Negócio fechado
Depois do meu fracasso inicial como corretor de dentes de leite para a Fada do Dente, Myla começou a ficar realmente seletiva em relação ao que gostaria de trocar pelos seus dentes, à medida em que começaram a cair.
- Por que a Fada do Dente deixa dinheiro debaixo do travesseiro, papai? - Inquiriu-me ela.
Dei de ombros.
- Provavelmente porque é difícil adivinhar o que cada criança quer. Com o dinheiro, você mesma escolhe o que for da sua predileção.
Ela me encarou muito séria.
- Isso, se o dinheiro der para comprar o que eu quero, claro - declarou em tom solene.
Fiquei imaginando no que ela estaria pensando, mas ela não me deu qualquer indicação no que teria interesse.
Dias depois, fazendo compras no mercado, ela apontou para um minúsculo jogo de chá para bonecas, numa prateleira da seção de brinquedos.
- Acho que aquilo seria suficiente.
- Suficiente para quê? - Questionei.
- Pelo dente que vou deixar essa noite, debaixo do travesseiro - anunciou.
- Não é assim que funciona, Myla - alertei. - Você quer que eu compre para você?
Ela fez um gesto negativo.
- Obrigada, papai. Eu me entendo com a Fada do Dente - afirmou.
Saímos juntos do mercado e eu acabei tirando a história da minha mente... até a manhã seguinte. Na mesa do café, ela exibiu para mim e para a minha esposa a caixa do jogo de chá, a mesma do dia anterior.
- Eu não vi você pegar isso, Myla - encarei-a muito sério. - Não disse que se quisesse, eu compraria?
- Eu não peguei, papai - defendeu-se ela. - Só disse que seria uma boa troca para fazer com a Fada do Dente.
- Que história é essa de Fada do Dente? - Questionou minha esposa.
Fiz um breve relato da conversa no mercado no dia anterior e agora éramos dois adultos encarando uma menina de sete anos de idade com as testas franzidas.
- Explique isso, mocinha - indagou minha esposa.
- Antes de dormir, eu fiz uma oração para a Fada do Dente - disse Myla, também séria - e coloquei o dente debaixo do travesseiro. Eu disse a ela que podia trocar pelo aparelho de chá rosa do mercado. E ela aceitou, mamãe!
Eu e minha esposa nos entreolhamos.
- Você realmente não a viu pegando isso?
- Não - redargui. - E ela estava do meu lado o tempo todo.
Como a história começasse a nos incomodar, acabei ligando para o mercado e pedi que fizessem uma contagem nos aparelhos de chá de brinquedo, ver se estava faltando algum.
Nenhum faltava, me asseguraram. Nenhum.
- [26-06-2023]