UMA CHANCE PARA VIVER

Adalgiza abriu os olhos lentamente, não tinha vontade nenhuma de levantar da cama, até imaginou ainda estar dormindo e sonhando, mas depois caiu em si, estava realmente desperta. Virou-se para o lado da parede, ajeitou o cobertor e tentou dormir, mas não conseguiu, as lembranças do dia anterior lhe vieram a mente e isso a fez entender o que acontecera. E o sofrimento reiniciou, estava tão bem enquanto dormia, por que tivera que acordar? Seria um pesadelo o que vivia agora? Não, sua mente confirmou que não, era tudo real, o dia anterior lhe fôra muito triste, insuportável, melhor seria se tivesse morrido também.

Armando chegou em casa um pouco abatido, o que causou espanto a sua esposa, Adalgiza jamais o vira assim, já que ele era alegre, o tipo do homem que sempre concordava com quase tudo no tocante aos problemas e decisões da dona da casa. Disse ele que havia se sentido mal no trabalho e resolvera sair mais cedo. Tomou um banho e quando se preparava para jantar caiu antes de sentar a mesa. Desesperada, Adalgiza solicitou socorro aos vizinhos e foi prontamente atendida. Armando foi internado às pressas e o diagnóstico foi infarto, o que culminou com a sua morte. No dia seguinte o sepultamento foi providenciado e no final da tarde ela já estava de volta ao seu lar profundamente abatida. Casados há cerca de vinte anos nunca tiveram filhos, agora era uma mulher sozinha, já que os poucos parentes que tinha moravam longe e poucos compareceram ao funeral, justamente os que se davam bem com ela.

Sem familiares sinceros, sem amigos, Adalgiza não estava encontrando motivos para continuar vivendo, acostumara-se com o marido que amava tanto e agora está sozinha no mundo, sem ter a pessoa que lhe dava amor e carinho. Essa era a única pessoa com quem conseguia conviver, procura forças para levantar, mas não encontra e ali permanece durante todo o dia tentando esquecer o que aconteceu entre um cochilo e outro. Vê a noite chegar, não comeu nada, não sente fome, a única coisa que sente é vontade de tirar a própria vida e esse desejo vai aumentando, aumentando, até que ela se levanta, para isso encontrou forças. Fica alguns minutos sentada na cama, pensativa. Resolve ir até a cozinha, pega uma faca e fecha os olhos, nesse momento ouve passos, estranha porque ali está sozinha e as portas trancadas. Larga o objeto cortante e vai até a sala. Ninguém. A noite já avança e ela, curiosa, olha ao redor e em outras áreas. Silêncio. Volta para o quarto, momentaneamente esquece o ato impensado de ceifar a própria vida. Senta na cama, mas lembra da faca e volta para a cozinha, a arma está sobre a mesa. Esboça um sorriso macabro e a pega novamente. Como se mataria? - pensou. Cravar no próprio peito? Nesse exato momento a campainha toca, são aqueles dois toques que ela bem conhecia quando o marido chegava. Sorriu. Dessa vez foi um sorriso igual aos que sempre costumava esboçar quando Armando chegava do trabalho. Como uma autômata correu para abrir a porta, para ela era ele que chegava querendo tomar um banho e jantar. Mas lembrou-se que não tinha preparado nada. "Meu Deus!" - falou em voz alta - "Que faço agora? Ele vai se chatear". Assim mesmo abriu a porta e ali na sua frente viu o marido. Ficou parada esperando ele abraçá-la, mas isso não aconteceu. Pensou que ele já imaginava que sua esposa não tinha feito o jantar.

- Desculpe, querido! Não sei o que houve comigo, mas isso não vai mais acontecer, eu lhe prometo.

Cerrou os olhos com as mãos durante alguns segundos e quando deixou o rosto livre... ninguém ali. Decepcionou-se. Olhou em torno achando que ele havia se escondido e chorou copiosamente. As lembranças afloraram com força total, nem fechou a porta, correu para o quarto e jogou-se na cama em desalinho. Ali mesmo dormiu mais uma noite, o cansaço se abateu sobre seu corpo e no dia seguinte despertou. Alguém estava ali de pé velando por ela, alguém que vira a porta aberta e estranhou tomando a liberdade de invadir os aposentos para saber o que houve. Foi um dos vizinhos que gentilmente a consolou e procurou algum tipo de ajuda para ela. Tendo escutado depois tudo que ela lhe contou o vizinho lhe deu muitos conselhos e ela voltou ao seu raciocínio normal. A vida era mais importante, concluiu Adalgiza.

Moacir Rodrigues
Enviado por Moacir Rodrigues em 05/08/2024
Reeditado em 05/08/2024
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