MAS QUE CACHORRO
Fui aceito na turma do Bar do Osvaldo, nos anos de 1960.
Para ser mais preciso em outubro de 1964 quando eu já recebia salário de Continuo Externo Contratado banco da Provincia e já tinha dinheiro para a minha cerveja gelada e o picadinho de queijo e salame feito pelo Nêgo Rosa.
Entre as coisas que me surpreenderam nas atividades da turma era a frase usada para elogiar qualquer moça ou uma mulher bonita que passasse usando uma Mini - Saia e uma blusa decotada que estavam começando a virar moda, naquela época.
Não diziam: mas que bonita, que gata, que linda, que flor, ou outro adjetivo elogioso, mas diziam:
Tchê mas que Cachorro!
A expressão era utilizada quase que diariamente, por algum dos participantes mais largados da turma e significava para dizer, de maneira figurativa, que baita mulher!
Convivi de 1964 até 1970, com a turma e durante este tempo ouvi milhares de vezes esta frase, todavia sem que ninguém pudesse ou quisesse, dizer-me a origem dela.
Até que um dia destes, aqui em Capão da Canoa, quase 60 anos depois, encontrei um dos mais antigos participantes da turma e após as saudações e o cumprimentos fronteiristas e sabermos, mutuamente, como estávamos de saúde, me veio na cabeça a ideia de perguntar se ele sabia como tinha nascido a expressão:
Mas que cachorro!
Olhando nos olhos me disse: Tunico, tu já estás bem maduro e posso confiar em ti, vou te contar desde que tu prometas não declinar o meu nome pois quando isto aconteceu juramos que ninguém ia contar, nunca, a origem deste fato e tu sabemos que não podemos trair a memória da turma do Bar do Osvaldo mesmo que, fisicamente, ela não exista mais.
Então vou confiar em ti. !
- Mas com certeza, disse-lhe eu! E ele passou a falar.
- Foi assim: Era uma tarde verão daqueles verões quentes que fazem em Rosario e mais, ou menos pela 17:30 da tarde começaram a chegar os primeiros comparsas que iriam tomar o aperitivo da tarde e a cerveja da noite.
- Estávamos ali falando de futebol, até que apontou na esquina do armazém do seu Heitor Cunha, lá no outro lado da rua uma mulher com uma minissaia vermelha e uma mini blusa que lhe cobria o seios o deixava a a cintura e as costas totalmente a mostra.
Na mão trazia uma corrente na ponta da qual , emum coleira, estava um cachorro ,de diminuto tamanho. Um fox preto.
Passada a esquina do armazém do seu Heitor ela dirigiu-se para o outro lado da rua o que a levaria a cruzar, obrigatoriamente, por nossa turma e com certeza ser motivo de elogios e piadinhas.
Quando estava bem perto de nós a agitação tomou conta da turma e todos espichavam a cabeça, para poder ver melhor o espetáculo.
Quando ela chegou mais perto, ouvimos o Delíbio Fontoura Lopez dizer: Calma pessoal, cuidado.
Esta é namorada do capitão Pitaluga e isso pode dar problema.
De repente encosta uma patrulha do exército aqui e prende todo o mundo.
A oficialidade do 2º RC Moto, era autoridade na cidade, pois recém tinha começado revolução de trinta e um de março de 1964.
A moça passando na nossa frente e, todos nós, na esperança de podermos ver por mais tempo, a sua beleza, nos quedávamos no mais profundo silencio...Por precaução e para atender ao que o Delibio tinha dito.
Até que de repente, Roberto Fonseca não se conteve e largou:
“Tchê mas que cachorro, hein?”
Todos aumentaram o ritual silencioso e quando a moça estava mais ou menos ali pelo colégio do Seu Bandeira irromperam em um gargalhada e correram para abraçar o Roberto Fonseca por entenderem que, ele na verdade, ao elogiar o cachorro tinha elogiado a moça, com todo o respeito e sem correr risco algum...
Aí está a origem da frase que virou moda, naquele tempo, e acho que até hoje- lá em Rosario- se diz quando passa uma moça bonita, linda e sensual, mesmo que não esteja acompanhada por um Cusco fox, que não merece elogio algum...
Reafirmei o silencio sobre o nome do amigo que me decifrou o mistério do ditado costumeiro, daquele tempo, em minha terra;
Nos despedimos e eu fiquei muito feliz por ter decifrado o enigma que me acompanhara, por muitos anos...