O GRANDE ASSALTO!

Foi grande o reboliço,

Que se deu lá no cortiço

Depois daquele assalto

Quando dois desocupados,

Dois amigos e chegados,

Resolveram dar um salto

Em suas vidinhas vazias.

pra melhora de seus dias

e ter óculos Ray-ban

E novo aparelho celular...

O que pudessem comprar

Sem pensar no amanhã!

Botando dinheiro no bolso

Sem trabalho, sem esforço,

Sequer suando a camisa...

É tirar de quem tem mais!

Dizia o “mala”, rapaz,

Com o tom de quem avisa:

De que ia dar trabalho

Em sua trilha de atalho,

Roubando e assaltando...

Colocando-se em risco;

Um destino bem arisco

No rumo que ia levando.

Pegaram um pau de fogo

E começaram um jogo,

Perigoso por demais...

Assaltaram uma Lotérica

Numa rapidez milimétrica,

E não tiveram mais paz!

Com a polícia no encalço,

Pisando num cadafalso

Os meliantes correram...

E correram contra o tempo

Fugindo do contratempo,

De minutos que perderam

Quando de sua fuga

Fugindo de uma rusga

Certa com a polícia...

Achando de se esconder

Sem tempo para correr

Embaixo de uma mobília,

De uma cama de Jirau

Na casa do nego Lau

E de uma dona Zefinha...

A polícia fez revista

Atrás de alguma pista

Mas não na casa vizinha.

Revistaram seu casebre

E ele como uma lebre

Bem que soube escapulir...

Já o seu companheiro

Teve o seu paradeiro

Descoberto. Não pôde fugir!

Ingênuos os assaltantes,

Ou espertos os meliantes,

Que foram se esconder

No aconchego do lar?

Onde uma sala-de-estar,

Pode a família envolver?

Veio o cerco da polícia

Com a sina de milícia

Gastar todo seu arsenal

Atirando no bandido

Que já estava rendido

Receando mau sinal.

Subira na cumeeira

Duma casinha na beira

Daquele cortiço

E tomou bala nos cornos

Como tivesse dez corpos,

Haja chumbo no toitiço!

Pediu arrego, se entregou.

E foi o que lhe restou

Fazer para não morrer,

Crivado pelas balas

Da polícia e suas falas,

No cumprimento do dever!

Desceu daquele casebre

Quase ardendo em febre,

E com medo do pior!

Tremia, batia o queixo,

Temendo pelo desfecho,

Tremia como cipó

Pelo ato tresloucado

De um assalto malogrado

Pelo azar e a má sorte,

Com a polícia militar

Doidinha pra lhe pegar

E lhe bater até a morte.

Ao ver um batalhão

De soldados e munição

Para provocar a guerra...

Esperando-lhe na rua

Pra tirar a pele sua...

Tanto que caiu na terra.

Sacudido por um soco

Quase lhe deixa mouco,

Caindo de cara no chão...

E um chute nas costelas

E nos rins e nas patelas

E no meio do cunhão!

Arremessado por um chute

De alquém que disse: lute

Recebeu um coice de mula!

Sequer deu um gemido

Ou choramingou ferido

Por ter levado a surra!

Foi pancada nos flancos

Nos rins, de sair manco,

Para entrar na viatura...

Que a polícia com raiva

Não economiza na salva,

Nem tampouco na tortura!

É tanto chute no rim,

Que ele vai direitinho

Pra hemodiálise, na certa!

Com os rins estourados

E alguns ossos quebrados

E hematomas na testa.

Foi pego pelas calças

Como se fossem alças

E arremessado na viatura.

Sangrando por orifícios

À custa do sacrifício

Daquela cruel tortura

Oh sujeitinhos safados

Essa raça de soldados

Que aproveitam a farda

Pra bater e machucar

Pra surrar e torturar

Quando estão na guarda.

O delinqüente apanhado

Paga todos seus pecados

Por se deixar aprisionar...

Apanha pela revolta

Dos soldados da escolta

Que batem sem parar.

Foi assim que pegaram

E quase rasgaram

Em dois o Zé dentuço!

Chorando como menino

Acabrunhado, mofino

Afogando em soluço!

Já o amigo e comparsa,

E sócio em toda farsa,

Zé de Chico Bodeiro

Sumiu nas ruas estreitas,

Da polícia à espreita;

Desapareceu no facheiro!

A favela viu com aflição

O seu dia de cão

Com aquela ação militar!

Com a polícia no pé

O cidadão perdeu a fé

De paz naquele lugar.

Rita tomava banho

Quando um estranho

Entrou no seu biombo

De palha de coqueiro

No meio do terreiro

Quase levando tombo.

O banheiro improvisado,

Fê-lo ficar embasbacado

Com a nudez de Rita...

Perdeu a brutalidade

e parte da agilidade,

a sua característica.

Viu a Rita no manejo,

Graciosa no traquejo

Do uso do sabonete...

Passeando com a espuma

Em sua pele de pluma

Como fosse um joguete.

O cabo esqueceu a arma,

E até relaxou a guarda,

Diante daquela visão:

Da moça nua, em pêlo,

Tratando com todo zelo

E com total dedicação

A toda sua intimidade

Prêmio à cumplicidade

E à parceria e comunhão!

Parou ali petrificado,

E cometendo o pecado

De seu pensamento vão!

Queria ser um sabão

Espumando naquela mão,

Pelos dedos da mulata...

Que na maior ousadia

Ato contínuo percorria

Com um olhar de bravata

Acima de tudo provocador,

Extremamente sedutor

A provocar arrepio...

A instigar devaneios

Com a visão daqueles seios,

Do seu desejo arredio

De possuir a fulana

E da forma mais sacana

Que pudesse imaginar...

Rita não se incomodou,

E até lhe provocou

Fazendo o Cabo suar.

Cobriu-se com uma toalha

Deixando mudo, sem fala

O antes raivoso soldado

Que adentrou seu quintal

Procurando um marginal

Com um semblante irado

Após aquela investida,

Saiu dali com a vista

Nublada e embaçada

Com a sua libido

Sem comprimido

Em alta e recompensada

Pelo teste cardiológico

Por que passara, lógico

Depois daquele flagra!

Da moça em sua nudez

Exibindo a bela tez

E sua silhueta magra!

Depois de ficar à paisana

De montar campana

Para prender o assaltante,

A polícia desistiu.

Tanto que resistiu,

Desistia do flagrante!

O bandido se escondera

Sumira, se escafedera;

O negócio era esperar.

Era ficar de butuca,

Esperar que a cumbuca

Abrisse naquele lugar.

O fato é que o delinqüente

Aconselhado por parente

Entregou-se ao delegado!

Este se recusou prendê-lo,

Recusou-se a atendê-lo

Por não ter um mandado.

Um mandado judicial

Vindo lá do tribunal

Que autorizasse o pior:

A prisão do delinqüente

Do infrator inocente,

A prisão de um menor!

Porque era inimputável

E de forma considerável

Resguardado pela lei,

Seus direitos de menor

por um futuro melhor,

se eu entendo, não sei.

O bandido fora levado

Pela mãe e ia puxado

Pelas orelhas...

Feito menino obediente

Fora ele sorridente

Mexendo as sobrancelhas

Se entregar ao delegado

Que não se fez de rogado

Ao desistir da prisão!

Alegou não ter ordem

Pra coibir a desordem

Cometida pelo cidadão.

Prenda doutor, o rapaz!

Prenda em nome da paz

Pelo crime cometido!

Prendo não! Por quê?

Ta pensando o que?

Ele está arrependido?

O caso dele é de ação

Do juizado de menores, então

É para o conselho tutelar!

Se ninguém reclamou

É porque não burlou

A lei em seu lugar.

Leve o rapaz, seu doutor!

Disse a mãe do infrator

Com medo de represália;

Medo de vê-lo morto

Pelo caminho torto

Pisado pela sandália

De sua má companhia:

Jovens da periferia

Consumidores de droga;

Para alimentarem o vício

Jogam-se no precipício

Do crime sem volta.

Recuso-me a recebê-lo!

Disse o doutor Campelo

Encerrando o assunto.

Entregue-o ao Juiz.

Leve a ele o infeliz!

Por mim, sinto muito!

Se matarem o menino

Juro pelo mais divino

Que faço justiça!

Não querem prender

Talvez para cometer

Contra ele, injustiça.

Fique tranqüila senhora

Que não chegou sua hora,

Nem seu tempo de morrer!

Mas é bom não facilitar,

Que a coisa pode ficar

Difícil de entender.

Talvez aquele meliante

Aquele jovem assaltante

Fosse produto do meio...

De uma vida de miséria

Gente pobre, gente séria

Com governantes alheios

À educação e a trabalho

À política de salário

E renda pra população!

Gente alheia à segurança;

Alheia à nossa esperança

De uma boa educação!

Criando com seu descaso

Desmantelo e atraso

A violência urbana

Com milhões de prisioneiros

Reféns de aventureiros

De uma sociedade sacana

Consumista e mercenária

Gente vil e perdulária

Crias do capitalismo,

Gerando nos dias atuais

Situações desiguais

No caminho do abismo!

E o sonho de consumo

Tem desviado de rumo

O jovem, sem educação!

Sem estrutura familiar;

Sem alguém pra educar,

Para dar-lhe formação!

E andar com pés no chão

Sem pensar na infração,

E cometer o delito.

Por culpa da sociedade

Com sua impunidade,

Geradora de conflito!

Onde a mídia publicitária

A indústria imaginária

Criadora de bolsões

De sofrimento e miséria

Distribui como artéria

Os desenganos e ilusões

Nos outdoors das cidades

Despertando a vaidade

Do homem contemporâneo

Que através do que é fútil

Demonstra mais o inútil

Que o lado espontâneo.

Um carro novo na porta

O status é o que importa

Mais que o estilo de vida.

Que aqui vale quem tem

Mesmo uma nota de cem

é condição garantida!

F I M!

Edilberto Abrantes
Enviado por Edilberto Abrantes em 12/10/2009
Reeditado em 31/05/2018
Código do texto: T1861529
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