BILOVINO FERREIRA - O CANGACEIRO DESERTOR
(Trecho do Cordel)
CANGACEIROS XII
BILOVINO FERREIRA
O CANGACEIRO DESERTOR
Cangaceiro no passado
Retirante no presente
Duas figuras distintas
Um sofrido, outro valente
Duas fases detalhadas
Duas marcas registradas
Deste meu Nordeste quente.
Os poetas do repente
No seu jeito glosador
Exploram essas histórias
Com poesia de valor.
Muitas vezes inventando
Outras, comentam cantando
Como tudo se passou.
O cangaço se acabou
Há seis décadas atrás
Restou somente as histórias
E registros nos anais
Mas nunca entrou em arquivo
Continua muito vivo
Nos folguedos regionais.
Nas esferas federais
Se comenta a passo dado
Que o cangaço não findou-se
Apenas mudou de lado
Chapéu virou “colarim”
E em vez de roupas de brim
É tudo empalitosado.
Nossos trajes de xaxado
Nos ginásios e terreiros
Retrata ainda a cultura
Dos coronéis e coiteiros
Seja na dança ou teatro
Se usa as tralhas e tratos
Do tempo dos cangaceiros.
Lampião foi o primeiro
Que esse moda criou
E a dança do xaxado
Foi ele que começou
Com sua morte o cangaço
Ficou fadado ao fracasso.
E pouco tempo durou.
Zito Júnior, Professor
E teatrólogo de fé
Filho de Zito Siqueira
Um poeta de mister
Seu pai deixou este plano
Mas o filho é soberano
Na poesia de Sumé
O sertão se transformou
Com esse bando afastado:
Cobra-Verde, Moita–Braba
Com Dedéia amancebado
Jesuína com Mormaço
E Meia-Cara, o cangaço
Por Bilovino formado.
Cinco homens bem armados
E duas mulheres no eito
Mas vou deixá-los no mato
Muito embora contrafeito
E mais na frente o destino
Do bando de Bilovino
Eu conto tudo direito.
João Tripa era um sujeito
De uma vila do sertão
Cambista em jogo de bicho
E amante da religião
Mesmo não sendo estudado
Era bem considerado
Um pacato cidadão.
Sendo um belo rapagão
Era um bom namorador
A filha de um coronel
Por ele se apaixonou
João usando de artimanha
A envolveu com tal façanha
Que a tal mocinha embuchou.
A coisa se complicou
Prá o cambista aventureiro
O pai, Coronel Clarú
Vendo a filha em desespero
Mandou dar cabo do moço
Que escapuliu do alvoroço
E caiu no marmeleiro.
Levou consigo o dinheiro
Que já havia apurado
Quase 600 contos
Era dinheiro emetrado,
Honesto, cheio de zelo
Mas sem poder devolvê-lo
João ficou preocupado.
Com o dinheiro bem guardado
Se embrenhou pelo sertão
Comendo jabá bichada
Trazida em seu matulão
Forrou o chão e dormiu
E enquanto dormia viu
Em sonho uma assombração.
Logo aquela aparição
Começa a atormentá-lo
Dizendo “Estou aqui
Somente prá acompanhá-lo
Nada acontece contigo
Pois na hora do perigo
Eu chego para salvá-lo.”
Em meio a um grande estalo
A assombração sumiu
João Tripa, sobressaltado,
Levantou-se e nada viu
Mas ao virar pro outro lado
Um sujeito bem armando
Em sua frente surgiu.
João Tripa não reagiu
Quando viu uma cabroeira
Cercá-lo, todos armados
De carabina e peixeira,
O grupo que ia chegando
Era exatamente o bando
De Bilovino Ferreira.
Foram logo na algibeira
Com um chave de braço
E tomaram do cambista
De todo dinheiro o maço.
O cabra que lhe atacou
Foi o primeiro que chegou:
O cangaceiro Mormaço.
João cheio de embaraço
Pediu prá não ser roubado
Que o dinheiro que levava
Havia sido emprestado
Isso fez a cabroeira
Rir de sua tremedeira
Deixando o pobre humilhado.
Bilovino, moderado,
Mandou logo devolver
O dinheiro do coitado
Que não tinha nada a ver
E fazendo um estardalhaço
O cangaceiro Mormaço
Não quis lhe obedecer.
Além de não lhe atender
Ainda desafiou
O chefe para um duelo
E logo o tempo fechou
Na faca os dois atracados
Pelos outros rodeados
Bilovino o assassinou.
Só então interrogou
O cambista tabaréu
Com todo aquele dinheiro
Sozinho ali no vergel
Ficou feliz com a história
Porque tinha desde outrora
Intrigas com o coronel.
Indo do inferno ao céu
João sentiu-se aliviado
Por ter escapado desta
Depois de ser dominado
E também pelo dinheiro
Que pertencia ao banqueiro
Não ter sido ali roubado.
Mas ficou preocupado
Quanto viu que o bandoleiro
Pegou as armas do morto
E para seu desespero
Entregou em sua mão
E lhe impôs a condição
De se tornar cangaceiro.
João, que sempre foi ordeiro
Não pôde nem responder
Só sabia passar bicho
Mas com medo de morrer
Entregou-se ao seu destino
E as ordens de Bilovino
Teve que obedecer.
O bando ia atender
De um coiteiro o chamado
João ficaria ali mesmo
Prá desviar algum soldado
Todos pegaram o caminho
E ele ao ficar sozinho
Se sentiu aliviado.
Poucos minutos passados
A primeira confusão:
Escuta uma cantoria
Vindo em sua direção
E viu saindo das matas
Um padre, algumas beatas
E um veado sacristão.
O padre conhecia João
E ficou admirado
Por encontrá-lo no mato
Com aquelas roupas e armado
Começaram a conversar
Com João passando a contar
O que tinha se passado.
De repente, do outro lado
Aparece a cabroeira
Já foram roubando tudo
Numa grande bagaceira
Jóias, dinheiro, guardados,
Deixou tudo sem calçados
Queimando os pés na poeira.
E saíram na carreira
Pois já vinham perseguidos
As mulheres cangaceiras
Vão atrás dos oprimidos
Começa daí por diante
Fugindo de uma volante
A divisão dos bandidos.
Moita-Braba ouve um ruído
Sem os outros perceber
Se distancia temendo
O que possa acontecer
Dá de cara com um soldado
E ali no mato, isolado,
É o primeiro a morrer.
E começa a aparecer
Polícia por todo lado
Chove chumbo na chapada
Deixando o chão encharcado
Fumaça forma parede
Cai sem vida Cobra-Verde
João Tripa mata um soldado.
E todo o plano traçado
De ir para Mossoró
O bando de Bilovino
Deu com a cara no pó
Pois os bandidos do bando
Foi um a um se acabando
Lá mesmo no cafundó.
Em meio ao forrbodó
A munição fica rara
João Tripa corre e se esconde
Por detrás de uma coivara
Com o dobro de soldado
Bilovino é baleado
Também morre Meia-Cara.
A polícia se prepara
Prá acabar com o baleado
Quando aparece João Tripa
Tremendo desconfiado
O Tenente é surpreendido
Pois o Tripa é conhecido
Dele e dos outros soldados.
O cambista é interrogado
Lá mesmo no tabuleiro
E conta toda a história
Do coronel, do dinheiro
Do padre, das rezadeiras
Da fuga das cangaceiras
E de ele ser cangaceiro.
Não foi feito prisioneiro
Porque lhe deram razão
Mas prenderam Bilovino
Mesmo caído no chão
E depois de acorrentado
Iam levar desmaiado
Prá se tratar na prisão.
Mas o cangaceiro João
Conversa com o delegado
Oferecendo dinheiro
Prá soltar o baleado
O tenente então se impôs
E o diálogo dos dois
Eu deixo aqui registrado.
TRIPA:Eu sei que o delegado
É um hômi muito ordeiro
E sua função aqui
É acabar com cangaceiro
Mas poupe ao mêno esse hômi
Que ta quase lobisôme
No suspiro derradeiro.
TEN: Mas a órde é de matar
Tudo que é justiceiro.
TRI: Mas isso num dá dinheiro!
TEN: O que você quer dizer
Falando essas bobage?
TRI: Vocês já mataro dois,
Já dá prá contá vantage.
TEN: Matemo três, João Cambista,
Tem outro ali na passage
Cabra lutadô dos bão
Morreu de punhá na mão
Mostrando sua corage.
TRI: E se eu lhe pagá, tenente,
Aqui na hora em dinheiro?
TEN: Tu quer me pagá fiança
Prá sarvá um cangaceiro?
TRI: Se tu quisé pagarei.
TEN: Fiado não aceitarei.
TRI: Taquí 400 conto.
TEN: Mas isso num sarva a vida
De um bandido matreiro.
(João tira de outro bolso
Mais um maço de dinheiro)
TR I: E com seiscentos conto,
Tu se dá por satisfeito?
(Tenente pega o dinheiro)
TEN: O negoço tá perfeito
(E fala para os soldados)
TEN: Deixem este cabra vivo
Vamimbora prá cidade
Tripa tá pagando caro
Pela sua liberdade.
(Tripa fala sorridente)
TRI: Muito obrigado, tenente,
Pela sua lealdade.
TEN:Mas preste atenção João Tripa
Um aviso vou lhe dar
Reze muito, muito mesmo,
Prá meu camim num cruzar
Esqueça esse delegado
Porque senão obrigado
Eu serei de te matar.
TRI: Saiba senhor delegado
Que esse gosto não terá
Noticias de minha pessoa
Com certeza não vou dar
Eu vou para o Sul, tenente
Deixá essas terra quente
Vou morar noutro lugar.
TEN: Espero que o senhor cumpra
O que acabou de falar.
Vou levar esses defuntos
Mode mandar sepultar
Mas na praça da matriz
Os corpos dos infiliz
Nós queremos amostrar.
Tripa trata de tratar
De Bilovino a ferida
O ferido lhe agradece
Por ter lhe salvado a vida
João lhe responde sorrindo
“Só tô lhe retribuindo
A minha que lhe é devida.”
Na hora da despedida
Sai um para cada lado
Bilovino pro cangaço
Tripa, como combinado
Vai para o Sul do país
Onde viverá feliz
Com medo de ser caçado.
Recorda o sonho passado
E lembra da assombração
Que prometeu protegê-lo
Nas horas de confusão
Tendo a promessa cumprido.
Saltitante e divertido
Sai cantando esta canção.
“Eu nasci num pé de serra
Que nem perto passa um bonde
Só tem caverna esquisito
Aonde as feras se escondem
Que dando um grito de um lado
A outra serra responde.”
Edileuza Franco Vega
Funcionária Pública
Hospital Universitário
Campina Grande - Paraiba
Edileuza Franco Vega
Funcionária Pública
Hospital Universitário
Campina Grande - Paraiba
De um galego descendente de Holandesa com
Português e uma bisneta de Índia Panati, nas-
ceu José Medeiros de Lacerda, mais um des-
cendente das sete irmãs da Cacimba da Velha.
Aos 8 anos, já escrevia estórias do seu imagi-
nário, como O Aventureiro, descrevendo a saga
de um garoto criado entre as matas da Várzea
Comprida na Fazenda Passagem do Meio, de
seus avós maternos. Com 12 anos, extremamen-
te amante dos estudos, viu seu sonho desmoro-
nar-se. Só homem já feito conseguiu voltar às
salas de aula, de onde nunca mais saiu. Primeiro
como aluno, depois professor. O sangue de Tro-
peiro da Borborema herdado do pai, o fez percor-
rer o Brasil, de Roraima ao Paraná, carregando
seus sonhos, compondo seus poemas, idealizan-
do seus cordéis. No teatro foi ator, dançarino, co-
reógrafo, autor, na poesia um aprendiz, do Cordel
é professor. Em Santa Luzia, constituiu família, em
Patos concluiu seu curso de Letras na atual FIP.
Hoje se realiza vendo seus cordéis lidos, em todos
os Estados do Norte e Nordeste brasileiro. E mais
feliz fica, vendo várias escolas pelo Brasil a fora
vivenciando sua poesia em sala de aula. Seus cordéis
têm cunho educativo, informativo, histórico, nunca
usados como desabafos íntimos, válvulas de escape
diante das pressões existenciais. Hoje com mais de
180 folhetos escritos, faz da poesia sua terapia ocu-
pacional. Seus netos, e sua primeira bisnetinha lhes
proporcionam tudo que ainda lhe resta para se emo-
cionar, procurando dar-lhes o que ele não teve direito
em sua infância... Seus pais, de saudosa memória,
foram apenas o começo de sua história!!!...
(Trecho do Cordel)
CANGACEIROS XII
BILOVINO FERREIRA
O CANGACEIRO DESERTOR
Cangaceiro no passado
Retirante no presente
Duas figuras distintas
Um sofrido, outro valente
Duas fases detalhadas
Duas marcas registradas
Deste meu Nordeste quente.
Os poetas do repente
No seu jeito glosador
Exploram essas histórias
Com poesia de valor.
Muitas vezes inventando
Outras, comentam cantando
Como tudo se passou.
O cangaço se acabou
Há seis décadas atrás
Restou somente as histórias
E registros nos anais
Mas nunca entrou em arquivo
Continua muito vivo
Nos folguedos regionais.
Nas esferas federais
Se comenta a passo dado
Que o cangaço não findou-se
Apenas mudou de lado
Chapéu virou “colarim”
E em vez de roupas de brim
É tudo empalitosado.
Nossos trajes de xaxado
Nos ginásios e terreiros
Retrata ainda a cultura
Dos coronéis e coiteiros
Seja na dança ou teatro
Se usa as tralhas e tratos
Do tempo dos cangaceiros.
Lampião foi o primeiro
Que esse moda criou
E a dança do xaxado
Foi ele que começou
Com sua morte o cangaço
Ficou fadado ao fracasso.
E pouco tempo durou.
Zito Júnior, Professor
E teatrólogo de fé
Filho de Zito Siqueira
Um poeta de mister
Seu pai deixou este plano
Mas o filho é soberano
Na poesia de Sumé
O sertão se transformou
Com esse bando afastado:
Cobra-Verde, Moita–Braba
Com Dedéia amancebado
Jesuína com Mormaço
E Meia-Cara, o cangaço
Por Bilovino formado.
Cinco homens bem armados
E duas mulheres no eito
Mas vou deixá-los no mato
Muito embora contrafeito
E mais na frente o destino
Do bando de Bilovino
Eu conto tudo direito.
João Tripa era um sujeito
De uma vila do sertão
Cambista em jogo de bicho
E amante da religião
Mesmo não sendo estudado
Era bem considerado
Um pacato cidadão.
Sendo um belo rapagão
Era um bom namorador
A filha de um coronel
Por ele se apaixonou
João usando de artimanha
A envolveu com tal façanha
Que a tal mocinha embuchou.
A coisa se complicou
Prá o cambista aventureiro
O pai, Coronel Clarú
Vendo a filha em desespero
Mandou dar cabo do moço
Que escapuliu do alvoroço
E caiu no marmeleiro.
Levou consigo o dinheiro
Que já havia apurado
Quase 600 contos
Era dinheiro emetrado,
Honesto, cheio de zelo
Mas sem poder devolvê-lo
João ficou preocupado.
Com o dinheiro bem guardado
Se embrenhou pelo sertão
Comendo jabá bichada
Trazida em seu matulão
Forrou o chão e dormiu
E enquanto dormia viu
Em sonho uma assombração.
Logo aquela aparição
Começa a atormentá-lo
Dizendo “Estou aqui
Somente prá acompanhá-lo
Nada acontece contigo
Pois na hora do perigo
Eu chego para salvá-lo.”
Em meio a um grande estalo
A assombração sumiu
João Tripa, sobressaltado,
Levantou-se e nada viu
Mas ao virar pro outro lado
Um sujeito bem armando
Em sua frente surgiu.
João Tripa não reagiu
Quando viu uma cabroeira
Cercá-lo, todos armados
De carabina e peixeira,
O grupo que ia chegando
Era exatamente o bando
De Bilovino Ferreira.
Foram logo na algibeira
Com um chave de braço
E tomaram do cambista
De todo dinheiro o maço.
O cabra que lhe atacou
Foi o primeiro que chegou:
O cangaceiro Mormaço.
João cheio de embaraço
Pediu prá não ser roubado
Que o dinheiro que levava
Havia sido emprestado
Isso fez a cabroeira
Rir de sua tremedeira
Deixando o pobre humilhado.
Bilovino, moderado,
Mandou logo devolver
O dinheiro do coitado
Que não tinha nada a ver
E fazendo um estardalhaço
O cangaceiro Mormaço
Não quis lhe obedecer.
Além de não lhe atender
Ainda desafiou
O chefe para um duelo
E logo o tempo fechou
Na faca os dois atracados
Pelos outros rodeados
Bilovino o assassinou.
Só então interrogou
O cambista tabaréu
Com todo aquele dinheiro
Sozinho ali no vergel
Ficou feliz com a história
Porque tinha desde outrora
Intrigas com o coronel.
Indo do inferno ao céu
João sentiu-se aliviado
Por ter escapado desta
Depois de ser dominado
E também pelo dinheiro
Que pertencia ao banqueiro
Não ter sido ali roubado.
Mas ficou preocupado
Quanto viu que o bandoleiro
Pegou as armas do morto
E para seu desespero
Entregou em sua mão
E lhe impôs a condição
De se tornar cangaceiro.
João, que sempre foi ordeiro
Não pôde nem responder
Só sabia passar bicho
Mas com medo de morrer
Entregou-se ao seu destino
E as ordens de Bilovino
Teve que obedecer.
O bando ia atender
De um coiteiro o chamado
João ficaria ali mesmo
Prá desviar algum soldado
Todos pegaram o caminho
E ele ao ficar sozinho
Se sentiu aliviado.
Poucos minutos passados
A primeira confusão:
Escuta uma cantoria
Vindo em sua direção
E viu saindo das matas
Um padre, algumas beatas
E um veado sacristão.
O padre conhecia João
E ficou admirado
Por encontrá-lo no mato
Com aquelas roupas e armado
Começaram a conversar
Com João passando a contar
O que tinha se passado.
De repente, do outro lado
Aparece a cabroeira
Já foram roubando tudo
Numa grande bagaceira
Jóias, dinheiro, guardados,
Deixou tudo sem calçados
Queimando os pés na poeira.
E saíram na carreira
Pois já vinham perseguidos
As mulheres cangaceiras
Vão atrás dos oprimidos
Começa daí por diante
Fugindo de uma volante
A divisão dos bandidos.
Moita-Braba ouve um ruído
Sem os outros perceber
Se distancia temendo
O que possa acontecer
Dá de cara com um soldado
E ali no mato, isolado,
É o primeiro a morrer.
E começa a aparecer
Polícia por todo lado
Chove chumbo na chapada
Deixando o chão encharcado
Fumaça forma parede
Cai sem vida Cobra-Verde
João Tripa mata um soldado.
E todo o plano traçado
De ir para Mossoró
O bando de Bilovino
Deu com a cara no pó
Pois os bandidos do bando
Foi um a um se acabando
Lá mesmo no cafundó.
Em meio ao forrbodó
A munição fica rara
João Tripa corre e se esconde
Por detrás de uma coivara
Com o dobro de soldado
Bilovino é baleado
Também morre Meia-Cara.
A polícia se prepara
Prá acabar com o baleado
Quando aparece João Tripa
Tremendo desconfiado
O Tenente é surpreendido
Pois o Tripa é conhecido
Dele e dos outros soldados.
O cambista é interrogado
Lá mesmo no tabuleiro
E conta toda a história
Do coronel, do dinheiro
Do padre, das rezadeiras
Da fuga das cangaceiras
E de ele ser cangaceiro.
Não foi feito prisioneiro
Porque lhe deram razão
Mas prenderam Bilovino
Mesmo caído no chão
E depois de acorrentado
Iam levar desmaiado
Prá se tratar na prisão.
Mas o cangaceiro João
Conversa com o delegado
Oferecendo dinheiro
Prá soltar o baleado
O tenente então se impôs
E o diálogo dos dois
Eu deixo aqui registrado.
TRIPA:Eu sei que o delegado
É um hômi muito ordeiro
E sua função aqui
É acabar com cangaceiro
Mas poupe ao mêno esse hômi
Que ta quase lobisôme
No suspiro derradeiro.
TEN: Mas a órde é de matar
Tudo que é justiceiro.
TRI: Mas isso num dá dinheiro!
TEN: O que você quer dizer
Falando essas bobage?
TRI: Vocês já mataro dois,
Já dá prá contá vantage.
TEN: Matemo três, João Cambista,
Tem outro ali na passage
Cabra lutadô dos bão
Morreu de punhá na mão
Mostrando sua corage.
TRI: E se eu lhe pagá, tenente,
Aqui na hora em dinheiro?
TEN: Tu quer me pagá fiança
Prá sarvá um cangaceiro?
TRI: Se tu quisé pagarei.
TEN: Fiado não aceitarei.
TRI: Taquí 400 conto.
TEN: Mas isso num sarva a vida
De um bandido matreiro.
(João tira de outro bolso
Mais um maço de dinheiro)
TR I: E com seiscentos conto,
Tu se dá por satisfeito?
(Tenente pega o dinheiro)
TEN: O negoço tá perfeito
(E fala para os soldados)
TEN: Deixem este cabra vivo
Vamimbora prá cidade
Tripa tá pagando caro
Pela sua liberdade.
(Tripa fala sorridente)
TRI: Muito obrigado, tenente,
Pela sua lealdade.
TEN:Mas preste atenção João Tripa
Um aviso vou lhe dar
Reze muito, muito mesmo,
Prá meu camim num cruzar
Esqueça esse delegado
Porque senão obrigado
Eu serei de te matar.
TRI: Saiba senhor delegado
Que esse gosto não terá
Noticias de minha pessoa
Com certeza não vou dar
Eu vou para o Sul, tenente
Deixá essas terra quente
Vou morar noutro lugar.
TEN: Espero que o senhor cumpra
O que acabou de falar.
Vou levar esses defuntos
Mode mandar sepultar
Mas na praça da matriz
Os corpos dos infiliz
Nós queremos amostrar.
Tripa trata de tratar
De Bilovino a ferida
O ferido lhe agradece
Por ter lhe salvado a vida
João lhe responde sorrindo
“Só tô lhe retribuindo
A minha que lhe é devida.”
Na hora da despedida
Sai um para cada lado
Bilovino pro cangaço
Tripa, como combinado
Vai para o Sul do país
Onde viverá feliz
Com medo de ser caçado.
Recorda o sonho passado
E lembra da assombração
Que prometeu protegê-lo
Nas horas de confusão
Tendo a promessa cumprido.
Saltitante e divertido
Sai cantando esta canção.
“Eu nasci num pé de serra
Que nem perto passa um bonde
Só tem caverna esquisito
Aonde as feras se escondem
Que dando um grito de um lado
A outra serra responde.”
Edileuza Franco Vega
Funcionária Pública
Hospital Universitário
Campina Grande - Paraiba
Edileuza Franco Vega
Funcionária Pública
Hospital Universitário
Campina Grande - Paraiba
De um galego descendente de Holandesa com
Português e uma bisneta de Índia Panati, nas-
ceu José Medeiros de Lacerda, mais um des-
cendente das sete irmãs da Cacimba da Velha.
Aos 8 anos, já escrevia estórias do seu imagi-
nário, como O Aventureiro, descrevendo a saga
de um garoto criado entre as matas da Várzea
Comprida na Fazenda Passagem do Meio, de
seus avós maternos. Com 12 anos, extremamen-
te amante dos estudos, viu seu sonho desmoro-
nar-se. Só homem já feito conseguiu voltar às
salas de aula, de onde nunca mais saiu. Primeiro
como aluno, depois professor. O sangue de Tro-
peiro da Borborema herdado do pai, o fez percor-
rer o Brasil, de Roraima ao Paraná, carregando
seus sonhos, compondo seus poemas, idealizan-
do seus cordéis. No teatro foi ator, dançarino, co-
reógrafo, autor, na poesia um aprendiz, do Cordel
é professor. Em Santa Luzia, constituiu família, em
Patos concluiu seu curso de Letras na atual FIP.
Hoje se realiza vendo seus cordéis lidos, em todos
os Estados do Norte e Nordeste brasileiro. E mais
feliz fica, vendo várias escolas pelo Brasil a fora
vivenciando sua poesia em sala de aula. Seus cordéis
têm cunho educativo, informativo, histórico, nunca
usados como desabafos íntimos, válvulas de escape
diante das pressões existenciais. Hoje com mais de
180 folhetos escritos, faz da poesia sua terapia ocu-
pacional. Seus netos, e sua primeira bisnetinha lhes
proporcionam tudo que ainda lhe resta para se emo-
cionar, procurando dar-lhes o que ele não teve direito
em sua infância... Seus pais, de saudosa memória,
foram apenas o começo de sua história!!!...