha ilha”.

Ouvir esta cantilena, de projeção tão pequena, aguça minha atenção.

IV

Sei que meu parceiro é simplório, não sendo nenhum finório – o que faz não é por mal.

É “Maria vai com as outras”, está sempre a dormir de touca, acredita em maravilhas.

Mas, e quem tem conhecimento? Que leva vida de jumento – sempre debaixo de tacão?

Quando recorro à imagem de Dom Quixote explicando a Sancho Pança a importância do sonhar, tenho a exata noção de como é importante não se deixar prender pela engrenagem gigantesca do consumismo moderno que, se deixarmos, nos devora por inteiro, tal qual um dragão mitológico a nos prender em suas garras como um Fagin, de Dickens, seduzindo com miragens suas crianças desamparadas.

Vale do Paraíba, noite de Quarta-Feira, Novembro de 2008

João Bosco

Aprendiz de Poeta
Enviado por Aprendiz de Poeta em 09/11/2009
Reeditado em 09/11/2009
Código do texto: T1913880
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