O abraço das horas
Numa tarde, meu pai sentou- se na varanda e pediu- me que comunicasse aos demais da casa que o tempo ia, naquele dia, roubar-lhe.
Achei a possibilidade desse acontecimento um grande devaneio. Sendo assim, saí vagarosamente olhando para ele e cuidei que, ao invés de cumprir o que havia me pedido, eu devia ocultar-me atrás da porta.
Meus irmãos foram então passando, sem que separassem, havia em minhas mãos um retrato que eu ia minuciosamente comparando, escondido atrás da porta, com a fisionomia atual do nosso pai.
O velho carregava naquela hora uma vasta cabeleira grisalha, descendo sobre a camisa azulada de tergal, que lhe acrescentava a mesma jovialidade.
Logo, dei como certo o quanto estava enganado, e saí...
Quando retornei, meus irmãos estavam sobressalta-
dos, caminhando ao redor da casa. Outro revirava as gavetas da cômoda, e minha mãe chorava num canto do quarto.
Corri então até a varanda e fui percebendo que a cadeira estava vazia, e um pequeno corpo se desdobrava tristemente para dentro de um relógio.