O QUADRO NA PAREDE (Republicação)
Eugência passava pelo corredor e sempre olhava o quadro fixado na parede, ali naquele local. Para vê-lo melhor acendia a luz e ficava alguns minutos a apreciá-lo. Sorria, às vezes fazia um ar de tristeza, depois ficava bem séria. Apagava a luz e ia para a varanda onde sentava-se num extenso banco de madeira de lei e ali ficava por horas olhando o horizonte. Geralmente fazia isso nas tardes logo depois do almoço, era ainda uma mulher que firmava bem os pés no chão, apesar dos seus quase oitenta anos, mas ninguém dizia, tinha algumas atividades domésticas que costumava fazer, mesmo com uma empregada em casa. Depois que o marido morreu, há cerca de doze anos, que mudara o seu comportamento social, vivia de festas com ele, um exímio dançarino, eventos que geralmente varavam as madrugadas. Não mais saía, evitava fazer visitas ou também recebê-las, alegava indisposição. O quadro na parede lhe dava uma certa satisfação, era Eustáquio, o finado marido que lhe dera meia dúzia de filhos, todos residindo em outros lugares, um pouco distante daquela fazenda onde resolvera se estabelecer com a viuvez, achou melhor. Ali era apenas um local de lazer onde outrora nasceram seus filhos, com a saída deles fôra morar na cidade, em uma bela casa do casal. Voltou devido ao falecimento do esposo, queria reviver aqueles momentos que se passaram sem quase ela perceber.
Certa tarde Eugênia, como costumava fazer, passou pelo corredor e parou diante do quadro de Eustáquio, notou uma certa diferença no seu semblante, parecia feliz, isso a impressionou assim que acendeu a luz, não teve dúvida, acariciou ligeiramente a face dele e deu-lhe um beijo, um beijo no quadro, que nesse momento caiu ao chão e deixou rachado o vidro que protegia a foto. Ela se assustou e apanhou-o quase chorando, recolocando-o no lugar, providenciaria depois um novo vidro. Foi até a varanda, sentou-se no banco e dessa vez adormeceu com o pensamento no finado esposo. Não mais acordou, certamente estava nos braços de quem tanto amou.