O Rugir do Leão
Capítulo Onze
O Rugir do Leão
“Satisfeito na esperança, sofrido na tribulação;
sê constante na oração”
DE ONDE VEM A VOSSA FORÇA? A minha força vem do alto! A Luz Infinita. Que desce das alturas inalcançáveis como uma flecha flamejante e se propaga para a profundeza insondável do meu ser, iluminada como um raio que desce aos abismos da alma e depois retorna como uma serpente e sobe novamente das profundezas para as alturas dentre os túneis escuros da matéria que me cerca e constitui o meu corpo, até os caminhos iluminados pela Luz Infinita. A luz da estrela que brilha resplandecente acima de mim e inflama o meu coração, o Espírito Divino que preenche o meu vazio, o amor incondicional que me salva, a luz da sabedoria que dissipa a ignorância da minha escuridão.
Além do átrio, além dos três véus do tabernáculo, no altar de Deus está o Verbo encerrado na arca de ouro. A força motriz do Universo. O pensamento, a palavra e a ação. “Eu Serei” me enviou.
O Mestre do Templo é o único permitido a adentrar os recintos internos da Alma até a recâmara do Santo do Santos onde está o Espírito da Alma Universal, para neste sagrado lugar comungar com o Divino que vive no centro de tudo e contorna a borda do nada. Guardado com temor e invocado com tremor! O trovão desce do céu enquanto o psiconauta sobe o monte para contemplar a terra prometida. Mas para se tornar o Mestre do Templo, o psiconauta deve desenvolver o seu conhecimento e o domínio de sua consciência sobre a sua inconsciência. Só assim, ele irá adentrar o seu reino interior e secreto, para, enfim, domá-lo como é seu direito estelar de ser senhor de si-mesmo.
Entrar na Terra Prometida é o sonho da minha vida. Porém, nenhuma garantia eu tenho do meu merecimento. Pois ainda tenho coisas a aprender, ainda tenho uma revolução interior para incitar em mim, ainda tenho muitas coisas para fazer. Há tanto para ser vivido ainda. Contudo, tenho a fé que me mantém de pé. Mesmo que esta fé seja compreendida como a fuga dos desesperados e que buscam por consolo. Ainda assim, eu tenho a força para lutar. Tenho um propósito para alcançar. O dever é o meu Leste, pois é por este caminho que o grande príncipe da luz renascerá.
A vontade é o movimento em direção ao propósito mais elevado do meu espírito do Ser, o impulso divino que é criador. Buscava a mim e encontrei mais do que pretendia encontrar nesta jornada, pois ela me levou até a Casa de Deus. Que está nos Céus, deste novo Éon de coisas incognicíveis que ora são desveladas a minhas visões, ora as escaro como a loucura do meu Ser que se dilui cada vem mais na percepção do Todo, como também habita em seu altar em meu coração. Eu posso senti-lo neste momento, seu Logos que ilumina a minha cabeça e o seu Sopro que aquece o meu coração.
Sophia bocejou...
— Deu sono? — Perguntei, decepcionado com a expressão de tédio que Sophia expressava ao ouvir falar.
— Um pouco. Parece um livro bíblico muito chato.
— Eu sinto que realmente senti essa energia, mas foi apenas por 24 horas, depois me senti como um saco de lixo novamente — disse a Sophia.
Sophia deu uma gargalhada.
— O êxtase é assim mesmo, criança. Volátil. Você está se ajustando. O que é bom! Não pense que vai ser numa noite de bom ânimo que você vai dormir e acordar no dia seguinte com todos os seus sonhos realizados. Com todas as suas questões pessoais resolvidas. O autoconhecimento é uma trilha que precisamos caminhar um passo de cada vez — disse ela, solenemente.
Eu parei para refletir no que ela me dissera. De fato, eu havia me sentido poderoso como nunca antes. Pois para mim, parecia que Deus havia parado os seus afazeres para prestar atenção em mim e na minha jornada. No dia seguinte, eu havia sido esquecido por Ele outra vez. O ânimo se esvaiu de mim sem que eu nada pudesse fazer para retê-lo comigo.
— Ainda é cedo...
— Sim, ainda é cedo! Mas veja pelo lado bom, você está na metade do caminho. E também está consciente que o único adversário que tem está aí dentro de você. O ego sempre está em uma disputa contra o si-mesmo. A sua vontade consciente se opondo aos desejos inconscientes, em uma batalha astral — explicou-me Sophia, com muita paciência e sabedoria.
— Por que estou em guerra contra mim?
— Talvez porque seja feito de matéria e espírito — disse Sophia.
— Luz e Treva, como você me disse no primeiro encontro.
— Justamente.
Sophia se levantou de sua poltrona e caminhou até a sua estante de livros. Enquanto ela caminhava, eu notei que usava um sapato prateado muito brilhante. Ela nunca tinha usado nada parecido antes. Nada tão extravagante. Mas se tratando dela, sempre havia um significado por detrás de um símbolo.
— Conhece o Mágico de Oz? — Perguntou ela, depois de colher um livro antigo da estante, olhando-me com olhos misteriosos e um sorriso dissimulado.
Eu conhecia a jornada de Dorothy que fora levada pelo furacão até a distante Terra de Oz, onde ela encontrara o espantalho que queria ter um cérebro para que ninguém o chamasse de burro, o lenhador de lata que precisava de um coração porque queria sentir o amor e o leão covarde que queria coragem para se tornar o rei dos animais. Era um clássico dos contos de fadas.
— Se eu sou o leão covarde que precisa de coragem, você seria a bruxa má ou a bruxa boa? — Perguntei.
— A resposta para a sua pergunta certamente está no fim da estrada de tijolos amarelos. — Respondeu Sophia.
Sophia terminou nossa sessão ali. E eu acabara de despertar do meu próprio furacão e caminhava pela minha própria estrada de tijolos amarelos. Acreditava ter um cérebro, porque podia pensar e raciocinar, acreditava ter um coração, porque podia sentir alegria e tristeza e também acreditava ter coragem, porque enfrentei os meus medos até encontrar um novo caminho. Mas o que de fato me faltava? O que seria então que eu encontraria em minha jornada? Qual seria o meu propósito ao chegar na Cidade das Esmeraldas? O que eu pediria ao Terrível Mágico de Oz? E qual seria a tarefa que eu precisaria cumprir para merecer a realização do meu desejo?
Sophia havia tornado tudo ainda mais misterioso do que já estava. Novas questões foram incluídas na minha jornada que já tinha muitas a serem resolvidas. Porém, eu sabia o que deveria continuar a fazer: seguir sempre em frente. Ao sair de sua casa, eu tive um insight, o vislumbre de um leão que tinha sobre a cabeça uma coroa de ouro e rugia com fúria para o sol. Então, eis que o leão se transmutou em uma donzela com um vestido de imaculado branco com muitas rosas e margaridas em seu avental, sua cabeça estava coroada por uma coroa de louros e seu semblante era sereno como um amanhecer de domingo, a donzela era o leão domado, o leão era a donzela que o domava.
Eu deveria refletir como o fizera a cada passo anterior. E deixar que a vida demonstrasse de modo natural o verdadeiro sentido das perguntas que permaneciam em aberto dentro dos meus espaços interiores. A donzela representava a força conduzida com destreza e serenidade que se torna a representação mais elevada da força feroz e possante do leão que nunca se deixa ser amedrontado.
O leão em si mesmo é força primária, a coragem para ser reativo aos obstáculos que eventualmente surgirem durante a jornada do psiconauta. A minha jornada. A donzela era a força secundária de resignação ante os sofrimentos. O homem que almeja ser sábio deve compreender que a sua força nem sempre se manifestará em sua plenitude, na forma do leão que ruge, tendo em vista as oscilações dos humores humanos e o próprio fluxo e refluxo das energias que nos compõe e que se alternam na medida em que conhecemos a mais diversas experiências da vida, a nossa força também se manifesta na forma da donzela paciente e que doma o Grande Leão.
A nossa força é mais do que pensamos que ela seja, é mais do que o ímpeto de coragem que explode dentro de nós quando descobrimos nossa luz interior. Porque a nossa força também se manifesta em nossos momentos de fraqueza, na forma da donzela que doma a situação de tribulação com sua serenidade, destreza e, sobretudo, a sua iluminação, isto é, quando mais precisamos dela para permanecer lutando pelo o que acreditamos ser bom e justo. São nesses difíceis momentos da vida em que suplicamos que nos seja concedida uma parcela da força de Deus para que possamos suportar a tribulação e seguir o nosso caminho.
A fé do psiconauta é a fonte de sua força.
Deste modo, eu oro! Mas não oro para que eu esteja isento do sofrimento que existe no mundo, oro para que tenha em mim as forças necessárias para superá-lo a cada duro passo da minha jornada interior. Para os mais elevados picos de luz do meu Ser. Onde a Luz das Luzes ilumina absoluta e soberana sobre a Escuridão das coisas.
________ Este texto é fragmento de um livro.