Desvairado

O sangue na lâmina nem secou ainda e o corte da serpente morta abre caminho pra outras duas cabeças.

Apago a guimba do charuto na ferida aberta. O ato é acompanhado um guincho agudo e cortante. A besta está ferida, mas ainda vive.

Um ser chafurda no chorume enquanto tenta postar um texto espirituoso numa rede social. É afogado pelo lixo, mas o smartphone está a salvo. O saguão do hotel finge que não vê. Assisto do balcão do bar. Trágico.

Oswald de Andrade aparece com uma garrafa de cachaça, diz que é hype em Bruxelas e que arrancou vários francos belgas de gringos emocionados com a iguaria que conseguiu contrabandear. Serve duas doses.

Peço um pedaço de papel e uma caneta, o garçom, um elefante bípede mais tosco que a versão do Monty Python, entrega trôpego na mesa derrubando minha taça sobre a toalha da mesa. Seguro um palavrão na garganta e massageio a têmpora esquerda. O elefante treme, sai correndo e volta com uma garrafa sem rótulo.

"Absinto com THC, espero que seja do seu gosto..." Serve um copo generoso e some.

Só o odor é inebriante.

Oswald deve ter usado alguma substância, não cala a boca. Bom que só preciso falar "um hum" de vez em quando e não preciso formular respostas mais elaboradas.

Um suboficial irrompe pela porta do bar. Carrega uma AK-74 a tiracolo. Marcha até onde estamos, saca uma Marakov 9mm e coloca no balcão na minha frente.

"Seja sua própria sentinela."

Rodrigo Margini
Enviado por Rodrigo Margini em 28/02/2025
Código do texto: T8274605
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