A MATINTA PEREIRA
No Igarapé-Açu de Cima
Onde eu me vi menina
Corria a lenda faceira
Da tal matinta pereira
Não sei se era verdade
Ou do povo só maldade
Diziam que um grande pecado
Não confessado e não pago
Faziam um pobre coitado
Pagar com um grande fado
A tal matinta pereira
Gostava da escuridão
Só assobiava na sexta-feira
Naquele fim de mundão
O assobio era soturno
E de modo arrepiante
No silêncio do noturno
Deixava um ser fraquejante
Eu lhes digo com certeza
Eu não vi, mas ouvi
E também pude sentir
Sua presença sem beleza
Foi numa sexta-feira
Escura que nem breu
Eu e meu santo pai
Chamado de Seu Santeiro
Fomos ver nossas galinhas
No velho e bom galinheiro
Uma raposa sestrosa
Andava por lá esperta
Querendo fazer um banquete
Com nossas lindas penosas
Ficamos eu e meu pai
Quietinhos, mas de tocaia
Esperando que a raposa
Voltasse pra sua laia
E naquela escuridão
Eu pensava essa é a hora
Dona matinta pereira
Vai assobiar agora
Pois não é que de repente
Na escuridão silente
Ouvimos o tal assobio
De causar grande arrepio
Meu pai mais que depressa
Me pegou pela mão
Fugimos rápido à bessa
Correndo na escuridão
Entramos em casa ofegantes
Minha mãe tava de pé
Foi preparar um calmante
Um bom e gostoso café.
Nota: Hoje sabemos que a tal matinta pereira era um pássaro noturno, mas com um assobio realmente aterrador. Eu juro que ouvi!
Conceição Gomes