O Sonho da Cidade!
Quando eu saí da roça
E deixei a minha choça
Para morar na cidade...
Trazendo minha família,
Cachorro, gato e mobília.
E muita necessidade...
Buscava encontrar aqui
O que não achei ali,
Com força de trabalho.
Eu que sou agricultor,
Um pobre trabalhador,
No frio e sem agasalho.
E neste país de bosta
O povo vive de aposta
Em casas de loteria...
O salário uma micharia
O trabalho uma porcaria,
e Pra receber: correria!
Ganhei calos da enxada,
Trabalhando na invernada
De sol a sol, verão a verão!
Aqui vivo da esmola,
De uma tal bolsa-escola,
A renda da população!
No lugar de onde eu vim,
Pobre vive que nem capim,
É ração pra bicho comer...
Não tem água pra criação
tampouco pra irrigação,
A seca é de esmorecer.
Ainda havia tranqüilidade,
quando a marginalidade,
não tinha chegado ainda.
Dormia-se na varanda,
alpendre de casa grande
sob uma lua bem vinda!
E um balanço de rede,
Fazia sombra na parede
Em noite enluarada...
Despertava amores vãos
Perdidos pelo sertão
No frio da madrugada!
E acordava no escuro
Para tirar o leite puro,
Nas lidas do velho curral...
Ordenhando a vacaria
Cuidando da bicharia,
De tudo no bamburral.
Esta era a minha vida,
Olhando vaca parida,
Amansando burro brabo...
De boi fugido na jurema,
Boi safado, boi problema,
Derrubado pelo rabo!
Vim parar na periferia,
Morar nessa freguesia
Nos arredores da cidade...
Em terreno de invasão,
Construí habitação
Na minha realidade.
É uma pobre tapera
Casa de taipa, pudera,
Pela falta de recursos...
O dinheiro que me falta;
Vagabundo que me assalta,
Seguindo os meus percursos.
Vim em busca de horizontes
Novas terras, novos montes,
Novas oportunidades...
De ganhar com meu suor,
O que a vida de melhor
oferece nas cidades.
Mas aqui eu me ferrei.
Aqui eu nunca trabalhei,
Aqui eu vivo de bicos...
Como servente de pedreiro,
ajudante de carpinteiro
Nesse lugar de nanicos.
Só querem se tem estudo,
Quem é formado de tudo
E tem uma profissão!
Cidadão desqualificado,
Sujeito despreparado,
Esse não tem colocação.
Vai ficar que nem eu,
Em um tremendo liseu
Roendo a carne da unha!
Sofrendo sem saber ler,
Doidinho para aprender
Mas triste, se acabrunha!
As firmas de hoje em dia,
Procuram na maioria,
Gente jovem e experiente...
Para preencher seus quadros,
Seleciona operários
Por gente muito exigente.
Não querem saber de velho,
Para eles só o evangelho,
E as casas de repouso...
E um país de desempregados,
Famintos e desgovernados
Está na beira do poço!
Trabalho e bom salário
Cesta básica, o necessário.
É sonho de todo mundo...
Com idade produtiva
Para crescer e na ativa
Contribuir lá no fundo.
Mas o sonho do emprego
Vem como desassossego
A castigar quem precisa...
Com fome e necessidade
Crime e impunidade,
Político de cara lisa.
Deixei a várzea e a serra,
De trabalhar minha terra
De cuidar da plantação...
Pra viver nessa miséria,
Sem salário, sem a féria.
Falta arroz, falta feijão!
Meu filho virou ladrão.
Traficante e cafetão,
Mora hoje na cadeia!
Minha filha Carmelita,
Ednilda e Espedita
Vivem chorando na peia!
Estão na prostituição
Esquentando o colchão,
Da zona do cabaré...
Andando em má companhia
Suas vidas tão vazias,
Que elas perderam a fé!
Dão a quem der mais:
A moço, velho e rapaz,
Dessa vida miserável!
Forçadas na safadeza,
Que eu acho uma tristeza,
Um destino deplorável!
Minha mulher quer morrer,
Diz não agüentar viver
No meio de tanta injustiça!
Que pobre tenha que sofrer!
Mas não pra bicho comer,
Que nem urubu na carniça!
Cansou de pegar no rosário
Cansou de viver no calvário
Na penitência das orações!
E não vê o resultado;
Apenas castigo e pecado,
Os filhos nestas condições.
Todos perdidos na droga,
nesse vício que lhes joga
Nas profundezas do inferno!
Com filho matando pai
Numa violência que vai,
Contra Deus, o Pai eterno!
As mocinhas nem bem o peito
Cresce, vão deitar no leito
Da luxúria e da perdição...
Pegam elas de menor,
Que pra eles é melhor
Para a sua perversão!
Levam para restaurante
Dão perfume, refrigerante,
Celular e conversa fiada...
Viciam a infeliz,
Tornam dependente a meretriz!
e na droga viciada.
Elas logo esquecem dos pais.
E se entregam ao satanás
E se matam pra manter o vício...
Caindo num poço sem saída,
Acabando com a própria vida
Se jogando nesse precipício.
O que eu vim fazer aqui?
Se nem para os daqui
Há trabalho e emprego?
Eu agricultor sem profissão.
Reclamo e não tenho razão
De pedir ajuda e arrego!
As coisas do coração
Tão ficando sem emoção
Porque nada mais me alegra.
Nem o relincho de um cavalo,
Um boi chocalhando o badalo
Ou a mulher em fim de regra...
Porque um homem de bem
Vale mil notas de cem,
E todo o ouro da arca.
Porque dinheiro não compra
Nem mesmo com toda pompa,
A honestidade do monarca!
Honra é coisa cara,
Coisa que não se compara
Valor que não se mede...
Só os humildes e puros
Passam apertos, apuros.
E um milímetro não cede!
Não tem o instinto ruim,
Não se vestem de caim
Para se vingar do mundo...
Mas tem horas que a revolta
Aparece com escolta
E um sentimento profundo...
De chutar tudo pro alto,
E tomar tudo de assalto
E mandar tudo às favas...
Chutando o pau da barraca,
Mexendo bem essa caca
e a nossa mão escrava.
Pois o que falta nessa cidade
É espírito com humildade
Para enxergar como humanos,
Nós que somos a escória
E que passamos à história,
Com erros e desenganos.
Faz falta boa vontade
E muita solidariedade
Gente séria e honesta.
Faltam oportunidades
Amor nas comunidades
Motivo pra fazer festa.
Querem nossas filhas putas
Nossas mulheres matutas
Para varrer e limpar chão...
Nossos filhos como escroque
Levando tudo à reboque,
Como bucha de canhão!
Aqueles que se desesperam
E à cachaça se entregam
Em meio às brigas e bebedeiras...
Acabam matando alguém,
Porque não quer que ninguém,
Enfrente sua raiva matadeira.
Aqueles que se desesperam
Perdem o controle e esperam
O resto da vida na cadeia...
Por uma família que já era
Vendo eles podres numa cela
Morrendo aos poucos na peia.
Aprendendo na cadeia
Que a miséria norteia
A vida de quem é fraco...
De quem faz da violência
Sua escola, sua ciência.
E com ela faz um pacto.
Pois toda sorte de pragas
Facas, cutelos e adagas,
Tudo que a infelicidade
Pode fazer de mal a gente,
Nada è mais indigente
Que não ter felicidade.
Ser surrupiado da alegria,
Não ter paz, não ter alforria,
Roubarem seu direito de sonhar...
Porque todo homem tem direito
A ser tratado com respeito;
Ser livre para caminhar.
Então, por que cidadão,
Esse país, essa nação.
Não emprega mais seus filhos?
Não trata com mais decência
Nossa gente em sua vivência
Com um trabalho tranqüilo?
F I M !