Chuva Rubra

Nos dias maculados, o teto sangrou comigo. Através da janela, garoa milhões e ele não aguentava a tempestade, nem eu, pois ocorria uma outra por dentro, saindo ponto sem parar. E as pingueiras começaram logo cedo, devido a fortaleza das gotas, quarto forjado, teto isopor e gesso, a lâmpada queimou, os fios montados com tanto descuido na reforma que não reparou os vazios no telhado. No meu desespero, só mais uma abertura, e mais uma, e mais uma, e mais uma até perder a conta do sangue. Olhei para o chão, um vermelho aguado saído do teto que se move com um sopro de vento e em cima, uma cor estranha caía do branco sustentáculo e não parava, e a melodia desafinada das cordas que tudo segurava, dava ao meu conforto, sons de misofonia, uma trilha sonora do relento para assustar momentos no meu coração. Lembrei da morte do meu cachorro, nos meus braços ele chorava e eu desesperada lhe dava soro e água de côco pela seringa, até ele parar. Um sangue saiu debaixo de seu rabo e minha lua derramou junto, fiquei ao chão, abraçada em seu corpo enrigecendo, ambos sangrados e mortos. Não sei de onde veio esse sacrifício do baluarte, se foi a chuva que trouxe, se há algo vermelho dentro do espaço vazio, só sei que ele ficou marcado com machas levemente água de morango, eu também fiquei marcada com algo menos bonito que isso. Todos os dias olho para mancha e lembro de nossas fissuras.