Summertime
A chuva chocou-se contra o para-brisa, quando a escuridão nos envolveu. Charles acendeu os faróis e reduziu a velocidade por precaução, enquanto ao seu lado, Frank puxou um cigarro do bolso.
- Vai fumar com os vidros fechados? - Questionou Minnie, sentada à minha esquerda no banco traseiro.
- Não é uma boa ideia - assegurei.
- Vocês são umas chatas - retrucou Frank, guardando o cigarro e ligando o rádio do carro. A música instrumental foi interrompida por um boletim meteorológico: o tempo iria piorar nas próximas horas.
- O que é isso, uma tempestade tropical? - Questionou Charles.
- Parece que está virando um ciclone - avaliou Frank.
- Acha que o pai e a mãe vão ficar bem? - Perguntou Minnie, preocupada.
- É só uma tempestade - minimizou Charles. - Eles não iam sair de casa com um tempo desses.
- Quanto tempo até lá? - Indaguei.
- Antes desse dilúvio, ainda tínhamos mais umas duas horas de estrada - calculou Charles. - Mas agora, talvez seja melhor pararmos nalguma lanchonete pelo caminho e esperar a chuva diminuir.
- Marsha precisa ir ao banheiro - provocou Minnie, olhando em minha direção.
- E você precisa fazer um lanchinho - repliquei com ironia.
- Todos nós precisamos parar e fazer um lanchinho - aparteou Frank. - E eu aproveito e fumo o meu cigarro!
Meia hora depois, as luzes de um posto de gasolina surgiram numa curva da estrada. Paramos o mais próximo possível da entrada da lanchonete anexa, e corremos para dentro enquanto a chuva nos fustigava. Lá dentro, não havia mais de três clientes, e o ambiente era acolhedor, embora antiquado. Uma garçonete gorda nos entregou o cardápio, quando nos sentávamos em lados opostos de uma mesa coberta por uma toalha xadrez.
- O que vai ser? - Indagou Charles para nós.
Fechamos o pedido com três cafés, torta de maçã, hambúrguer e um milk-shake de baunilha grande - para Minnie. Enquanto aguardávamos, Frank foi até a porta dos fundos fumar um cigarro.
- Essa tempestade não está dando sinal de que vá parar tão cedo - observei.
- Melhor ficarmos aqui até termos certeza de que é seguro prosseguir - ponderou Charles.
- E eu vou ligar para o pai e a mãe - decidiu Minnie, erguendo-se.
Foi até o telefone público instalado próximo ao caixa, e voltou pouco depois, decepcionada.
- Só dá ocupado.
- Talvez algum poste tenha caído, daqui para lá - avaliou Charles. - Mas, em poucas horas estaremos lá, com eles.
- Todos juntos de novo, como quando éramos crianças - comentou Frank, voltando após ter fumado o cigarro.
A garçonete chegou com uma bandeja redonda, e começou a distribuir pratos e copos. Lá fora, a tempestade caía pesada, dentro da noite escura; pelo visto, iríamos ter tempo de sobra para jogar conversa fora, até a hora da partida. Minnie parecia amargurada.
- Essa chuva... parece que não quer cheguemos em casa.
Há muito que deixara de ser a nossa casa, mas todos sabíamos o que ela queria dizer. Charles, o irmão mais velho, ergueu as mãos.
- Ei, vamos deixar de tristeza! Estamos enxutos, abrigados, e há comida na mesa!
E pelos próximos quinze minutos, ninguém disse palavra.
- [23-02-2021]