Ele não tinha noção de seu tamanho
Por vezes esbarrava em todos os objetos da casa como se fosse um abobado. Sentia que o ambiente era minúsculo, cubicular, porque batia o topo da cabeça no teto ao levantar-se da cama e com uma das mãos na televisão ao se espreguiçar. Contudo, o sentimento era apenas uma conjectura.
Era conjectura porque as certezas relacionadas à dimensão de seu corpo que tinha pela manhã, dentro do cubículo que era sua casa, encerravam-se quando ia para a rua ou para outros ambientes. Era assim: ao caminhar pela Avenida da Saudade, por exemplo, percebia-se bem maior que os demais. O seu ponto de vista dos outros na rua, por ele ser de maior estatura que todos aqueles que trafegavam por ali, era sempre de cima para baixo. Os outros eram formigas.
E esta imprecisão em relação ao seu tamanho, também se dava nas aproximações que tinha com edificações, automóveis, outras avenidas, praças, vielas, estabelecimentos comerciais... Era insano e o atordoava ao extremo! Porque se na Avenida da Saudade os demais eram formigas, os prédios, ao contrário, eram imensos. Se a perspectiva que tinha das pessoas era de cima para baixo, de baixo para cima era aquela que tinha das construções que de tão altas rasgavam o céu.
Ao entrar nesses prédios, via-se diante de amplos espaços constituídos de móveis que não respeitavam o bom senso da proporcionalidade: "como uma pessoa se sentará em um sofá cuja a superfície de seu assento se encontra a cinco metros do chão?".
Que esmiucemos a questão do sofá.
Porque se este móvel era para ele já imenso, o caótico, o impensado, o ridículo (talvez o fantástico!) se interpunha diante de seus olhos quando as pessoas - todas bem menores do que ele, aqui já demonstrado ao leitor - sentavam-se neste sofá zelando por este móvel. Muito provável que aqueles insetos de gente tinham construído o sofá. "Mas que esforço e que denso trabalho de engenharia!!!", indagava-se ele. "Porque não construir um móvel que seja proporcional ao seus minúsculos corpos? Eu não vejo escadas... como estas pessoas conseguem se sentar neste imenso sofá...?.
Teve, certa vez, de resolver um problema na companhia de gás da cidade. Companhia esta localizada na mesma Avenida da Saudade. Imenso era o prédio da empresa, bem como a recepção e os móveis contidos ali dentro. Minúsculas eram as pessoas. Foi convidado a entrar no gabinete do coordenador da companhia porque seria a sua vez de ser atendido. A porta de entrada para a sala do homem era um pequeno ponto preto presente em uma imensa parede de mármore branco que ficava à esquerda do balcão da recepção. Por lógica, seria impossível, com o tamanho que tinha, adentrar. Incrédulo, perguntou ao pequenino atendente:
- Mas como entrarei nesta porta? Ela é um minúsculo ponto nesta gigante parede!!! Nem você, atendente, que é muito menor do que eu, tem condições de entrar...
Arrematou o atendente:
- Como não podes entrar? Tu não sabes o tamanho que tens? Vamos! És capaz! Entre!
São José, 22 de janeiro de 2023.
Cleber Caetano Maranhão