O Diálogo das Flores- paulo nunes batista
O Diálogo das Flores
Paulo Nunes Batista
pnbpoeta@brturbo.com.br
Tento aqui reproduzir,
Caros amigos leitores,
Um Diálogo das Flores
Que pude um dia escutar.
E aviso aos interessados
Em ter esse privilégio
Que não há nenhum colégio
Capaz de assim ensinar.
É preciso ter ouvidos
De ouvir das flores os ditos-
Os diálogos bonitos
Que as flores sabem manter.
Quem de verdade não ama,
Quem não foi poeta um dia
Não conhece essa magia
De ouvir as flores saber.
Quem não possui esse dom
Da beleza e fantasia,
Não imagina a poesia
De esse diálogo ouvir.
É voltar talvez à infância-
A linda quadra dos sonhos-
E a esses folguedos risonhos,
Embevecido, assistir.
No Jardim das Gentilezas
(ou) vi a rosa encarnada,
de manhã cedo, orvalhada
do uruvaio da manhã.
E essa rosa, sorridente,
Falou pra uma margarida:
-Saúde! Paz! Longa Vida!
Te desejo, minha irmã!
Um cravo, exalando aromas,
Na manhã recém-nascida,
Também disse à margarida:
-Irmã, te desejo paz!
E a margarida, contente
Como uma estrela brilhante,
Respondeu no mesmo instante:
-Bom dia! É assim que se faz!
No Horto das Amizades,
Entre a beleza das flores,
Sorriam muitos amores-
Perfeitos, iucas, jasmins.
As magnólias abertas,
Orquídeas, íris, camélias,
Mal-me-queres e bromélias
Ao lado de benjoins.
As angélicas dançavam
Um balé encantador.
Exalava cada flor
Seus aromas e belezas.
As violetas e acácias,
Manjericos, quaresmeiras,
Damas-da-noite faceiras
No Jardim das Gentilezas.
As flores de ipê sorriam,
Azaléias, manacás,
Girassóis e resedás,
Tília, trevo, camarão.
Miosótis, madressilvas
E flores-de-laranjeiras,
As urzes e espirradeiras,
Saudavam a flor-de-mamão.
Rosmaninhos e trigídias,
Os velames e mamonas,
Flor-de-fumo e beladonas,
Flor-de-lotus flamboyants.
Epifilo e edelvaisse
Boa-noite, sedo, salva,
Narciso, náiade, malva
Vitória-régias, romãs.
Era esplêndido espetáculo
Ouvir lírios conversando
Com crisântemos, formando
Ao lado da flor-de-lis.
Buganvílias e calêndulas,
Com papoulas e peônias,
Cardos-mortos e begônias
Numa união mais feliz
As avencas e petúnias,
Gerânios e pessegueiros,
Hortências e limoeiros,
A flor-de-maracujá,
Flor-de-são-josé e alisso,
Quelidôneas, anserinas,
Algodão, goivos e quinas,
Flor-de-café, flor-de-ingá.
Teixo, trigo-sarraceno,
Ranúnculo, macieira,
Actínias, ameixeira,
Jurema, antúrio, lilás;
Dente-de-leão, silindra,
Sicômoro e primavera,
Jacinto, azedinha – era
A festa dos vegetais.
Flor-de-maio, amendoeira
E mais a valeriana,
Tamargueira, genciana
E palma-de-santa-rita;
Flor-de-maria-segunda,
Mais os brincos-de-princesa,
Num encontro de beleza
Em conversação bonita.
Era formoso: glicínia,
Morrião-branco, figueira,
Botão-de-ouro, amoreira,
Beijo, aninga e Jamelão
Mais a flor-de-sabugueiro,
Flor-de-chagas, abacate,
Orégão, flor-de-tomate,
Mandioca e fruta-pão.
Ouvi a chuva-de-ouro
Para o ciclame dizendo:
-os homens não estão sabendo
que se aproxima o seu fim?
E a ave do-paraiso
Ao bastão-do-imperador
Disse: - Os homens plantam a dor;
Têm de colher dor, assim...
Pois, a espada-de-são-jorge
Ao colchão-de-noiva disse:
-Querer a paz, é tolice,
se se prepara a ruína.
E um copo- de-leite, ao lado
Sorriu para a crisandália
Que sorria a uma dália,
E esta sorria à bonina.
A betúnia, o bogari
Para a boca-de-leão,
Para o salgueiro-chorão
Diziam: - pois, viva a vida!
E uma roseira-silvestre
Disse: - viva o capuchinho,
Ulmo, verônica, linho
E a rainha-margarida!
Ouvi uma flor-de-abóbora
Dizer para um camapu:
-Salve! E uma flor de caju
à lampsana falou:
-Enquanto as flores se entendem-
a seda, a flor-saborosa,-
a humanidade, raivosa,
colhe o mal que já plantou...
Enquanto a manhã corria
Mansa, tranqüila, serena,
O jasmim-manga à verbena
Disse em palavras de brilho:
-nós somos irmãs, as flores-
o lúpulo mais o loendro,
o lódão, o rodoendro,
o hemerocale, o junqüilho.
O jasmim-do-cabo, o hibisco,
O lírio-do-brejo, a umbela,
A nespereira, a nigela,
A malopa, a passiflora,
O ornitógalo, a pervinca,
O quisquale, a cerejeira,
Junto da flor-de-jaqueira,
Marmelo – que é tudo flora
O cravo-da-índia, o cólquicos,
O eufórbio, a japecanga,
A gardênia, a flor-de-manga,
A onze-horas, a ocária.
Na maior delicadeza:
A mimosa, a açucena,
O nenúfar, a flor amena,
Tudo é flor e é necessário.
Melão-de-são-caetano,
Maçaranduba, açafrão,
O morango, o pimentão,
Pimenta, sarça, cravina.
Flor-da-páscoa, flocos, gérbera,
Rubiflora, sensitivas,
Suspiros e sempre-vivas,
Aguapé, maracujina.
Ouvi ninféia, nenumbo
Falando a mandacaru,
Saboeiro, flor-de-umbu,
Melissa, flor-de-cajá.
Camomila e hematófilo –
Era um mundo de florzinhas,
Grandes e pequenininhas-
Todas as flores que há.
As flores bissexuadas;
Tulipa, zínia, repouço-
Todo esse exemplo colosso, -
Pitóspera, espinho-alvar,
A paulovnia, a polígala,
Flor-do-campo, dormideira
Que esta flora brasileira
Tem ao mundo o que mostrar.
Ouvi falando escovinhas
E uma flor-de-são-joão,
Mais o cacto, que são
Bênçãos de Deus, nosso Pai,
Nos mostram, nesse “diálogo”
Amor e fraternidade,
Enquanto que a humanidade
Em busca do Abismo vai.
Sigamos, enquanto é tempo,
O Exemplo, a Lição das Flores,
Se queremos nossas dores,
Enfim, da Terra banir.
Livremo-nos da Maldade
Que devora o reino humano,
Destruindo todo Plano
Que Deus possa construir.
Obs: nos 298 versos das 26 oitavas deste poema constam os nomes de 213 flores da flora brasileira.