"O JUSTO DESTINO DO PISTOLEIRO JUSTINO" - Cordel de Tchello d'Barros
"O JUSTO DESTINO DO PISTOLEIRO JUSTINO"
Tchello d'Barros
Vou contar uma estória
Dessas que fala em destino
Peças que a vida prega
Que parece um desatino
É o caso sem igual
De um sujeito imoral
O pistoleiro Justino
Começou há muito tempo
Lá no sertão do Nordeste
E na prova da moral
Ele não passou no teste
Vagabundo arruaceiro
Mentiroso e trapaceiro
Era um cabra-da-peste
Por uma moça bonita
Ficou muito apaixonado
E fez logo uma proposta
Pois queria ser amado
Mas por não lhe merecer
Ela disse não querer
Ele por seu namorado
Ele esbravejou de raiva
E o não não aceitou
Fitou os olhos azuis
Desta que lhe rejeitou
Desprovido de moral
Parecia um animal
E a virgem estuprou
Um rapaz que amava ela
Apesar de não ser forte
Quis tirar satisfação
Não é seu dia de sorte
Num combate estremecido
Fura o olho do bandido
Mas encontra sua morte
Naquele trágico dia
Quando se ouviu o sino
Toda a cidade chorou
Pelos crimes de Justino
Desonrou a moça linda
Matou um rapaz ainda
Se tornou um assassino
Fugiu logo da cidade
Pois iria ser linchado
Ele escapou da justiça
Mesmo sendo um culpado
E virou um fugitivo
Por esse grave motivo
De amar sem ser amado
E nove meses depois
Que tudo aquilo ocorreu
Ele soube da notícia
De seu filho que nasceu
Tinha um olho castanho
Outro de um azul estranho
A mãe no parto morreu
Assim que soube de tudo
Pensou logo em se matar
Conviver com tanta culpa
Não dava para agüentar
Mas sendo um assassino
Odiou o seu destino
E quis de Deus se vingar
Com as mãos sujas de sangue
Virou profissional
Respeitado até mesmo
Na esfera policial
Pois matava até bandido
Um matador destemido
Para o bem e para o mal
Por ter apenas um olho
Bem lembrava Lampião
Não tinha medo de nada
Já não tinha coração
Este cruel pistoleiro
Trabalhou pra usineiro
E coronéis do sertão
Cada vítima infeliz
Tinha um destino fatal
Apareciam jogados
Corpos no canavial
Com as mãos estrangulava
Ou então apunhalava
O resultado era igual
Pra encomenda importante
De crime sofisticado
Como apagar um prefeito
Ou matar um deputado
Preferia arma de fogo
E pra jogar bem o jogo
Cobrava preço dobrado
Depois de cada serviço
Um alívio sentia
Seu corpo ficava leve
Sua alma bem vazia
E se vingava de Deus
Matando os filhos Seus
Assim ele se iludia
E com o passar do tempo
Virou mestre do ofício
Já nem piscava o olho
Na hora do sacrifício
De mais um executado
Era só mais um finado
Nem lembrava do início
Quando era contratado
Para uma nova missão
Não perguntava motivos
Agia com discrição
Não tinha pena do morto
Depois ficava absorto
Fazendo uma oração
Então o justo destino
Um dia lhe alcançou
Quando foi matar um padre
O padre lhe abençoou
Disse que sua saída
Era escolher outra vida
E depois lhe perdoou
Naquela noite de lua
O bandido estremeceu
Sentiu que era um aviso
Que o destino lhe deu
Repassou em sua mente
Sua vida num repente
Tudo que lhe aconteceu
Se passaram tantos anos
Na estrada da perdição
Fez tantas barbaridades
E caiu em tentação
Não pensava que um dia
Sua vida mudaria
Nas palavras de um perdão
Decidiu naquela noite
Recomeçar sua vida
Aposentar suas armas
Com a alma arrependida
E qualquer atrocidade
Por bem e pela verdade
Seria agora esquecida
Mas faltava terminar
Um serviço encomendado
O cliente já pagou
A palavra tinha dado
E só depois desse crime
É que ele se redime
De todo o seu passado
O seu alvo desta vez
Era um sindicalista
Um jovem advogado
E lutador ativista
Poderosos lhe pediram
Pra matá-lo e exigiram
Não deixar nenhuma pista
Com a arma carregada
E apesar de decidido
Preparou a emboscada
Com coração dividido
Só mais este sacrifício
Daria fim ao suplício
Dessa vida de bandido
Quando encontrou o alvo
Pra cumprir o seu destino
Mirou no meio dos olhos
Gelou o sangue Justino
O olho azul outro castanho
Nesse encontro tão estranho
Conheceu o seu menino
Tchello d’Barros
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