Depois do Natal: Um conto para não ser lido à noite (Cap. IX - A PERSEGUIÇÃO)

Não foi exatamente uma perseguição, ao estilo dos filmes americanos.

Não tinha alta velocidade, nem sirenes ligadas, nem tiroteio, nem loucuras no volante, nem carro sobre as calçadas, atropelando pedestres, nem tiros ou estilhaços de vidraças...

Era uma velocidade normal.

Mas teve um acidente!

Trágico e fatal!

Mal deu tempo de se perceber o que estava ocorrendo!

O carro bateu no meio-fio, derrapou! Bateu no poste que caiu sobre o carro matando o homem, sentado no banco traseiro, que sentava ao lado da mulher que ficou gravemente ferida.

O motorista não ficou ferido, apenas preso entre as ferragens. O homem sentado ao lado do motorista, no banco da frente, todo ensanguentado, saiu e gritava por socorro, enquanto procurava o pedaço do seu braço decepado. O sangue esguichava pelo ferimento, inundando a rua… Ele tinha certeza que logo morreria, tanto era o sangue que esguichava de seu braço decepado!

………………………….

Como na cidade não tinha ambulância a viatura policial parou para dar assistência aos acidentados!

- Desculpa, minha senhora, é caso de urgência, responde o policial diante da irritação da mãe que se vê perdendo tempo na perseguição do raptor de seus filhos.

- Mas meus filhos raptados, também são caso de emergência!

Mas a indignação da mulher não comove o policial que aciona o rádio da viatura solicitando auxílio.

Marido e mulher, sem olhar para os acidentados, saem correndo.

- Táxi!

Ela pula na frente do carro carregando uma plaquetinha luminosa.

Freada brusca. Nem deu tempo do motorista soltar um filho da puta e o casal já estava dentro, perguntando e dando a ordem:

- Sabe onde mora o sapateiro? Leva a gente até lá!

O taxista sabia. Arrancou. Rodou. Saiu do centro. Desceu uma ladeira...

- Pare !!!!!

É o marido que dá a ordem. Reconhecera seu filho, um menino de aproximadamente 10 anos, andando sem rumo. Antes do táxi parar ele salta do carro. Cai. Machuca a mão, levanta-se e grita o nome do filho.

- Pai!!!.... – e o menino corre em direção ao pai que o abraça

- Onde está sua irmã? Ela está bem?

- Aquele homem levou a mana! Disse pra eu voltar pra casa! Disse que a mana ia ficar bem, com ele, e que eu não me preocupasse que depois ele trazia a mana pra casa. Disse que sabe onde a gente mora e depois leva a mana até lá. Mas eu não sei como ele sabe onde a gente mora se a gente não mora aqui…

O pai nem percebe a lógica do pensamento do menino. Decide-se por levar o filho de volta para o hotel.

Enquanto isso acontece, do táxi, agora parado, desce o gordo motorista, preparando-se para dar uma bronca no passageiro. Onde se viu saltar de um carro em movimento em plena avenida? E se viesse um louco e passasse por cima matando-o? Como ele ficaria diante da polícia, dos colegas taxistas?

Mas o pai não deu tempo ao motorista. Apenas deu a ordem:

- Leva a gente pra casa do sapateiro! Mas antes passa no hotel.

- Fazer o quê no hotel? - Pergunta a mãe, sem entender o raciocínio do marido, que muito mais lúcido e lógico, de forma mais racional e fria, começava a tomar a condução dos rumos dos encaminhamentos.

- O mano fica lá! Se a mana voltar antes de nós eles ficarão bem, até que nós voltemos, também!

A mulher ainda tentou argumentar, mas se calou ao ver a decisão desenhada no semblante do marido e do táxi em movimento. Acabou aceitando que o marido estava agindo corretamente

O táxi pára em frente ao hotel. Não que aquilo fosse um hotel, pleno de exuberância e luxo. Na verdade era um casarão velho, alguns quartos, exalando cheiro de mofo. As tábuas da parede, há muito tempo atrás haviam sido pintadas, mas a cor já era algo indefinido.

Essa construção antiga tinha o apelido e era o único hotel da cidade. Sobrevivia de hospedar viajantes ocasionais, pois na cidade quase nunca apreciam turistas.

Ainda assustado, mas entendendo a gravidade da situação o menino desce do táxi e dirige-se para a portaria do hotel…

(Continua na próxima semana...)

Neri de Paula Carneiro

Rolim de Moura – RO

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