A CHAVE

   Saí do escritório por volta das 17 horas, estava tranqüilo quanto uma flor sendo acariciada por um beija-flor, nada me incomodava, tinha cumprido minha tarefa diária com a perfeição de sempre. Percorri duas quadras até chegar ao ponto do ônibus, mas antes que lá chegasse cruzei com uma pessoa que me chamou muito a atenção, quase não a reconheci, mas ela veio em minha direção e me cumprimentou. Imediatamente cheguei a conclusão de quem se tratava, era Leila, uma antiga colega de escola, fazia anos que não a via. Tentei abraçá-la, mas ela evitou alegando que estava suada e não queria que eu me incomodasse com isso. Fiquei "meio assim" mas compreendi a sua preocupação. Conversamos por pouco tempo, o suficiente para ela me entregar uma chave e me pedir para que entregasse em sua casa, temia chegar um pouco tarde, pois havia esquecido de lá deixar e sua mãe precisava muito dela. Era como uma garantia da minha presença lá, isso me deixou curioso mas aceitei numa boa. Me deu o endereço dizendo que depois nos veríamos e lá agradeceria mais uma vez.

Cheguei em casa, tomei meu banho, jantei e em seguida tratei de ir até o endereço de Leila, precisava muito conversar com ela e relembrar os tempos de escola, os trabalhos que fazíamos em conjunto e as brincadeiras de jovens em sala de aula. Era muito divertido aquele tempo, lembrei das horas de aulas vagas quando saíamos para a sorveteria ou para a lanchonete da esquina para um lanche em companhia de outros colegas. Leila era como uma líder, estava sempre a frente das ações, das tomadas de decisões no tocante aos trabalhos escolares em grupo, tinha sempre uma saída para qualquer tipo de problema que porventura surgisse, motivo de ser elogiada por todos.

Apressei os passos, estava ansioso para vê-la com mais tranquilidade, não via a hora de nos encontrarmos. Afinal cheguei no endereço que me foi dado, ficava perto de onde eu morava, algumas quadras apenas, ela tão perto de mim e eu sem ter ideia disso. Fiquei impressionado com o que vi, muita gente na residência e algumas pessoas chorando, uma cena que de certa forma me comoveu. Procurei me identificar e informar sobre a minha presença ali, perguntei por Leila e quase caí de costas com a resposta: na sala encontrava-se o corpo dela em um caixão, me arrepiei e fui até ele para me certificar dessa triste realidade. Ali estava ela, aquele mesmo rosto, o mesmo semblante de quando nos vimos nessa tarde que findou fazia poucas horas. Chorei emocionado, não esperava essa situação inusitada, toda a minha alegria havia desaparecido e um clima de desespero tomou conta de mim.

Após alguns minutos olhando aquele rosto suave a mãe dela me procurou e durante a conversa falou sobre um documento que precisa muito e que se encontrava em um cofre cuja chave estava na bolsa de Leila quando ela sofreu o acidente na estrada quando voltava da faculdade, seu carro foi abalroado por outro violentamente lhe causando a morte no local. A chave, porém, não se encontrava na bolsa, simplesmente havia sumido. Nesse momento me lembrei da chave que ela deixara em meu poder, mais uma vez meu corpo foi acometido de um arrepio. Entreguei a chave para a mãe de Leila e nesse momento percebi um leve sorriso em seus lábios.

A noite foi de muita tristeza para mim, durante o velório alguns antigos amigos apareceram e no dia seguinte seu corpo foi sepultado no cemitério da cidade.

Moacir Rodrigues
Enviado por Moacir Rodrigues em 25/09/2019
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