LEMBRANÇAS DE ZINA (Republicação)
Mais de cincoenta anos se passaram desde a última aparição de Zina em uma peça teatral organizada pelo colégio onde estudávamos, quando professores e alunos idealizavam os eventos que eram dignos de verdadeiros profissionais, tal a importância e o conteúdo dos temas. Ela era uma garota sensacional, dava atenção a qualquer um sem discriminação, portadora de uma inteligência fora do comum, recebendo sempre notas altas nas provas que eram realizadas no meio e no final do ano. Estava sempre alegre, sorridente e eu a admirava pela sua beleza e pelo seu caráter. Tivemos um ligeiro namorico e nem cheguei a beijar sua boca, a minha grande vontade que guardei até hoje.
Eu andava sem rumo pela rua onde ficava o colégio, hoje não mais existente, quando essa lembrança me veio a mente. Parei diante do imóvel onde hoje funciona uma agência de turismo e me pus a relembrar daqueles bons tempos e a primeira coisa que me veio a cabeça foi o sorriso encantador de Zina, aquela que desempenhava diversos personagens nas encenações do nosso teatrinho, frequentado somente por pais de alunos e alguns poucos visitantes, além dos próprios alunos, entre eles eu, exclusivamente para ver Zina se apresentando, ora com longas vestimentas, ora mostrando as belas pernas de que era dona. Quanta vontade eu sentia de apalpar aquelas pernas grossas, quanto desejo eu sentia pela Zina e nem no pouquíssimo tempo que tive de namorarmos eu tive essa oportunidade. Sonhava com ela várias noites e até hoje me pergunto como foi que consegui namorá-la, mesmo por um curto espaço de tempo.
As horas passaram e eu fiquei ali naquela reflexão, pensando mais na ex-namorada do que nas peças teatrais do colégio. Já estava para ir embora quando uma senhora que ali estava me chamou a atenção. Me deu a impressão dela também estar a admirar o local onde funcionou o colégio e eu fixei o olhar nela para tentar descobrir o motivo da sua presença ali, bem perto de mim. Em determinado momento ela me olhou e ensaiou um sorriso, o que me fez retribuir com outro sorriso. Mas aquele sorriso me pareceu familiar, me fez pensar no mesmo sorriso de Zina, a amada que nunca saiu do meu pensamento. Analisei detalhadamente o seu corpo, cabelos e tudo me pareceu pertencer a Zina. Acho que é ela, pensei. Me aproximei dela e iniciei uma conversa, queria tirar essa dúvida que pairou em mim. Perguntei se estava admirando o local e ela respondeu afirmativamente. Notei que algumas lágrimas rolavam dos seus olhos que se escondiam atrás de óculos escuros. Meu coração batia com tanta velocidade que eu mal conseguia falar e quando perguntei o seu nome ela respondeu: Zina.
Acordei preocupado sem saber onde estava, um casal me oferecia um copo d’água e tentava me acalmar. Queria até chamar uma ambulância mas eu disse que estava bem e perguntei o que tinha acontecido. O senhor que era o dono da agência de turismo e a esposa dele disseram então que eu tinha passado mal e caíra na calçada, tendo eles corrido em meu socorro. Depois de alguns minutos comecei a me lembrar que estava ali na frente, diante do prédio onde funcionou o colégio onde estudei. Veio então a lembrança daquela senhora que estava do meu lado, ou seja, a Zina, conforme ela me confirmou. Quando ela pronunciou esse doce nome eu senti uma emoção muito forte e aí tudo apagou. Uma coisa interessante que me chamou a atenção foi uma pequena placa que eu segurava firme, era metálica e tinha nela uma inscrição que dizia: “Saudades eternas de Ambrosina Soares Guedes”. Guardei aquela pequena placa e perguntei pela pessoa que estava do meu lado lá fora e o casal simplesmente me falou que não havia ninguém comigo.
Dias depois eu identifiquei a placa. Ela pertencia a um túmulo do cemitério local, onde decidi ir e devolver a mesma. A tristeza invadiu meu coração, principalmente quando adentrei o campo santo e localizei o túmulo onde estava sepultado o corpo da minha querida e inesquecível amiga e ex-namorada, assim eu considerava, mesmo sendo um namoro de poucos dias. Nunca imaginei que minha vida pudesse ter um desfecho desse. Ambrosina era o nome real daquela que nos encantava com suas apresentações teatrais, a Zina, que havia falecido há dois anos.
(Esta obra é pura imaginação do autor. Qualquer semelhança com algum fato real terá sido mera coincidência)