FELIZ
Um dia o jovem teve que sair de casa.
Não tendo para onde ir foi fazer residência numa praça da região central da cidade.
Não era alcoólatra, não usava droga, nem era portador de perturbações mentais.
Nada fazia retrair sua personalidade. Apenas não conciliava com as demais opiniões dos familiares, que ele considerava extremistas. E, uma vez que não vencia a maioria, achou por bem deixar a casa.
No entanto, uma marca inata o acompanhava: era sorridente apesar dos dissabores.
Em sua residência, junto com os seus, havia muita cobrança, discórdia e nenhuma harmonia
Apesar do anonimato típico do mundo das ruas, o jovem transformou-se no mendigo Feliz.
Perguntado por que era tão airoso, esboçando sempre tanta felicidade. Respondeu que um dos principais motivos era o fato de nunca ter sido espancado.
Arranjou uma tenda onde, bem ou mal protegia-se da chuva e do frio, foi sua primeira felicidade. Catar ferro velho e vender para garantir o alimento do dia, complementava a sorte.
Nos primeiros dias de rua o estômago doeu de fome. Sentiu-se feliz quando arrecadou os primeiros quilos de material reciclável e trocou por uma quentinha.
Mais feliz quando construiu a primeira carroça, quando a carroçada rendeu três quentinhas, que o abasteceria durante o dia.
Sentiu-se mais feliz quando sua renda com a cata de material reciclável o permitiu compartilhar as quentinhas com outros mendigos.
Mas feliz mesmo ele se enxergou ao viver publicamente, livre mais que um deputado e sem ser obsceno, espoliador, não sentir ódio, nem praticá-lo, nem estimulá-lo.