UM LINDO CASO DE AMOR

Muitas vezes as emoções
surgem assim, repentinas,
totalmente inesperadas
e nos arrastam da rotina
revelando que na vida
cada qual tem sua sina

Sou desses observadores
que vêm na curiosidade
dos feitos do ser humano
uma rica novidade
que pode servir de mote
com muita intensidade

Eu falo dessa maneira 
porque pretendo relatar
um desses casos de paixão
que não é nada de espantar
mas se eu me interessei
penso que vocês vão gostar

Estava eu numa praça
sob uma árvore frondosa
olhando o vai-e-vém do povo
segurando uma rosa
apenas me distraindo
procurando uma glosa

Aí foi, então, que avistei
um casal de namorados
apenas adolescentes
lado a lado, encabulados,
conversando displicentes
um com o outro fascinado

Ela era muito linda
tinha o cabelo dourado,
de modelo o belo corpo,
carnudo lábio pintado
e um olhar com tal doçura
que me deixou encantado

Usava farda escolar
e caminhava lentamente,
braços cruzados no peito
com os livros, indolente,
se mostrava muito séria
mas parecia contente

Seu provável namorado
ia feliz caminhando
as mãos no bolso, sem jeito,
talvez até assobiando
aos meus olhos parecendo
galo de briga ciscando

E lá se iam aqueles dois
no seu namoro inocente
como cândidos pombinhos
passando na minha frente
quando algo aconteceu
nada mais que de repente

Já ia deixá-los em paz
com meu olhar penetrante
e dar atenção para a rosa
quando bem lá adiante,
eu cedo pude perceber,
deu-se um fato interessante

Os dois ficaram de frente
um para o outro, se olhando,
ela se mostrando irada
mas ele balbuciando
algo muito delicado
que não estava agradando

A cena, nada romântica,
que lá se desenrrolava
é claro, me chamou a atenção,
por essa eu não esperava:
um súbito desencontro
que o amor atrapalhava

Rápido, esqueci a rosa,
a eles fiquei bem atento
e pelo olhar da garota
pude saber seu intento
eu acho que ela falava:
algo como: "seu nojento!"

Ah! se eu pudesse ouvir
as frases pronunciadas,
se conseguisse entender
suas vozes alteradas,
seria bom presenciar
as emoções desencontradas

É claro que nada escutei
só via lábios se movendo,
ele de cabeça baixa,
ela os quadris mexendo,
aí então, súbitamente,
ela se foi quase correndo

Ficou lá o jovem, parado,
só Deus sabe o que sentia
ele deveras nadava
numa grande agonia
perdido em pensamentos
não sabia o que queria

Mas em pouco, cabisbaixo,
ele deu meia volta e saiu
andando devagarinho
como se entrasse num funil
com certeza querendo voltar
contudo logo desistiu

Cada um seguiu seu rumo,
então caso encerrado
pelo menos assim pensei
deixando os dois de lado,
Mas um minutinho depois
eu fiquei embasbacado

Quando desviei meu olhar
dos garotos apaixonados
voltei-me todo p'ra rosa
olhos quase marejados
do amor tendo bebido
e ficado embriagado

Só que aquele romance
declinou de seu desejo,
tornou-se poeira fina
sem ter havido um beijo
desaparecendo tão cedo
no auge do seu ensejo

Mas eu estava enganado
nem tudo que reluz é ouro,
às vezes uma palavra
nos faz perder um tesouro
e por causa de uma frase
podemos cair no choro

Estranha coincidência
ou por razões do destino
puseram meus olhos no casal
que findou em desatino,
então fui surpreendido
com lindos sons de violino

Não tinha música nenhuma,
é tudo só minha invenção,
mas senti vibrar meu corpo
com o derreter do coração,
aconteceu novamente
eu me encher de emoção

Meu coração palpitava
com a cena em andamento
eu me emocionava
com dos dois o movimento:
feito bonecos pararam,
chamava-os o sentimento

Sabemos que marionetes
são por homens controladas
e obedecem a seu manejo,
mexem ou ficam paradas
assim pareciam os dois
tal figuras comandadas

A um só tempo viraram
na procura do seu amor,
estavam desesperados
sob o forte apelo da dor
assim, em câmara lenta,
correram com todo ardor

Um na direção do outro,
os braços entreabertos,
dos olhos descendo lágrimas,
o bálsamo ali, tão perto,
à guisa de casal perdido
nas entranhas do deserto

No limiar do reencontro
fizeram súbita parada
se olharam tão profundo
que o mundo virou um nada
a seguir se abraçaram
numa paz acalentada

Ficaram um tempo assim
esquecidos do instante,
pois o mundo para eles
era algo bem distante
estavam de novo juntos,
só isso era importante

Eu fiquei tão comovido
às lágrimas quase indo,
que tive forte impressão
de música estar ouvindo,
talvez o bolero de Ravel
seus lindos toques fluindo

Deixei a rosa cair ao chão
sem nem mesmo perceber,
curvei-me para pegá-la
não querendo ficar sem ver
o belíssimo final feliz
mas um susto me fez perder

Uma linda borboleta
voando toda safada
bateu asas no meu rosto
e me atrapalhou, a danada,
daí logo a cena do beijo
foi totalmente negada

Quando os vi novamente
de mãos dadas já se iam
os jovens enamorados
realmente se queriam,
a linda cena há tanto tempo
estes meus olhos não viam.
Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 24/06/2008
Reeditado em 18/06/2021
Código do texto: T1049377
Classificação de conteúdo: seguro
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