Doença de Zilu

I

A estória começa no natal

Onde Zilu adoentada

É levada pro hospital

Ela se contorce, grita e esgoela.

-“Poderia ser febre amarela doutor,

Sinto falta de ar e sinto muita dor”.

II

O doutor encorujado sai ao seu encontro

Está acostumado a zuada do plantão

Trisca vexado sua barriga dura

Ela diz que só comeu farofa e rapadura

Com o coração acelerado respira fundo

Tem medo de ser menos uma nesse mundo

III

É uma doença tão danada que nem rezadeira

Nem padre pode com ela, sou uma infelizarda.

Deve ser ameba, tomo água de cisterna.

Dotô me salve a vida que ta por um triz!

Gemia, gemia em agonia e assuava o nariz.

Eita doença danada difícil de diagnosticá

IV

Com os zói embaraçado, zaroia de tanta dor.

Rezou até pra Divina Providença

Pra lhe afastar essa mardita doença

Apelou pra macumba mesmo sem crença

Talvez seja encosto ou uma presença espirituá

Vou à Umbanda, Candomblé e Sarava.

V

Veja só que azar dotô

Dia desses fui motivo de gaitada

Arredei o pé de casa na hora errada

Atropelada por uma bicicleta véia

Pobre é assim mesmo vive ferrado

Agora tô de bengala pra todo lado

VI

Num repente calundu pediu padre e tabelião

Pra lhe dar a benção e a extrema unção

Daqui só saio taiada ou amarrada

Já fiz testamento ao meu contentamento

Deixo tudo pra Jurema pandeiro e dinheiro

A tapera ajeitada com a rede azul lavada

VII

O dotô levantou e de marimbenta ele a chamou

Não agüentando mais azucrinação e o problema falou:

Zilu é atarantada e flatulenta tome um certo Luftá

É só barriga inchada tu não ta empesteada

E pro atarantamento, gritos e calundus

Procure um dotô das cabeças que é de graça pelo S.U. S.

VIII

E lá se foi a bixinha desgostosa e arredia

Cambetiando e resmungando daquele maldito dia

Algum dia hão de me ouvir e dar razão

Quando me vê durinha, esticada, moribunda no chão

Será possível que não podia nem desfalecer em paz ?

Na minha lápide quero bem grande

NORDESTINA ARRETADA AQUI JAIZ.

IX

E aconteceu que passando por ela uma galinha magrela

Zilu olhou a galinha e a galinha olhou pra ela

Hipnotizada ela fez um flesh back de sua vida inteira

O tempo de criança e de mocinha arengueira

O início , meio e fim daquela vida pasmaceira

Seus olhos brilhavam e a galinha chocadeira saía reboladeira

X

Decidiu então que precisava de religião

Entrou numa portinha aberta cheia de motivação

Olhar atento ,sorriso estampado era alegria pra todo lado

Um obreiro levou Zilu a frente também sorridente

Com os dentes de fora numa alegria de dar dó

Zilu foi-se indo no meio daquele forrobodó

XI

Ela cruzou as mãos não entedia a barulhada

Será que alguém contou alguma piada ?

E um homem alto veio ao seu encontro e estendeu a mão

Sai desse corpo que não te pertence cramulhão!

Num susto ela pulou dois metros do chão

Saiu correndo e gritando no meio da multidão.

XII

O susto foi tão grande que Zilu atarantada

Corria, corria que nem uma danada

Com medo da assombração.

Cruz Credo! nunca nem vi esse tal de cramulhão?

Ô bicho tinhoso danado

Que meu cabelo ficou espetado de tanta arrepiação.

XIII

A carreira era tão grande chega os pés batia na bunda.

Zilu com os braços abertos, gritava que nem uma cabrita

Valei-me meu Pai! Minha poderosa Santa Rita!

Já tô curada, não tenho doença não

Era coisa do meu quengo, somente invenção

Não se apodere de mim maldito cramulhão.

XIV

Essa é a estória da enfermidade de Zilu.

Que sumiu no meio do mundo

Que nem promessa pra São Raimundo

Descobre seu paradeiro

Dizem que virou assombração

Zanzando por ai com seu pandeiro na mão.

Luciana Bruder
Enviado por Luciana Bruder em 27/05/2008
Reeditado em 13/05/2012
Código do texto: T1008282
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