"O MATUTO QUE SE ESPANTOU COM AS MULHERES DO RECIFE" - Cordel de Tchello d'Barros

"O MATUTO QUE SE ESPANTOU COM AS MULHERES DO RECIFE"

Tchello d'Barros

Pra contar essa estória

Ó musa da poesia

Dai-me a inspiração

Por favor me seja a guia

Assoprando no ouvido

Deste que em ti confia

Vamos contar sobre Rui

Ruivinho era o apelido

Descendente de holandês

De uma negra foi parido

Pixaim loiro e mulato

Sardento e esmilingüido

Vivia lá no Agreste

E tentou criar galinha

Mas a sua vocação

Foi criar galo de rinha

Nesse esporte proibido

Muito respeito ele tinha

Ruivão das penas vermelhas

Seu galo de estimação

Vencia todas as lutas

Foi um galo campeão

Eram dupla conhecida

Por Ruivinho e Ruivão

Mas com o passar do tempo

Começou a decadência

Ruivão foi perdendo rinhas

Perdeu a sua potência

Cantava fora de hora

Acabou a competência

Ruivinho então decidiu

O belo galo vender

E alguém lá no Recife

Certamente ía querer

Comprar o galo famoso

Antes de ele morrer

Ruivão foi num saco verde

Só a cabeça de fora

Estava um pouco apertado

Furou o saco na espora

No ônibus pra Recife

A duplinha foi embora

Até hoje nenhum deles

Tinha ainda viajado

Ruivão queria cantar

Pois estava assustado

Ruivinho lhe dava milho

Pra ele ficar calado

Chegou na rodoviária

Foi logo se informar

O endereço de um mercado

Para o galo alguém comprar

E assim pegou o metrô

Que é mais fácil pra chegar

O galo se sentiu zonzo

Nesse trem em disparada

No vagão chacoalhando

Já não entendeu mais nada

Cantou alto quanto pode

Assustando a gentarada

E os dois foram expulsos

Logo no próximo ponto

E por causa da zoada

Ruivão já estava tonto

Compraram um saco d'água

Sem nem pedir um desconto

Deu de beber para o galo

Que logo se acalmou

Ruivinho olhou para os lados

E um mercado avistou

Era a Casa da Cultura

Onde ele adentrou

Ao tentar vender o galo

Pelo guarda foi barrado

Pois vender bichos ali

Não era autorizado

E se tentasse insistir

Na cela ia trancado

O galo ficou nervoso

E o saco d'água bicou

E bem na cara do guarda

É que a água esguichou

Correram logo dali

Pois o clima esquentou

E foram se esconder

Na barraca de um fiteiro

Que sugeriu um lugar

Que parece um formigueiro

No mercado São José

Vende o galo bem ligeiro

A confusão começou

No caminho do mercado

Pensou o galo Ruivão

Que seu fim tinha chegado

Pois viu ele numa esquina

Rodando frango assado

Com a espora pontuda

Abriu um rombo no saco

E escapuliu dali

Para se salvar de fato

Ruivinho correu atrás

Armando o maior barraco

Na rua havia um desfile

O que era eu não sei

Não era Maracatu

E nem Folia de Rei

Tinha uma faixa estranha:

"Dia do Orgulho Gay"

Nessa parada feliz

Viu mulheres bem bonitas

Mas olhando bem de perto

Eram meio esquisitas

Umas muito maquiadas

Outras com laços e fitas

E o galo fugitivo

Pelo desfile entrou

Entrou também o seu dono

Que então se assustou:

Isso é Frevo ou Caboclinho?

Onde é que eu estou?

Subiu num carro alegórico

Com moças usando tanga

Berrou se alguém viu um galo

Respondeu uma baranga:

Aqui não se solta o galo

Aqui se solta a franga

E disse uma de bigode:

Não vi galo nem jacu

Nem outro tipo de ave

Muito menos urubu

Mas se seguir futucando

Vai encontrar um peru

Uma mulher musculosa

Tinha o sovaco raspado

Disse: aqui não tem galo

Nem perdido nem achado

Você só vai achar pintos

Dos de pescoço pelado

E outra do peito grande

Que era siliconada

Foi lhe dizer com respeito

Para não ser despeitada

Que viu um pintão no bloco

Do Galo da Madrugada

Outra do peito pequeno

Menor do que um pequi

Estava de top less

Com marquinhas bem ali

E disse: eram duas peças

Tirei uma outra vesti

Uma pelada peluda

Usando só a calcinha

Disse: na falta do galo

Conheça uma amiga minha

Veja como é recatada

Mas no fundo é bem galinha

Outra espetaculosa

Muito forte e muito alta

Disse que não viu o galo

E com seu jeito peralta

Disse: na falta de bicho

Bicha aqui é o que não falta

Uma tal de Drag Queen

Rebolava tão formosa

Viu milho na mão de Rui

E disse espalhafatosa:

Só gostamos de sabugo

E beijou-lhe escandalosa

Uma mão desmunhecada

Trouxe uma pena do galo:

Ô moço do saco verde

vim apenas avisá-lo:

Vi o galo na sinaleira

Acredite no que eu falo

Ruivinho foi ao farol

Onde o Ruivão cantou

E agarrando o bichinho

O parceiro resgatou

E fugiu dessas mulheres

Com as quais se espantou

Não quis mais vender o galo

Correu pra sua cidade

Onde a sorte de Ruivão

Teve o destino mudado

Hoje é um reprodutor

Sendo o mais requisitado

E nosso amigo Ruivinho

Nunca se recuperou

Das mulheres do desfile

Que no Recife encontrou

Cidade de cabra-macho

Que pelo jeito mudou

Tchello d'Barros

www.tchello.art.br

Tchello d Barros
Enviado por Tchello d Barros em 03/01/2009
Código do texto: T1364839
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