VIDAS ENTRELAÇADAS (Parte 2)

   A tarde estava ensolarada, o vento quente incomodava Leo, deitado em uma rede na varanda observava o horizonte com olhar triste. O antigo casarão estava praticamente abandonado, ele ali estava por gostar desse imóvel, ali nascera, crescera e agora tinha que desocupá-lo, tinha sido indenizado porque por ali passaria uma linha ferroviária, era o progresso chegando naquele local, em pouco tempo os trens transportariam milhares de passageiros aumentando o percurso até a cidade grande. Saiu da rede e foi até o quarto, pegaria algumas coisas que ali ainda estavam, mas nesse momento veio a lembrança da vida passada, da esposa que se despediu dele sem sequer lhe dar um abraço. "Ana, onde está você?" - gritou alto naquele ambiente deserto. Na parede um calendário fez ele entender que estava no ano de 1820, ficou abismado, pois as lembranças se misturavam, ele já não sabia quem era. Chorou desesperadamente, quiz saber o que estava acontecendo com sua vida e o porquê de todo esse sofrimento. Ninguém poderia lhe dar alguma resposta e consciente da nova situação apanhou seus pertences e os colocou numa bolsa que ali se encontrava tratando de ir embora o mais rápido possível, pois o pessoal da companhia ferroviária logo chegaria para demolir tudo.

   Chegou na nova residência que fôra comprada com o dinheiro da indenização, novamente suas lembranças o atormentaram, lá estava Ana esperando pelo seu abraço. Leo não sabia se ria ou se chorava e perguntou por que ela o tinha abandonado. A mulher não soube lhe responder, apenas o abraçou carinhosamente e ele aproveitou esse momento especial para sentir novamente aquele corpo junto ao seu. Ela lhe disse que precisava descansar, que estava tendo alucinações. O seu filho Augusto surgiu vindo do quarto e o abraçou, perguntou por que demorou tanto para chegar.

   Já tendo ficado em paz e consciente de que essa era sua nova vida, Leo prosseguiu com seu trabalho como gerente de uma loja de produtos diversos, mas as lembranças estavam vivas em sua mente, achava que estava pagando por algum erro cometido. Ana chegou para lhe dar apoio na loja, trabalhava junto com ele. Beijou-o levemente e seguiu para o escritório onde ficava por um bom tempo tratando da parte financeira. Leo acompanhou seus passos, como admirava essa mulher tão carinhosa e dedicada, como a amava, ficaria desesperado se a perdesse. Foi até o escritório para vê-la por mais uns minutos antes de ir para o seu trabalho que ficava em outra parte do prédio. Observou-a por alguns minutos e saiu, se deu por satisfeito.

   Em casa, no aconchego do seu novo lar, Leo e Ana conversavam animadamente, o filho Augusto estava sentado no sofá da sala enquanto eles se abraçavam no terraço, ele tinha uma certa dúvida com relação a essa sua vida, imaginava sobre sua vida passada, no futuro, estando agora no ano de 1820 e tendo que acreditar que era isso mesmo, falava sobre esse assunto para a esposa mas ela apenas ria e disfarçava para não magoá-lo. Leo não desgrudava da esposa, se pudesse ficaria abraçado a ela todo o tempo por temer ficar sem essa reciprocidade amorosa, era o seu maior medo, até na hora de dormir tinha que ficar bem agarradinho ao seu corpo.

   Na manhã de um dia chuvoso Leo saiu mais cedo, pois precisava receber uma mercadoria nova cuja procedência era de outro país, era uma novidade a ser oferecida aos clientes que já aguardavam por essa inovação. Entrou na caminhonete e ligou o motor, acionou o limpador do para-brisa para ver melhor o caminho, a chuva estava forte, mas ele não poderia se atrasar. Molhou-se um pouco até entrar no automóvel, da janela Ana acenou para ele, aquele aceno o perturbou profundamente, não sabe por que mas teve a clara impressão de que iria perdê-la. Sua visão ficou turva e ele se projetou sobre o volante, não viu mais nada.

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(Aguarde a parte 3 deste conto que será publicada em breve)

Moacir Rodrigues
Enviado por Moacir Rodrigues em 05/10/2019
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