A EDUCAÇÃO E O CORDEL NO BRASIL COLONIAL

Por Rosa Regis

Grande Pai do Universo
Um profundo mediar,
A mim, pequena poeta,
Dai, pra que eu possa falar,
Do Brasil Colonial,
De como foi, afinal,
Sua forma de educar.

Mil Quinhentos e Quarenta
E Nove, com a chegada
Dos jesuítas aqui
No Brasil, iniciada,
É a história educativa
Tendo em si a intenção viva
Da conversão programada.

Agindo com rapidez
Nas aldeias vão entrando
E conventos e colégios
Vão erguendo e comandando.
Por dois séculos são senhores
Do saber. Educadores
Com o ensino ao seu comando.

Índios aprendiam a ler,
A escrever, a contar
E a falar português
Sem direito de optar
Por sua própria cultura,
Havendo uma ruptura
No seu modo de pensar.

Submetida à igreja,
A família patriarcal
Segue, pois, as tradições
Vindas lá de Portugal.
Isso ao padre jesuíta,
Certamente, facilita
Total controle, afinal.

Por excelência, humanistas,
Os jesuítas buscavam
Incutir nos seus discípulos
O que mais lhe agradavam:
A educação moldada
Por Portugal, e aplicada,
Líderes da fé formavam.

Leitura e escrita, de início,
Depois vem humanidades,
Teologia e ciência
Nas duas grandes cidades:
Todos os Santos – Bahia,
São Sebastião teria
Escolas de qualidades.

Grandes latifundiários
Na era colonial
Portuguesa, dominavam
De uma forma geral,
Nosso querido Brasil:
As suas riquezas mil
E o educacional.

Findando a aristocracia
Tem início a divisão
Do trabalho que, em escala,
Tem nova aplicação
Pois o grande produtor
Rural tem como prior,
Do Estado, a organização.

A vinda dos jesuítas
Traz consigo a educação,
Onde escolas são formadas
Com o fim de doutrinação
Para a escrita, a leitura,
Canto... Gente com cultura
Para comandar missão.

Em sendo assim, as escolas,
Feitas para doutrinar
Os índios, logo em seguida,
Passaram a ensinar,
Também, cristãos e gentios.
Passando, com tais desvios,
A, no fim, se destacar.

Estava, pois, embutido,
Desde o início, sim senhor,
Nas missões cristãs, vos digo,
O papel do educador.
Os índios domesticados,
Mansos, alfabetizados,
Baixam a cabeça ao Senhor.

Com o tempo, o Brasil mostra,
No campo da educação,
Herança dos portugueses
Que tinham como intenção
O comando da igreja
Porque, por ela, se enseja,
Por certo, a laicização.

O sistema educativo
Era bastante precário
No que diz respeito mesmo
Ao básico ensino primário
Pois as escolas seguiam
Normas que lhes impediam
De ofertar o necessário.

Conteúdo educativo
Definido ou proibido,
O livro tinha que ser
Liberado pra ser lido.
O ensino, em localidades,
Dentro das propriedades,
Pelos padres, dirigido.

No século XVI
Nova metodologia
Pelo padres jesuítas,
No ensino à Teologia-
Política vem, afinal,
Com encenação teatral.
Mudando a pedagogia.

Novas constituições
Foram, pois, elaboradas,
Onde a poética e a retórica
Seriam priorizadas.
Colégios da Companhia
De Jesus se obrigaria
Como aula priorizada.

Optando pelo humanismo
De cultura e formação,
Opondo-se claramente
Ao de erudição,
Os jesuítas usavam
Técnicas que aplicavam
Para a memorização

Eram técnicas mnemônicas
Em que a representação
Teatral tinha por fim
A fácil assimilação
Pois o texto era falado
E também representado,
Causando a fixação.

E tudo isso era feito
Tendo o ponto principal
De direção, os burgueses,
Que manipulam, em geral:
O comércio, a educação,
E a indústria. Tendo, à mão,
A economia, afinal.
......................

E lá... No Brasil Colônia
Os castigos corporais
Eram comuns! Permitidos
Pelas leis e, ademais,
Com a permissão da Igreja
Como natural, se enseja:
Não era nada demais.

O negro era açoitado,
Depois picado à navalha
Ou faca que corte bem,
Pelo seu “dono” que espalha
Sal por sobre os ferimentos,
Sem dó dos seus sofrimentos.
Da sua dor, ainda malha!

Ao sal seria acrescido
Sumo de limão, urina...
E o negro, acorrentado,
Seria. Que triste sina!
Nenhum dos tais torpes atos,
Encetados com aparatos,
Ao Senhor incrimina.

Outros castigos, também,
São ainda utilizados:
A palmatória, os chicotes
De couro cru e encerados,
E as argolas que os prendiam
Seus movimentos tolhiam,
Ao serem dependurados.

O castigo dependia
Do tipo de infração
Cometida pelo negro.
O senhor, sem coração,
Poderia espancá-lo
E até mesmo matá-lo,
Se achasse ser a opção.

Como pensar a pessoa
Que agia assim tão mal
Dissesse estar educando
E achando isso normal?
Espancando até matar
Como forma de ensinar.
Mal comparando, um chacal.
...
Mas falemos dos poetas.
Do seu belo poetar,
De como o cordel chegou
No Brasil, vindo parar
No Nordeste brasileiro
Trazido no bagageiro
De alguém, que aqui veio morar.

Remonta à Idade Média
A origem do cordel,
Quando os poetas, rimando,
Fazendo bem seu papel,
Contavam estórias incríveis
De guerreiros invencíveis
Com invenções a granel.

Narrativas de amor,
De heroísmo, de guerra,
De viagens, de conquistas
Pelo mar ou pela terra.
Falando de injustiça,
De inveja, de cobiça,
Do castigo pra quem erra.

Os colonos portugueses
Para o Brasil vão trazer
Na bagagem, as folhas soltas
E, aqui, quem sabe ler,
Decora e passa adiante.
A memória, d’ora avante,
As irão enriquecer.

Porém só no Décimo Nono
Século, enfim, surgirão
Os primeiros cordelistas
Cujos trabalhos serão
Escritos e publicados,
Nas feiras livres cantados
E ouvidos com emoção.

Entre 1840 e 1850 nasceram os poetas: Germano da Lagoa, Romano da Mãe D’água ou Romano do Teixeira e Silvino Pirauá.

Uma glosa de Germano da Lagoa
Mote: Tudo são honras da casa

Da casa viva a fronteira,
Calçada, quina e oitão,
Armário, baú, caixão,
Sala, corredor, traseira,
Quartinha, pires, chaleira,
E o bico por onde vaza,
Torno, pote, copo e asa,
Chinelo, botina e meia,
Caibros, pregos, ripa e teia,
Tudo são honras da casa!

Na década de 1860 nasceram nomes de grande vulto, como João Benedito, José Duda e Leandro Gomes de Barros (1865-1918).
A Seca do Ceará

De Leandro Gomes de Barros

Seca a terra, as folhas caem,
Morre o gado, sai o povo,
O vento varre a campina,
Rebenta a seca de novo;
Cinco, seis mil emigrantes
Flagelados retirantes
Vagam mendigando o pão,
Acabam-se os animais
Ficando limpo os currais
Onde houve criação

...

Depois, já na década de 1880, vieram Francisco das Chagas Batista, Antônio Batista Guedes, Firmino Teixeira do Amaral e João Martins de Ataíde.

Peleja de Laurindo Gato
com Marcolino Cobra Verde

de João Martins de Ataíde

Na Paraíba do Norte
entre Curato e Batalha
morava Laurindo Gato
cantador de profissão
foi ele o melhor poeta
que andou o alto sertão

Quando afinava a viola
para tocar um baiano
seu repente era seguro
no martelo era tirano
nunca foi repreendido
nem sequer por um engano
...
Também dos dois quem perder
a guela não estando rouca
no mesmo instante recebe
um lindo beijo na boca
do marmanjo Pedro Zumba
com o seu bigode de sopa

...
Tinha tocado seis horas
naquela reunião
me deram para cear
uma fatia de pão
e deram a Laurindo Gato
cabidela com feijão
Eu tirei minha viola
Laurindo tirou a sua
a dele toda bonita
e a minha feia e nua
eu disse com meus botões
a volta hoje aqui é crua

M - Amigo Laurindo Gato
desculpe minha expressão
eu sabendo que você
tem a fama de valentão
vou tirar sua bravura
na sola do cinturão
...

L - Eu canto martelo
não tenho rival
e tu és igual
a um pinto nuelo
eu hoje te pelo
não deixo um canhão
te boto no chão
arranco a moela
quebro-te a costela
rasgo o coração

M - Eu hoje te agarro
covarde bandido
sujeito atrevido
no focinho escarro
tu comes catarro
dizendo: é canjica
te meto a tabica
nesse cabelouro
arranco-te o couro
sujeito marica
...
E continuam a peleja até um dos dois ser derrotado pelo outro.

Na década de 1920 houve uma expansão muito grande da poesia escrita sem que a poesia oral perdesse espaço. Viu-se o surgimento de muitos poetas, principalmente na região que vai de Pernambuco até o Ceará, envolvendo a Paraíba e o Rio Grande do Norte.

O renomado escritor
J. Borges reescreveu
E ilustrou o QUIXOTE,
De um modo todo seu,
Em versos metrificados,
Rimados e trabalhados,
Com o dom que Deus lhe deu.(Rosa Regis)

Começa assim o Quixote de J. Borges:

Existia uma grande aldeia
igual a outras que havia
e lá tinha um fidalgo
magro, mas sempre comia
carnes, fritos e lentilhas
ovos e tudo que existia.
...
Lia tanto que ficava
delirando a vida inteira
e via em sua frente
bruxos, dragão, feiticeira
combates e desafios
que terminavam em asneira.

Dom Quixote luta com os cangaceiros do nordeste e Dulcinéia (sua amada imaginada) vira Maria Bonita.

Lutou com os cangaceiros
perdeu na luta maldita
pensou ser a Dulcinéia
que seu coração palpita
mas quando levantou
era Maria bonita.

.................

E terminando o trabalho
Que me foi encomendado
Pela Professora Emília ,
Espero ter agradado.
Mas tem ainda um presente:
Uma chegança decente
De um cabra mesmo arretado.(Rosa Regis)

Chegança
(Antonio Nóbrega)

sou Pataxó,
sou Xavante e Cariri,
Ianomani, sou Tupi
Guarani, sou Carajá.
Sou Pancaruru,
Carijó, Tupinajé,
Potiguar, sou Caeté,
Ful-ni-o, Tupinambá.

Depois que os mares
dividiram os continetes
quis ver terras diferentes.
Eu pensei: "vou procurar
um mundo novo,
lá depois do horizonte,
levo a rede balançante
pra no sol me espreguiçar".

eu atraquei
num porto muito seguro,
céu azul, paz e ar puro...
botei as pernas pro ar.
Logo sonhei
que estava no paraíso,
onde nem era preciso
dormir para se sonhar.

Mas de repente
me acordei com a surpresa:
uma esquadra portuguesa
veio na praia atracar.
Da grande-nau,
um branco de barba escura,
vestindo uma armadura
me apontou pra me pegar.

E assustado
Eu dei um pulo da rede,
pressenti a fome, a sede,
e pensei: "vão me acabar".
me levantei de borduna já na mão.
Ai, senti no coração,
o Brasil vai começar.

Rosa Ramos Regis da Silva

Natal, 15 de setembro de 2008.