OS OLHOS AZUIS MAIS BONITOS... ATÉ PARECE O CÉU!
Mané, Caboclo preto nagô, neto de quilombolas do Cinzento da Bahia. Homem íntegro, muito trabalhador e temente a Deus. Ele era casado com Isadora uma angolana, muito bonita, dos olhos de mel, cheia das faceirices das meninas africanas. Ela vivia sempre na igreja da matriz, ajudando no que fosse preciso. Muito devota de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, só não virou freira mesmo porque conheceu o Mané numa dessas festas da Padroeira, atrás da igreja. E deu no que deu.
Qualquer um diria que era um casal feliz, até o dia em que nasceu o filho deles.
Quando Mané soube que a mulher tinha parido, tava no roçado trinchando a terra para o plantio. Vieram avisar que ela tava com “dor de menino”, como é o jeito de dizer para as bandas do sertão. Ela tava quase já parindo. Ele soltou as coisas e desatou a correr pra chegar a tempo de ver o filho nascer, pois era bom o marido estar presente nessas horas de dor da esposa.
Chegando a casa, viu um monte de gente estancada na entrada. Quando viram Mané chegar esbaforido, seguraram ele antes de entrar. Mas não deixaram o homem entrar de jeito nenhum! Ele esperneou, quis brigar, mas os amigos o levaram pra detrás da casa. E o pobre ainda sem entender nada. A todo custo queria ver o filho que acabara de nascer e precisava estar com a mulher naquela hora.
- Antes de qualquer coisa, Mané, fique tranquilo e não faça nenhuma besteira pra depois se arrepender!
- O que foi que houve pessoal? O menino nasceu morto? A minha Isadora morreu no parto? – perguntou ele tentando entrar na casa.
- Nada disso, homem! Deus nos livre! Bota essa boca pra lá! – falou um dos amigos mais chegados dele. – Vá conhecer o seu filho, mas só não faça bobagem!
Mané, aflito, entrou porta adentro, doido pra ver o recém-nascido, o primeiro de uma penca de filhos, conforme tinha prometido pra Isadora. Quando chegou ao quarto, percebeu que a mulher estava com o bebê todo enrolado, como se fosse um casulo de borboleta. A parteira fez menção de empurrá-lo pra fora do quarto. Ele que já estava meio desconfiando de que alguma coisa estava errada, tomou a criança que desatava no choro das mãos da mulher.
Muito nervoso, o homem jogou o pacote em cima da cama e o desembrulhou, puxando o cobertor pelas pontas, fazendo a criança rolar por sobre o colchão. Mané deu um pulo pra trás, caindo em cima de um tamborete, ainda segurando o cobertor. Aprumou a vista e abriu a janela do quarto, deixando entrar a claridade da manhã. Em cima da cama, o bebê soltou um chorinho e se aquietou. Ele se aproximou, pegou a pequena criaturinha com uma das mãos, trazendo-a mais para a luz. Olhou para a esposa encolhida a um canto do quarto.
- Ele é branco, Isadora. O diabo do menino não puxou a gente preta, não. É branco! – pegou a mulher pelo braço delicadamente, como se quisesse que ela também visse o que estava vendo.
- E tem os olhos azuis! O azul mais bonito como eu nunca tinha visto! Até parece o céu! – declarou ele, felicíssimo, abraçando forte a esposa que atônita, desfazia-se em choro, inconsolável.