Costumes do nordeste> Autor: Damião Metamorfose.

Eu já li muitos cordéis,

Que falam de bicho e gente.

Uns que são obras de arte,

Ruim, péssimo e indecente.

Nessas leituras seletas,

Não li costume e dietas,

Do nordeste antigamente.

*

Nordestino mesmo ausente,

Nunca esquece a terrinha.

O sotaque é carregado,

Papy é pai, mamy é mainha.

A dieta tem buchada,

Baião de dois e rabada,

Pato peru e galinha.

*

Carne de sol com farinha,

Macaxeira ou mandioca.

Fava e feijão de corda,

Farofa, pirão, paçoca.

Arroz, cuscuz, mungunzá,

Peba, tatu e preá,

E o desjejum? Tapioca.

*

No lugar de pepsi ou coca,

Um suco de tamarindo.

Que mesmo azedo e travoso,

Serve pra ir digerindo.

Pois com o sal e a gordura,

Dar suor frio e secura

e pode morrer dormindo.

*

Quer ver matuto sorrindo,

Põe pra ele um prato cheio.

Que ele dar de um lado,

Fura até chegar no meio.

E quando a barreira cai,

Ele pergunta, tem mai,

Ô é só esse qui veio?

*

Meu povo não tem rodeio,

Comem tudo o que vier.

Detestam comer com garfo

e faca, bom é colher.

É comendo e perguntando,

Tem mais mulher? Vá botando,

Traga logo o que tiver.

*

Por isso é que a mulher,

Tem um filho todo ano.

É porque o cabra é forte,

Tem sustança e tem tutano.

Não é como os da cidade,

Que passam necessidade

e até pra amar, faz plano.

*

O nosso cotidiano,

É de casa pro roçado.

Puxando cobra pros pés,

Tirando ração pro gado.

Brocando e arrancando toco

e mesmo assim no sufoco,

sempre dar o seu recado.

*

Quem está acostumado,

Descer e subir ladeira.

A pisar em lama quente,

Viver sem eira nem beira.

Fica feliz e se empolga,

Quando tira uma folga,

Pra ir buscar a parteira,

*

Quem tem mulher parideira,

Que é feliz ao seu lado.

E que também é feliz,

Com que recebe e tem dado.

Deve agradecer a Deus,

Pelo lar e os filhos seus,

E sentir-se abençoado.

*

Mesmo não sendo estudado,

Não tendo alta patente.

Aprende em seu dia a dia,

O básico suficiente.

Pra ele sobreviver

e se falta o que fazer,

Taca o pau a fazer gente.

*

Quando olha pro nascente

E ver uma torre amarela.

Já diz logo: vai chover,

Mulher prepare a panela.

O resto é comigo, deixe,

Se chover, vou pegar peixe,

Pra fazer um pirão nela.

*

A vida aqui é singela,

O rústico é confortável.

Mas tem boa vizinhança,

Respeitosa e amigável.

Sem policia e nem cadeia

e o povo é barriga cheia,

Não tem gente miserável.

*

Aqui tudo é reciclável,

Um pneu vira cocheira.

O pinico vira um vaso,

Pra plantar uma trepadeira.

E uma câmara de ar,

É só cortar e encabar,

Que vira uma baladeira.

*

Sobras de comida ou feira,

Pro porco vira comida.

Ou serve pra adubar,

Uma planta enfraquecida.

Lama de poço ou açude,

Mesmo preta cor de grude,

Serve pra sarar ferida.

*

A velha arvore caída,

Vira banco e tamborete.

Lenha pra por no fogão,

Ou um facho de cacete.

E se não tiver cachorro,

Na hora de um, socorro!

Usa-se como porrete.

*

Quando não tem sabonete,

Usa-se qualquer sabão.

Que serve pra lavar roupas,

Pratos, pé, cabeça e chão.

Se o creme dental não dá,

Usa folhas de juá,

Pra fazer a escovação.

*

Com milho se faz o pão,

O xerém e a canjica.

O mungunzá a pamonha,

Pipoca e fuba, outra dica.

Que as mãos analfabetas,

Sabem receitas secretas,

Saudáveis e muito rica.

*

Com a fruta da oiticica,

Ou vísceras de criação.

Mistura potássio ou cinza,

Para fazer o sabão.

Fervendo até dar o ponto,

Quando o bicho fica pronto,

Arranca o coro da mão.

*

Mesmo sem alto padrão,

Nem ajuda da ciência.

Somos muito criativos,

Nas leis da sobrevivência.

O nordestino é astuto,

E esse fama de matuto,

É só mesmo a aparência.

*

Com um pouco de inteligência,

Força, coragem e saúde.

Pra não perder nossos brios,

Só basta que Deus ajude.

Por isso senhor, eu peço,

Se a violência é progresso?

Deixe-nos sem e não mude.

*

Podem nos chamar de rude,

Brocoió ou pé rachado.

Analfabeto e selvagem,

Bruto ou incivilizado.

Só não nos leve a falência,

Com a cultura da demência,

Do mundo civilizado.

*

D-eixo aqui meu obrigado,

A quem leu e entendeu.

M-inha humilde mensagem,

I-nforme a um amigo seu.

A-s belezas do nordeste,

O-nde o poeta nasceu.

Fim:

08/09/2009

Damião Metamorfose
Enviado por Damião Metamorfose em 09/10/2009
Reeditado em 05/12/2010
Código do texto: T1856248
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