DOTOR PROMESSA
(Escrita na Campanha política de 1984)
Até hoje ainda lembro
Dos discursos do “Dotor João”:
“Se eu for eleito em Novembro
Prometo, de coração,
Vou ajudar minha gente,
Vou miorá os sertão!
Pruque sou um sertanejo
Das terra do Piancó,
(Vale que eu tanto admiro)
E dispois que eu for eleito,
Ninguém mais vai passar fome,
Poliça num da mais tiro.
Vou fazer tapete verde
Nos sertões de minha terra,
O mato vai florescer,
Vou perenizar os rios,
Fazer pontes, rodovias
E escolas prá se aprender.
Por isso peço ao meu povo,
Redobrem seus argumentos,
Trabalhem prá me eleger,
Que dispois que eu for eleito
Tudo vai ser diferente,
Pois comigo é pra valer!”
E a campanha começou:
Os cabos eleitorais
Lutavam com mais vigor.
Era festa, era folia,
Comício prá todo lado,
Cartórios e comitês
Viviam superlotados
E já não mais se pagava
Casamento ou batisado.
João Grilo era um matuto
Da Veneza do Sertão,
Muitas noites, madrugadas,
Com tinta e pincel na mão
Foi um grande voluntário
Prá eleger Dotor João.
De febre, gripe, frieira
O João Grilo padeceu,
Foi hérnia, foi reumatismo
Que o sereno lhe deu,
Mas tudo foi compensado,
Pois seu Dotor João venceu!
E depois da eleição
O “progresso” começou:
Pouco a pouco em nosso Estado
Tudo se modificou.
Primeiro o funcionalismo
Recebeu a recompensa,
Pois o salário atrasou.
E o pobre sertanejo
Só passou fome uma vez:
Nunca mais se alimentou.
E outra grande promessa
Que o Dotor João cumpriu:
Polícia não atirou mais.
Pois, por motivo de ética,
Quem passou a matar gente
Foram os intelectuais.
“Vou fazer tapete verde”
Dotor João sempre dizia
E aqui eu lembro de novo.
Mas a chuva não chegou
E em vez de tapete verde
Quem está verde é o povo.
João Grilo, depois de tudo,
Teve como recompensa
Prá sua decepção
Nem emprego nem guarida
Mas três balas na barriga,
De um cabra de Dotor João.
Prá reforçar o sistema
E terminar o poema
Um lembrete ao meu sertão:
É que esse ano outra vez,
Lá pelo décimo mês
É tempo de eleição.
Se quer viver de promessas
Vote lá no Dotor João!