ANTONIO MEUCCI – O inventor do telefone

 

Categoria: Romance - Parte I

Parte final já publicada no endereço abaixo.

 

Um dia o tempo revoou as páginas de uma verdade, e a realidade peregrinou nos braços da amizade, ora traduzindo o silêncio expirado na agonia do simples desejo. Outrora em fazer uma pessoa sorrir e poder falar nas temperaturas das emoções de qualquer parte do planeta. Este simples homem, Antonio Santi Giuseppe Meucci, foi o retrato mais padecido de todas as ilusões que a alma humana pode carregar nos mistérios intransmissíveis da vida, imergindo nos centuriões e ventrículos desolados da fé. Ainda, pela liberdade espancada pela forte esperança nos olhos quando se abre num panorama. Conhecido como Antonio Meucci, nasceu naquelas estâncias de San Frediano, hoje um singelo bairro de Florença na grande e velha Itália.

 

Soando no semblante desta fortaleza, é Firenze a dinastia do pensamento renovado de inúmeros labores abertos ao universo do manto azul estrelado. Pinga em cada nuvem panorâmica dos olhos a arte dos gênios de todos os tempos até parece o sinal dos deuses em confraria. Na vastidão imortalizada na história em que a luz é o passado, presente e futuro de cada lembrança hasteada nesse pavilhão de conhecimentos. Lustra a vida e banha no espelho de cada ângulo mergulhado na fina escultura de David de Michelangelo a central espetacular e colossal de Florença por todos os séculos na frente do Palácio de Vecchio até o ano de 1873, passando para o interior da Academia de Belas Artes.

 

Se houve um puro-sangue derramado nas mãos de Michelangelo, com certeza um véu branco desceu do céu em forma de paz no centurião deste nobilíssimo gênio que desafiou o tempo e todas as estações. Pois, Florença é a sua face desenhada em mil desejos erguidos no patamar das ilusões onde a fantasia é o símbolo da realidade do Golias de Florença. Despedido nas portas do imaginário, ali, o David de Michelangelo é o defensor bíblico e incentivador dos labores e conquistas na singela aparição da alma com uma funda na mão.

 

Não restam dúvidas que durante a passagem destes séculos, David de Michelangelo frutificou e gemeu dores em protestos ao despontar com nitidez a brandura do ser humano. E tudo isso se equilibra nos sonhos e bravuras revestidas na miúda consciência humana. Verifica-se, entretanto, da própria arte cultural do Renascentismo a mais garrida escultura de Florença da região da Toscana e província homônima. Assim, nos parece possível admirar a estátua mais famosa do mundo em mármore do gigante de Florença. Silenciando a prévia da liberdade que transcorrem as eras, suscitando a durabilidade de todas as conquistas nos olhos com a mão esquerda segurando a funda que guerreou com Golias.

 

Eram cinco horas da manhã, o céu ainda escuro com nuvens sombrias refletia na fina claridade que ressurgia nos horizontes da pequena San Frediano. Bem ali, na casa da Rua Elucidação, nº 475, atualmente Via dei Serragli, 44 em Florença, marcada pelo calendário na quarta-feira do dia 13 de Abril de 1808. Um miúdo grito alarmou a pequena rua da suntuosa cidade. E chorava nos braços da mãe, o gênio italiano abrindo os olhos pela primeira vez ao mundo no despontar da alegria familiar e amigos.

 

Na infância entre vários irmãos, o apoucado aprendia com os pais as preleções da existência, sorrindo e às vezes, brincando com os amigos da sua idade na Rua Serragli. Certa noite repleta de estrelas no infindável céu, com três anos de idade, o gênio sentado à porta de casa com a mãe, observava o universo e, indagava:

 

-Por que o céu é cheio de luzes à noite? E o sol não vem iluminar a noite como o dia?

 

-Ah meu filho! Você faz tantas perguntas que nem sei como responder.

 

Ele lançou as pupilas na direção do cosmo, apontando com o dedo, indagando:

 

-Mãe, por que as estrelas correm de um lado para o outro e depois desaparece?

 

Assustada, levou a mão à cabeça, inclinando o corpo na cadeira de madeira de lei, diz:

 

-Não me pergunte. Talvez, elas caem no mar ou se perdem na visão.

 

-A senhora nunca sabe das coisas. E o que vem do céu nos dias de chuva feito uma língua fina de luz caindo na terra?

 

-É o relâmpago uma notável criação de Deus.

 

-Como assim? E Deus criou tudo isso?

 

-Sim. Ele criou tudo em sete dias. Primeiro fez o céu e a terra e dividiu em dois mundos. O mundo espiritual e o mundo material que é passageiro, antes não havia nada, era tudo sem forma e sem luz. A terra parecia uma bola de fogo e luz girando no espaço até se esfriar e ser o que é hoje a nossa terra. No segundo dia, Deus fez o firmamento, separando as águas, ordenando e materializando a atmosfera no céu e a terra. Terceiro dia, ele formou o ambiente para surgir a vida. No quarto dia, ele criou a luz para penetrar na terra separando o dia, a noite e as estações na contagem dos meses, anos e séculos. No quinto dia, ele deu vida aos peixes nos mares, rios, lagoas e todas as aves e animais terrestres. No sexto dia ele criou o homem, o único ser inteligente da terra à sua imagem e perfeição E no sétimo dia, Deus descansou e abençoou reservou este dia para o homem.

 

-Como é bonito, mãe!

 

Já contando com quatro anos incompletos, após a refeição do meio-dia, o menino empolgado indaga à mãe:

-Quando o pai vai levar-me em Milão? Quero entrar na igreja de Santa Maria da Graça e apreciar a pintura da Última Ceia de Leonardo da Vinci na parede do refeitório do convento. Peça mãe ao papai, por favor!

Com a interrogação estranha, ela tenta explicar:

 

-Filho, ultimamente as coisas não andam bem financeiramente. E para lhe dizer toda a verdade, não estamos nas condições para empregar uma viagem dessas. Estamos preocupados com as despesas de sua educação.

 

Desconte, o guri insinuou:

 

-Apenas disse que desejo admirar a obra de Leonardo. Se eu nunca for a Milão, eu vou ser como o veneziano Marco Polo, sair por aí andando nos mares e terras.

 

A mãe surpresa com tal resposta irrita-se:

 

-Não diga isso menino! Não aspiro que tenhas os mesmos sonhos de Marco Polo.

 

-Está bem. – Disse o menino saindo cabisbaixo.

 

Ao cair da tarde de 18 de setembro de 1813, o menino saía em disparada pela rua ao encontro do amigo, ele estava ali com cordão de aproximadamente vinte metros e duas caixinhas de madeira. Improvisando um brinquedo rústico de falar através da linha acoplada com um furo no fundo. Já que anteriormente já havia deixado por alguns dias de brincar através de uma vara sem cavidade no interior. Momento, ele chama pelo amigo:

 

-Alano. Hoje vamos brincar de falar com este cordão. Amanhã, a gente brinca com a vara.

 

O garoto de bermudas longas, olhos azuis, diz:

 

-Não tem problema.

 

-Então segura na extremidade que eu vou falar.

 

Eles esticaram a linha com a caixa na ponta e Meucci, indagou:

 

-Está me ouvindo, Alano?

 

-Não.

 

-Estica a linha.

 

-E agora?

 

-Sim. Estou ouvindo muito longe a sua voz.

 

Meucci ergueu a cabeça num movimento súbito, e perguntou:

 

-E agora? Você me ouve bem?

 

-Muito pouco. Desculpe! Eu quero brincar de bola de gude.

 

-Está bem. Então vamos. Depois a gente fala novamente, viu?

 

-Combinado.

 

-Se preferir, nós podemos brincar de professor. Se é que eu vou...

 

Passados alguns anos, o infante despertou largos interesses pela ciência com indagações de tudo o que via, tão logo passou a frequentar a mais importante Academia de Belas Artes na capital de Toscana. Inúmeras razões para a caminhada do progresso que insistiu desbravando curiosidades desde muito cedo com os pulsos da voz.

 

Entre tantas dificuldades, Antonio Meucci batalhou por um longo período de seis anos estudando na majestosa agremiação, buscando outros conhecimentos nas disciplinas básicas como: mecânica, desenho e química cujos estudos incluíam a física, acústica e a electrology, disciplinas que foram ao tempo introduzido na academia por força da ocupação francesa.

Com esperanças nos olhos que ventilavam grandes admirações pela leitura e ensaios, sentiu-se pela primeira vez que as condições financeiras da família não suportavam o avanço da continuidade intelectual, o que resultava em parte do seu tempo. Sem sorte, lamentou-se por dia, expropriando nas latitudes imaginárias a perca de não usufruir com persistência os sonhos.

Ainda tenso, mastigava nas entrelinhas todo o aprendizado nas evoluções de sua época e transições futuras. Aos dezessete anos, Meucci temperava as alegrias realizando embaralhadas químicas no emprego de agente capaz de lançar a longas distâncias os fogos de artifícios. Naquele plano enérgico, Meucci sorria ao lançar os seus fogos de artifícios com estampidos pela velha Florença.

 

Às cinco horas da tarde de domingo, na sala de jantar, os pais de Mecucci discutiam sobre os estudos.

 

-Você contou a Meucci? Então, pode dizer alguma coisa ao seu filho?

 

A mãe do guri curvou a cabeça, dizendo:

 

-Sim. Eu vou me esforçar.

 

Naquele instante, Meucci indaga:

 

-Falar o quê?

 

Com os olhos recaídos, ela sussurrou:

 

-Não quero que perca o controle. Estou sofrendo muito. Na realidade não teremos condições de mantê-lo na Academia na conclusão do curso.

 

Disse o pai, fixando os olhos no garoto sentado à mesa.

 

-É lamentável, meu filho.

 

-Pare. Não precisa esconder de mim. Compreendo a situação. Espero que vocês me compreendem que eu não posso deixar de estudar. Mesmo com a minha pouca idade, posso trabalhar um expediente e pagar meus estudos.

 

-Oh meu Deus! Por favor, tenha compaixão desse menino.

 

-Não se preocupem comigo. Nunca é o bastante falar a verdade. Assim, eu posso ajudar meus irmãos e abrir no futuro o meu próprio negócio.

 

Em 1823, contando com apenas quinze anos, aventura-se num cotidiano ardoroso, dividindo meio expediente de trabalho com os conhecimentos técnicos e aprimoramento na Academia. Arrojado em laborar para manter a independência financeira, conseguiu um emprego numa repartição governamental intitulada como alfândega no controle de entrada e saída de mercadorias. Não tardou, ele encontrou no braço da Itália as profundas raízes que se rebelava nas modificações de um preço justo à liberdade e patriotismo. Logicamente, este fogaréu ardente no pensamento juvenil tornava-se basilar ao brado das ações dos Carbonários num levante altivo em suas reuniões com a puríssima verdade. Aparentemente, o movimento era abstruso nas imaginações estranhas dos bisbilhoteiros. Naquele triunvirato de pelejas, encontrava-se afiliado o gênio Meucci na enigmática Unificação italiana e independência social e política do seu povo.

 

Ao término dos estudos na Academia, estando insatisfeito com os insuficientes ganhos, procurou emprego e longo período laborou na qualidade de técnico de cenários em vários teatros da cidade, e por último no Teatro della Pergola onde a paixão e a tradição sempre marcaram os laços fundamentais da bela Florença no mistério inflamável do calor do palco.

 

Na abertura do ano de 1833, Meucci esteve preso por se juntar na revolução que defendia a libertação da Pátria e, o avanço do livre-arbítrio aprisionado no seio italiano, acusado de pertencer ao movimento Carbonário, passou semanas aprisionado, ao sair da cadeia buscou por um novo emprego.

 

Na manhã de quinta-feira do dia 14 de fevereiro de 1833, na capital da moda no passado, o inverno abatia na cidade da Toscana, a temperatura chegava abaixo de zero, caindo uma neve suave. E o jovem inventor acordara cedo, concentrando os seus derradeiros pensamentos na porta principal do Teatro della Pergola. As janelas superiores daquela edificação majestosa ainda se encontravam fechadas, as luzes dos candeeiros não abriam os olhos naquela manhã nebulosa. E na frieza florentina, ele vestia uma peça de roupa grossa tipo gibão nas cores azuis fortes e vivas, insinuando uma espécie de jaleco curto acolchoada com a sobre túnica verde, justa e bem abotoada. Na cabeça sobressaía um chapéu curvado na frontal direita tonalizando azul-claro arrojado. Despertando tanto interesse, ali, permanecia com frio intenso, empolgado em arranjar de imediato um emprego. Inerte, à porta cerrada, o funcionário da casa de ópera ao abri-la, indagou de imediato:

 

-O que o senhor deseja?

 

Sem dar resposta apropriada, ele pronunciava as palavras de uma maneira exuberante e saudável, disse com um riso:

 

-Antes que eu lhe explique. Eu sou Antonio Meucci, um rapaz de Florença desempregado.

 

Estendeu a mão, expressando um forte aperto de mão. E o servidor virando-se manifestou:

 

-O momento é muito inadequado para solicitar emprego. Não achas?

 

-Certamente. Por favor, diga-me quem é o responsável pela direção dos cenários?

 

-Desculpa-me se estou sendo grosseiro. É o senhor Artemis Canovetti. O que o mais desejas?

-Quero marcar uma conversar com este senhor. É possível hoje?

 

-Não sei se haverá probabilidades hoje. Estamos ocupadíssimos com a nova temporada que vai se iniciar.

 

De repente, o senhor Canovetti ia cruzando a escada do salão que dar acesso ao andar de cima. E Meucci averiguou sem rodeios:

 

-Aquele é o senhor Canovetti?

 

-Sim. É ele mesmo.

 

-Deixe-me falar com ele.

 

-Tudo bem. Senhor Canovetti, este rapaz aguarda para uma conversa.

 

Ele se aproximou do jovem florentino, e perguntou:

 

-Pois não. O que posso lhe servir?

 

-Senhor Canovetti, meu nome é Antonio Meucci. Concluir meu curso na Academia de Belas Artes, e durante este tempo, adquiri experiência em vários trabalhos, inclusive em teatros da nossa cidade. Eu preciso trabalhar. Se for do vosso agrado, estarei à disposição imediatamente.

Canovetti olhou e sorriu.

 

-Não. Sabe garoto, estamos com o nosso quadro completo.

 

Insistiu Meucci:

 

-Ouça-me senhor. Estou cansado de vagar pelas ruas de Florença a procura de emprego. Necessito urgentemente de trabalho para sobreviver.

 


-Lamentavelmente, não posso. Recomendo que venha no final do mês falar com o nosso diretor, Alessandro Lanari. No momento, ele se encontra em viagens pela Itália e Europa a procura de talentos para escrever a próxima temporada.

 

Os olhos se arregalaram, e se despedindo com a névoa que caía lá fora, disse:

 

-Obrigado senhor pela informação.

 

-Eu é que agradeço rapazinho. Sou muito simplista no que desejas saber.

 

Ao sair, Meucci cruzou os braços, e depois ficou parado ponderando as abreviações do tempo nas circunstâncias melancólicas ora fervilhadas na mente. Mirou as pupilas na direção do saguão principal, descendo e introduzindo as mãos no jaleco, curvou a cabeça. O funcionário da casa pressentiu que o jovem mergulhava subitamente em depressão, e logo investigou:

 

-Está tudo bem?

 

Ele virou-se sacudindo a cabeça de leve. Naquele momento, o empregado oferece um banco, e fala:

 

-Está se sentindo mal? Não quer sentar? Sinto muito por isso, talvez na próxima reunião com o nosso diretor seja mais promissor.

 

-Não. Obrigado. Aliás, cada um tem seus motivos convincentes para deliberar sobre as questões pessoais ou não. Eu vou e volto com mais força. Um abraço amigo.

 

Despediu-se com a fisionomia retorcida no compasso fragilizado das batidas do coração que martelava calmamente.

 

Ali no saguão principal do teatro, encontravam-se as mais variadas informações da temporada, as estreias abriam o ponto pitoresco aos espectadores. As companhias de danças, artistas, coreógrafos, músicos e dançarinos eternizavam a cidade das artes teatrais.

A imagem da chama ardente da ópera italiana mostrava-se sobranceira sem qualquer reparo, galante e inovadora na constituição secular de shows, garantindo o alinhamento das tradições. É, e sempre será o della Pergola a magia aberta aos céus do nosso universo brilhante, ou nas escadarias resultantes das lutas e paixões de cada espetáculo. Com tantas reformas tempestivas, a casa de danças e cantos não se afastou do cenário eletivo que faz arte e cultura nos lineares até hoje. Marcada nos traços coubera ao nobre empresário teatral Alessandro Lanari a transformação magistral do teatro, atraindo nesta fase o melhor da ópera clássica italiana, e concretizando a mais árdua aceleração do mundo artístico da Europa. Com as recentes mudanças e definições, o grande pintor Martellini, talvez esquecido pelo Rio Arno e toda a Itália teve a incumbência de realizar um trabalho extraordinário no Teatro della Pergola no ano de 1826, ele pintou a longa cortina do teatro retratando a coroação (coroa de louros) de Francesco Petrarca no Capitólio, onde a maestria e fineza, materializava com elevados conhecimentos técnicos, onde bradava o renascentismo, cultivando a glória do maior poeta italiano e do humanismo. Sem olvidar os enriquecidos trabalhos do engenheiro Canovetti que acentuou as possibilidades no desenvolvimento de mecanismo para o levantamento das cortinas. E mais tarde, Gaetano Baccani, um dos melhores arquitetos da Toscana na época projetou a decoração da frente do teatro e o Salão das Colunas com pó de mármore.


Não procrastinou as horas, os dias e tão pouco as ânsias do juvenil de vinte e cinco anos de idade que se apresentava ao diretor do teatro. O famoso Alessandro Lanari de San Marcello, nascido nesta pequena comuna da região dos Marche na província de Ancona. Conhecido como “Napoleão dos empresários”, dada ao efetivo conhecimento da arte teatral em desbravar excitantes labores em prol do universo teatral. Homem forte na pesquisa e fervoroso estimulante das paixões dramáticas, inovador, bastante criativo e sensível nas operações cênicas da sua época. Era o rei mágico das óperas italianas, extraordinário em busca do sucesso e glória por onde desempenhou com amor a vocação do potencial entre compositores, escritores, poetas, aos laços do prestímano. Lanari era um mercador das brasas na península, destilando o seu nome por toda a Itália e Europa num verdadeiro trabalho de Hércules ou David de Michelangelo. Enquanto ampliava o nome do Teatro della Pergola, naquele dia aprazado, ele recebeu o gênio inventor que se apresentava no escritório da casa. Um tanto nervoso refletia nas razões proporcionais daquele mundo novo, ele disse com ar esperançoso que brilhava dentro das pupilas:

 

-Senhor Lanari, eu sou Meucci. Concluir minhas formações em mecânica, física e eletricidade na Academia de Belas Artes. Eu quero trabalhar nesta grande casa. Tenho experiências em vários teatros da cidade como assistente de cenários. Procurei ao senhor Canovetti e este me indicou a sua pessoa.

 

-Garoto, esse problema de trabalhar na parte mecânica do teatro tem sido um problema sério para Canovetti. A maioria desses jovens de nada entende, chegando a causar enormes dificuldades na casa. Muitos dizem que são habituados com cenários e não desenvolvem nada por aqui. Estou com uma equipe que me dá muitas dores de cabeça. Às vezes me deparo com situações conflitantes e análogas, o que me dói muito.

 

Fixando o olhar no diretor, o juvenil engole a sua apreensão, afirmando:

 

-Compreendo as suas labutas. É chegada a hora de mecanizar os instrumentos do palco. O que o senhor me diz?

 

-É um avanço muito além das minhas imaginações. E acho difícil de realizar.

 

-Não, senhor. Não existe mistério algum. Aqui mesmo trabalhando, eu agradeceria imensamente se houvesse condições de experimentar as minhas inovações mecânicas.

 

Sorriu Lanari, dizendo:

 

-Está de brincadeira comigo, né garoto?

 

-Falo a verdade, e a minha veracidade é pura sem lorotas.

 

-Está me dizendo que tens habilidades de fazer modificações mecânicas. Garoto! Fale-me a verdade? Eu nunca ouvi isso de um assistente de palco. Por favor. Mantenha-se sob sigilo, pois, quero preservar essa ideia para aprimorarmos o mais rápido possível. A nova temporada vai começar com Felice Romani. Conhece?

 

-Sim. Ele é um poeta muito famoso.

 

-É verdade. Por isso, contratei-os para escrever uma obra importante para a nossa casa. Ele é um homem cauteloso, estudioso e tem feito bons libretos para os compositores de óperas Donizetti e Bellini. Não há por aqui nenhum libretista igual a Romani. Com o trabalho já concluído, estaremos em breve com a casa cheia. Quero por à prova no dia dezessete de março, no terceiro domingo do mês. Se o sonho é a mistura de minhas ilusões, eu vou lutar e morrer por este mesmo caminho.

 

-E qual o nome da ópera?

 

-Parisina, uma ópera séria, seriíssima. Como é mesmo o seu nome?

 

-Antonio Meucci. Sou daqui mesmo de Florença e preciso desse trabalho urgente.

 

-Sabe, tenho quarenta e seis anos e conheço muito bem o que é teatro e ópera. Afinal vivo disso. As inovações do drama e as composições é que demarcam nesse conjunto o brilho. Se tiveres melhorias para adicionarmos no palco, apresente-me um projeto.

 

-Senhor. Eis-me aqui para provar com honestidade o meu singelo trabalho. Deixe-me mostrar as minhas experiências. Tenho certeza que não vou lhe causar prejuízos. Se lucros eu não der, prejuízos jamais acontecerão.

 

-Quer ganhar grana? É?

 

-Não, senhor. Desejo apresentar por uma semana os meus trabalhos sem nada lhe cobrar. Apesar de que o homem sem trabalho não pode prover o necessário à boca.

 

-Muito bem. Acontece, como havia dito antes, a maioria dos que se apresentam não tem nenhuma ideia do que a física é importante nos cenários desta casa. Isso aqui funciona como a vida e o sol brilhando todos os dias.

 

-E então? Vê alguma coisa?

 

-Sim. Comece agora, por favor.

 

Com efetivo apreço e já na qualidade de assistente de engenheiro-chefe, mostrou as possibilidades que se redobraram aquilatando os elos da comunicação e conceitos técnicos aproveitados nos cenários do Teatro della Pergola no ano de 1834. Dentre alguns meios, o gênio italiano construiu canais através de tubos provisionados na fala entre as dependências do teatro. Cuja utilidade fazia o intercâmbio das cenas sem que o público não percebesse. Nascia ali o primeiro som de telefone acústico com tubo de comunicação do palco e a sala de controle.

 

Era uma situação flutuante e nobilitada pelas artes dos palácios do renascentismo submergida nas decorações dos salões e brilhos altivos. Sensações emergentes fluíram no abrir das cortinas coloridas entre o palco e o fervoroso público. Ali estava o mancebo planejando as inusitadas ideias que alavancaram as cenas de prosa, cânticos sacros e poesia no entrave da comunicação nos bastidores. Uma lição endeusada em mágicas históricas fincadas em multifaces de cada era no relógio das alterações confortáveis e animadas pelo imaturo florentino.

 

Tangendo nas laterais do cansaço, o gênio atribuiu fórmulas e estudos racionalizando melhores ângulos de trabalho nas experiências e criações fantásticas que concebera no della Pergola. O alvitre ansiado com sorriso trivial circundava nos arredores daquela conspícua majestade de sonhos, até que um dia nos bastidores, um meigo olhar atrelou com eficiência as pupilas do jovem florentino.

 

A face prazenteira no terno olhar nas oblíquas obrigava a moça que ostentava as costuras do teatro a cessar as atividades num riscado sentimental. E aos poucos, as eras não partilhavam desse assentamento de meiguices que enfurnava a grande figurinista da casa na ansiedade abrolhada de tanto amor.

 

Do galanteio acelerado, e assinalado no encontro embarcado de cada limiar dos faróis que guarneciam o silêncio nas calçadas, pisava o contentamento nas mãos daqueles enamorados.

Repisando nos anseios por uma luz na visão, o jovem se encanta com a costureira do teatro difundindo um olhar desconfiado. As atrações percorrem o pensamento de ambos, e Meucci se aproxima da figurinista e diz:

 

-Você trabalha muito bem nesta arte. Tenho observado a sua inteira dedicação na invenção dos figurinos, idealização com os textos, projetos e tantos desenhos na interpretação de cada ato.

 

-E você sempre me perseguindo. Não é mesmo? Sem o teatro eu não saberia como viver. Agora mesmo me sinto cansada com as pesquisas e esta equipe que me acompanha na produção e na organização do guarda-roupa, não me abandonam. O mais difícil é o tempo que passa tão rápido e as cobranças do diretor. Para mim, a realidade e a ilusão caminham na mesma esteira dos meus rabiscos.

 

-Sim. Posso dizer que sem o seu engenho não há teatro e nem plateia. Ao largo dos sonhos de cada narrativa, trajes e molduras, se vive uma história em cada espaço geográfico. E você faz esse mundo girar dentro dos meus olhos como se fosse a lua banhada por uma rosa. Na verdade, eu fico pensando...

 

Ela sorriu, e disse:

 

-Você também é um homem especial para o nosso teatro. O senhor Lanari e o Canovetti falam muito de você. Não gosto de segredos, porém, sinto-me algo em você que me atrai muito.

 

Surpreso, ele falou:

 

É mesmo? Você é linda e me faz percorrer toda a região da Toscana com este brilho. Paro. E vejo essa alma que iluminando os meus pensamentos.

 

-Isso mesmo. Acho que a sinceridade anda na mesma linha da arte de viver e brilhar na paz.

 

-Podemos marcar um encontro mais tarde?

 

Ela deu uma risadinha, e disse:

 

-Claro. Antes, eu preciso falar com Donizetti para estudar o último texto. Sem uma figurinista nada funciona.

 

-Ele ainda não terminou de compor?

 

-Não. O trabalho está bastante avançado em sua parte final. Gaetano Donizetti é genial, mantém-se sob sigilo intransigente quando está escrevendo no quarto. Com tinta, papel pautado e umas dez cafeteiras do lado, ele se torna mais que um sábio. O Homem é viciado mesmo em café! Só escreve tomando café.

 

-Por isso, ele compõe belas óperas. Acredito que o melodrama Rosamund da Inglaterra fará muito sucesso nesta temporada com a casa cheia, ainda mais com Romani.

 

-Essa lenda da Rosamund da Inglaterra vai fazer um show em Florença. Sabe de uma coisa. O meu trabalho se redobra com a linguagem onde o ator terá que se identificar com a personagem da história com roupas, comunicações, estética teatral para cada processo em cena. Em pleno inverno, a sua estreia está prevista para o dia 27 de fevereiro de 1834. Daqui a alguns dias.

 

-É verdade. Esther, eu tenho um milhão de fatos para lhe contar a meu respeito. O assunto é sobre nós dois. Posso lhe aguardar na saída?

 

-Sim. Sem nenhum problema.

 

E não tardou as estrelas lampejarem na cidade de Dante Alighieri, delimitando o dia 07 de agosto de 1834, onde Esther Mochi e Antonio Meucci lançaram o ingresso nas pétalas que perfumam a união das corolas no beijo fraternal e inseparável.

 

A temporada corria nas esquinas com a aragem na liberdade, associada no misticismo tornava-se o auge imperador das conflagrações de cada jovem italiano que insurgia em derramar a veleidade pela pátria. Às vezes, frequentava os tablados subterrâneos sem ultraje da honra, liberdade e fraternidade, e ficavam intactas dentro do cruzamento de inovações da nação. Por esses pretextos nacionalistas, Meucci participava das reuniões avolumadas nas questões político territorial, dita soberania monárquica estava dividida em vários Estados independentes, gerando o inconformismo dos patriotas. Tais oscilações obtiveram a ascensão de buliçosas classes sociais, incluindo a burguesia na divisão norte e sul. Sendo que os abalos abrolharam por diversas partes da Itália.

E no caso, estava presente a agitação Carbonária de Philippe Buonarroti com revolvidos valores liberal e anticlericalismo. Noutra banda, reapareceram Giuseppe Mazzine e Giuseppe Garibaldi que não aderiram determinados princípios do levante de Buonarroti, tendo Mazzine agremiado outros nacionalistas na formação do movimento da Jovem Itália com vinculado retoque republicano.

 

Notadamente, as pretensões, as agitações, os prélios eram as nascentes insalubres da revolução contra os absolutistas na preparação de unificar toda a Itália num monstruoso processo conspiratório desde a França e Áustria, despejando por toda a Europa os protestos antimonárquicos avassaladores a começar nos reinos de Piemonte e Sardenha e na parte sulista ao Reino das Duas Sicílias.

 

Deflagrados alguns rumores da sociedade, mesmo com a utilização de códigos, cifras e reuniões. O juvenil Meucci em dois períodos dos anos de 1833 e mais largo ainda no ano de 1834, teve decretada a sua prisão por três meses por tomar parte nas tendências revolucionárias. Levado à prisão ao lado do escritor e político Francesco Domenico Guerrazzi. Impondo-se que o poderio Napoleônico circundava quão uma fortaleza entre os reinados e a pertinência das decisões do papado, além das ambições austríacas. Enviado para a prisão militar de Forte Stella localizada em Portoferraio na Ilha de Elba, era um local seguro que obstava as fugas.

 

Certa manhã, o jovem Meucci afundava os olhares entre as fortificações dos muros derivando a baía do norte do porto em pleno silêncio de dor. Para ele, a consternação majorava no cair do por do sol deflagrando as ondas no meio do mar com a bola vermelha que descia para o infinito dos dias sem fim.

 

E se o pensamento avançado desse gênio refletia nas anotações de bolso, não lhes faltava horas para desenhar e rabiscar os projetos perante a iluminação dos mais antigos faróis na Europa, construído pelo Grão-Duque Leopoldo de Lorena – Farol Portoferraio, uma estrela mirante da Toscana.

 

Por esses motivos, assanhado pela amizade que desfrutava com Giuseppe Garibaldi e outros nas discussões da Jovem Itália, este sofreu duro golpe no provimento de enxergar uma nova Itália. Ao sair de uma das onze celas que compõem o monumental na montanha, Meucci chegou a Florença, deprimido, tímido e cansado.

 

Sem alongamento, Esther o recebe e abraça averiguando:

 

-Até que a justiça seja feita em seu nome, eu não dormirei zelando por ti. Como estais? O almoço está à mesa!

 

Sentado na beira da cama com a face retorcida, disse:

 

-Não querida. Não sinto apetite para comer, e tudo me arruína por dentro. É como se uma espada tivesse atravessado a minha cabeça. Temo que a perseguição seja contínua, sinto que estou correndo perigo.

 

-O que tanto imaginas?

 

Com o olhar de decepcionado, ele presume:

 

-Encontro-me sem asas e me sinto como se alguém me tivesse envenenado a minha alma. É tudo perturbador o que vai se alastrando no meu pensamento. Não consigo entender com máxima precisão o que sucede nestas instâncias, é uma longa história que não acaba mais.

 

A esposa ficou observando o marido, e complementou.

 

-Não fique assim. Amor hoje bem cedo eu fui à capela na Igreja de Santa Maria Del Carmine. E meus olhos não cessavam de apreciar as pinturas de Masaccio. Sinto-me flutuando nas belas obras deste gênio, principalmente a representação de São Pedro curando os doentes com sua sombra ao passar pela rua. É incrível! E, rapidamente me lembrei desse termo envenenamento. Então, parece-me lógico refletir que tão jovem partiu aos vinte e sete anos. Tudo por traição e cobiça.

 

Olhando nos olhos da esposa, disse:

 

-Eu não sei os rumos da nossa existência. Até parece que Florença desaba dentro de mim, e as minhas expectativas voam ao som dos pássaros batendo asas sem destino. Tenho medo da perseguição que lava a alma na traição. E talvez encurte tudo que tentei ser na melhor forma de expandir o espírito da liberdade.

 

As lágrimas rolaram na face meiga de Esther. Ele se levantou e abraçou carinhosamente, dizendo:

 

-Ainda que tardia seja a esperança, o meu amor por ti cavalga em cada pedaço do seu coração. Se com justeza eu me aproximei da verdade, nada verdadeiro eu ouço ou vejo, e tudo retranca as portas do meu amanhecer.

 

Confirmando com a cabeça, a esposa se aproxima segurando a mão direita, encorajando-o, diz:

 

-Sim. Eu entendo todas as suas lutas, por isso, estou eternamente do seu lado. Não dormir durante a sua ausência, e a minha boca não se abriu para a provisão enquanto soluçava a sua presença. Meu amor! Precisamos de um lugar mais seguro onde possamos desfrutar o nosso casamento. Vamos comer um pouco, amor.

 

Repuxando o casaco, o florentino acompanha os passos da mulher até à mesa de jantar, e afirma:

 

-Todavia é preciso voar entre as telhas do céu nem que seja no último telhado arrebentado do interior das minhas paixões. Embora os meus passos estejam inapropriados para as escuridões. Estas esperneiam nos meus olhos como uma serpente nas areias do deserto. Eu tenho a última passagem ao seu lado que me ostenta com brandura e me incentiva em cada minuto da minha vida.

 

Os olhos pregados no esposo, ela refazia uma linha de horizonte com novíssima aspiração, encorajando-o.

 

-Verdade. Abra os olhos e siga. Pois, a veia italiana não abrirá sorrisos e tão pouco uma janela onde possas descansar as orelhas do coração. Mergulhe como a garça e voe nas asas do condor das Américas. Eu sinto todos os dias que Florença irá se partir em duas bandas em desespero pela ambição do poder. Temos que sair e deixar o mais doce das lembranças por aqui. Lembre-se do sofrimento de Mazzini.

 

Virando-se, ele observa a esposa dizendo:

 

-Não posso largar agora os cacos do meu torrão e me aventurar numa onda de ilusões para entristecer mais ainda a sua vida. Com todas as dificuldades aparentes, não temos dinheiro para custear uma viagem dessas. Tenho imaginado que a América sempre me aguardou. Contudo, reservo-me de que os portões não se abrirão a um imigrante italiano aventureiro e sonhador. A fluência do idioma desconhecido ainda é uma barreira surpreendentemente na minha vida. Na verdade, abrir um caminho sem espinho, é o mesmo que andar na luz negra sem um ponto de referência.

 

Tentando amenizar, ela contrapõe:

 

-Não se preocupe querido. Eu guardei um pouco das minhas economias. Quem sabe a América seja um dos melhores lugares do mundo para se viver. Eu acredito que terás muitos sucessos e glórias.

 

Surpreso, solta um ligeiro sorriso, enfatizando:

 

-É mesmo! Então, podemos aceitar o convite do amigo catalão Pancho Marty? Sonhos ainda que sonhos que sejam bucólicas imaginações dos caminhos por onde navegam as almas. Em princípio, não contava com este préstimo de sua parte.

 

-Sim, e podemos trabalhar juntos na fantasia dos teatros, consentindo um tempinho para as suas realizações pessoais. Não é isso? Fale-me mais do catalão. Somente obervei o perfil rapidamente. O que não dera tempo suficiente para saber mais detalhamento da conversa.

 

Explica o jovem:

 

-Querida! Pancho Marty é o mesmo espanhol chamado Francesco Martí Torrens. Um pequeno empresário que partiu para Cuba sem nenhum dinheiro, está fazendo fortuna por lá. Falou-me que os negócios iniciaram com a compra e venda de escravos. Porquanto é sem qualquer leitura e ingressou num dilatado comercio de peixes do mercado de Havana. Ele quer me contratar para ser o projetista cênico do teatro onde dirige.

 

-Não. Não observei isso.

 

-Pensei que estavas atenta.

 

-Agora não me falha a memória, relembro daquele senhor alto e magro.

 

-Sim. Isso mesmo! O que achas de aceitarmos o convite dele para trabalharmos no Gran Teatro de Tácon?

 

-Ah!... Será maravilhoso! Vejo muitos comentários de que a casa é completamente cheia com os melhores artistas de Ópera. Lembras da peça Don Juan de Áustria que foi interpretada pela primeira vez em 15 de abril de 1838? Inclusive na voz enternecedora do ator cubano Francisco Covarrubias.

 

-Sim, tenho ouvido falar. Ele é muito famoso. Mas, a vida de Covarrubias não é tão boa quanto se pensa. Afinal de contas, a família tem sido um calcanhar de Aquiles no seu brilho. Primeiro por cumprir as vontades da família no curso de medicina; segundo lugar por dar um golpe certeiro na família por afirmar que a sua vida era a vocação pelo teatro. É tão lógico que Cuba desfruta desse herói teatreiro que os mares o conhecem.

 

-Eu vejo em Havana um tesouro em obras de artes, e nós podemos levantar tudo de novo com os esforços que recai em nossos ombros. E tudo, tudo se pode realizar no amor, aspirando um berço de nuvens espalhadas por toda a grande América. Creias! Será uma veracidade em tua vida e nos melhores inventos.

 

-Ah! Como tu fazes da minha imaginação o assoalho mais benquisto dos meus tristes dias. Fico às vezes pensando o que será de mim sem Florença ao meu lado e navegar por terras desconhecidas ao lado da serpente voadora. Não desejo que Florença tão bela seja fogo em carrossel e nem as rodas das carruagens permitam que desfigure o meu rosto. Eu tenho que trabalhar arduamente para que as pessoas usem os meus inventos como melhoria de vida.

 

-Não fique assim, descrevendo as forças dos inimigos na beira de uma esquina com uma afiada espada. Não. Não jogas o teu sangue na Torre de Pisa e nem podes segurar a sua queda entre os sinos. Alegra-te que o homem que amo é mais doce que o mel e a uva do coração. Com as economias podemos trabalhar nas terras cubanas. Olha! Se a agonia abater no centro das suas atenções, eu choro como a chuva que cai no meio da rua. Por isso, eu lhe peço. Vamos viver em Havana! Não deixe que os sonhos de Michelangelo lhe atormente com a figura de Santo Antônio com os demônios. Roma ainda cairá no destino reservado para a paz. Ainda acredito que Garibaldi possa iluminar o candeeiro das travessias que tanto almeja.

 

-Jamais posso lutar pela minha Florença e toda Itália. Tenho vergonha e sede das humilhações que abrigam os desesperos. Assim, como não aceito olhar os desenhos das tradições divididas em vários Estados, força, império, monarquias e o clérigo atolado nas influências dos governantes para se manter vivo. Que haja fé ao amigo Garibaldi no mais alto grau dessa batalha por uma Itália unida e jovem. Certeza haverá de recair nos olhos dele. Todos falam da sentença de morte num julgamento injusto e sujo. Antes de tudo acontecer, o mar abrirá as ondas ao Garibaldi - o grande borel.

 

-Não seja por isso que devemos permanecer na sombra desses acontecimentos horríveis. Tu podes batalhar em nome da nova Itália todos os dias ganhando muitas fortunas com os inventos em qualquer lugar da América. A tua fama é conhecida, Meucci. Não padeça nesta escuridão!

 

-Eu não tenho a certeza disso. Eu preciso de muito dinheiro para chegar aonde eu posso me aliar, mostrando ao mundo novo os meus conhecimentos. Quem sabe se não for os Estados Unidos da América? É difícil trabalhar em guerra com tantas amarguras, e ao mesmo tempo repousar a cabeça para rascunhar os desenhos. Duro, será sempre a desonra que me acompanha por onde ando por me avaliarem como um revolucionário. Não quero que meus patriotas pensem que eu o trair deixando Florença num lago de sangue. Não. Eu sinto a necessidade o quanto antes de terminar os meus trabalhos interrompidos. A loja e os primos estão desarticulados, os homens não concordam em harmonizar o desafio entre tantas outras.

 

-E saibas que a loja não reverenciou os teus últimos minutos na prisão. Posso me enganar, mas a ambição cresce entre eles para conduzir nas mãos o rumo italiano. Tens que aceitar que a nossa vida será Havana, o nosso crescido destino, Meucci. Acredito que até as flores se abrirão em cada amanhecer naquela ilha. E se uma rosa acender uma bela pétala no amanhã, eu juro que estarás a um passo dos Estados Unidos.

 

-Eu duvido. Entretanto, não quero passar pelas redondezas da flor e depois, seguir o meu juízo.

 

-Que flor?

 

-A flor da catedral no campanário da Basílica di Santa Maria Del Fiore. Quero esquecer tudo de uma vez por tudo o que arde nos meus olhos. Eu penso na liberdade desse povo ou cedo ou mais tarde no próximo verão custoso.

 

Após um dia, Meucci e Esther foram à Ponte Vecchio, de mãos dadas, atravessaram o arco medieval da ponte, e na volta os seus olhares mergulharam na densa água do Rio Arno. Esther estava com um chapéu imenso de cor vermelho brilhante, um lindo e criativo espartilho, vestido azul púrpuro claro, mangas fofas fazendo efeito na cintura fina, descendo a saia larga com babados e muitos bordados confeccionados por ela à mão já que não existia máquina de costura. Por cima uma blusa fina e transparente reluzindo a coloração do vestido com fendas nas laterais do tecido. A bolsa de seda no braço esquerdo no tom rubro entre três pontuadas douradas. E seu cabelo liso amarrado atrás eram as maravilhas de uma bela visão. Usava sapatilhas de salto alto.

 

Meucci vestia-se elegantemente, trajando um casaco cinza claro aberto, comprido com duas pulseiras de ouro na lateral da calça, um sapato com bico largo dos últimos lançamentos, chapéu em dura forma de boina verde campestre. Tudo na influência da moda que ventilava por toda a Itália.

 

De repente, Esther segura com a mão esquerda a lateral do vestido e saiu apressada até uma loja na ponte, adquirindo um cadeado virgem, após efetuar o pagamento, colocou preso nas grades da estátua do escritor e escultor florentino Benvenuto Cellini, retornando ao encontro do esposo centrado no meio da ponte, ela disse, sorrindo:

 

-Meucci! Olhe pra mim! Diga-me que me amas?

 

Encostado na lateral esquerda da ponte, ele contraía os músculos faciais, asseverando:

 

-Sim, eu te amo tanto, tanto assim como as águas desse rio que descem e não voltam mais para Florença.

 

Lançando o ar esperançoso, ela desprendia nos cantos dos lábios, sorvendo na luz da alacridade toda a sua graça, proferindo:

 

-Veja o quanto eu te amo e sou capaz de enraizar os nossos sentimentos para todos os séculos neste rio. Somente assim, podemos adicionar nas águas as belezas e meiguices reunidas nesta chave. Eu estou feliz no teu curso, seguindo no mesmo adereço que pulsam os nossos corações.

 

Complementando, ele asseverou segurando o chapéu com a mão direita sem que o vento assoprasse levando na descida das águas do Rio Arno.

 

-É a minha rosa, a feminilidade consecutivamente delicada que derrama dentro de mim as cinco pétalas perfumadas. E por tudo isso, ratifica nos dias e nas minhas noites a minha aclamação por ti. Abraça-me ainda que a brisa suave nos deixe apreciar esses momentos.

 

E naquele exato momento, ela lançou a chave do cadeado no Rio Arno que permaneceu preso na estátua do célebre italiano. Em seguida, os dois abraçados observaram o voo mágico do amor que se eternizava nas profundezas do rio, acreditando na tradição de que a grande afeição a partir daquele momento seria uma eternidade.

 

ADEUS! – CIDADE MAIS BELA DO MUNDO – FLORENÇA

 

No outro dia, na manhã nebulosa e afundada na indistinção, Florença acordara sem a luz do empíreo, e o vento soprava fragilizado entre as árvores de cada rua, deixando cair às folhas verdes das verduras. E a capital da Toscana não florescia entre os palácios, galerias, museus, praças e igrejas. Era o dia 05 de outubro de 1835, a paisagem se perdia no colorido escancarado das belezas. Na porta da residência do senhor Meucci, encontravam-se estacionadas duas carruagens contratadas. Dentre tantas malas de couro e pacotes os dois cocheiros silenciados, apenas armazenavam. Esther já preparada e muito admirável chamava o marido abrindo a lateral da janela da carruagem.

 

Naquele mesmo ano, no dia 23 de novembro de 1835, chegava ao Rio de Janeiro no porto o homem de ferro, o homem dos dois mundos, numa espetacular fuga da prisão de Gênova na qual aguardava a sentença de morte – Giuseppe Garibaldi.

 

Meucci rodeava a casa e embargava dentro da alma a voz da razão. “Nunca mais meus inimigos políticos me seguirão”. Já ultrapassava o tempo devido para o embarque, ele subiu no assoalho da carruagem, sentando-se ao lado da esposa. Ao distanciar da residência pediu ao cocheiro que voltasse mais uma vez pela mesma rua para guardar as últimas lembranças da residência. Notando lentamente cada detalhe das ruas, pessoas, lojas e árvores, Meucci lagrimou lentamente sem esfregar os olhos, puxando a lateral da cortina da janela por algum tempo. E a angústia rompia as feituras das épocas, assomando-se no balançar um rio misterioso de emoções na lagoa dos olhos.

 

O tempo cerrava as cortinas daquela contemplação amortizada nas sementes da flor de pérgula, refugiando-se na aflição de um único olhar, ora rebaixado nas circunstâncias da fuga que não abriga a violência derramada por toda a Itália. Instantes, a esposa consola deslizando as mãos no semblante do inventor, e a voz macia e carinhosa afirma:

 

-Não derrame suas lágrimas, elas pesam dentro de mim quando escorregam do seu rosto. Se eu pudesse, qualquer coisa eu faria para vê-lo a sorrir. Tenha calma que os nossos desejos irão se realizar na abertura pacífica da nova terra. Às vezes, eu penso que tudo isso seja um sonho dourado entre tantos espinhos. Se o meu amor por você é maior que o céu, imagine a distância das estrelas brilhando no anoitecer da América.

 

O jovem florentino, apenas meneava a cabeça tentando encobrir as lamúrias que rolavam das pálpebras. Adiante, a carruagem desfilava lentamente num cavalo branco com manchas negras nas patas pelas ruas de Florença. Era a cadência mais lúgubre daquela estação piedosa e espinhada. O cocheiro deslizava com cautela a mais chorosa viagem de um adeus que se parte para um fundo sem volta. A esposa carinhosamente recolheu os pingos mágicos daquele grande homem com o lenço branco torpeza. Instigante a silhueta se misturava com a leve brisa que penetrava suavemente pela janela, minutos em que a esposa sobreleva a mão esquerda à face do nobre florentino.

 

Este deplora com a mão no queixo, sussurrando com a passagem da velha Florença:

 

-Eu não sei os motivos da minha vida ser tão diferente. E quase não posso erguer as minhas colunas. Não. Não sei até aonde as minhas forças serão capazes de suportar tantas dores no amargo das fantasias. Se de um fluxo recai as minhas torres, mesmo pesquisando minuciosamente, eu vou batalhar por este devaneio que me abre sem fronteiras. Às vezes, permaneço imaginativo em tudo que já fiz, até mesmo nas centenas de vezes em que observava as distâncias milimétricas das necessidades basilares dos meus pais. É doloroso e incendeia como uma pimenta nos meus olhos em deixar Florença e toda a minha bela Itália. Abrir os meus olhos e não vê o Rio Arno atravessando mansamente a terrinha querida. Eu preciso chegar à América do Norte, pois é lá onde tudo pode acontecer e refazer uma novíssima existência de negócios, invenções e melhoramento no padrão de nossas vidas.

 

Esther condoída molhou a face com gotas incolores descendo dos cantos dos olhos, e fala:

 

-Sim. Venceremos os círculos das imaginações, e levaremos no peito as lembranças nas mãos como o mais grado baú de recordações. Entendo, que não haverá outro meio de chegarmos a Nova Iorque se não passarmos pelo Caribe. Deus haverá de pôr uma janela em cada horizonte com uma grande porta de saída. Tudo, tudo será reservado.

 

CUBA – UMA PRINCESA HAVANA

 

Não tardou com a oportunidade arrepiante no porto da cidade Havana aos seis dias de dezembro de 1835, na Illa de San Cristóbal de La Habana, como bem disse o altivo escritor, novelista e músico cubano Alejo Carpentier – “Cidade das Colunas”. Com o púbere reluzente por trás da abantesma encorajada. Meucci e esposa descem do navio sendo agraciado pelo empresário Pancho Marty que o aguardava. Com o clima tropical da cidade hasteado num grande desenvolvimento econômico e cultural das caraíbas, o casal se encontrava noutro paraíso onde o conceito e a imigração contavam nas palhetas envolvidas pelos ventos fortes na ínsula entre as ondas caribenhas.

 

O berço cultural da civilização Havana e o levante cultural das artes barrocas, balançavam nas agulhas magnéticas de cada sobrevivente pela colonização e enriquecimento. Era um propulsor de riquezas extravagantes no comércio para as Américas e o resto do mundo. Havana dividia o amanhecer e o entardecer com os raios solares inundando das águas salgadas com os beirais descarnados das praias das areias brancas. Dentre as fortalezas do império econômico e militar, a colônia era uma mina de traços em diversificados manejos de luz, tradição, fomentando a elevação aos olhos da cobiça estrangeira.

 

Continua na parte II

 

 

 

 

ERASMO SHALLKYTTON
Enviado por ERASMO SHALLKYTTON em 12/03/2023
Código do texto: T7738789
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