SOMBRA E SELF

... e os homens sugaram do seio da Terra.

Era Adão, era Eva. Até então não havia serpente, até então nada de seres desconhecidos. Nada além do Jardim, nada que fosse muito depois das águas, dos vales, das montanhas. Até pouco tempo se reconheciam nas estrelas; sabiam quem eram quando olhavam na espuma de um riacho, ao dividir a água nas mãos fechadas em concha. Ali era a Lagoa Azul; equilíbrio perfeito. Yin e yang; não, seria fácil demais. Talvez não, a palavra mais certa era fusão. Difusão, sem confusão. Será fácil, porque cada um tem um pouco do Outro dentro de Si. Um pouco de Si dentro do Outro. Até então falavam como um espelho, face a face, como eram conhecidos.

Não conhecendo o dinheiro, eram poderosos; não havia corrupção. Apenas as árvores, que floriam; entre elas, os cipós onde se penduravam, redes para brincar e dormir. Lá, no fim do mundo; tão fim que se assemelhava ao começo. Antes, ali o poder vinha do leite e mel; as delícias que manavam dos morros e preenchiam os vales. Eram sábios, sem conhecer a Filosofia; antes conheciam a Natureza, sabiam de cada criatura, que nomeavam. Admiravam.

Então veio a Serpente, vieram os Anjos Caídos. Vieram os fantasmas, os dragões, as perdições; primeiramente, veio a Dúvida. Ah, mas como você pode saber, se nunca experimentou? Mas como você pode achar que está correto, se nunca tentou? Oh, Darling, eu penso com minha própria cabeça... Em seguida, vieram a Vaidade e a Descrença. Como podes abandonar-me, aqui, onde será teu Paraíso?

A Queda foi grande. A Estrela despencou contra as Águas e se despedaçou... E os Homens se fizeram vítimas, fracos como crianças; no entanto perderam a inocência em frente ao reflexo. Pouco mais se tornaram que retalhos coloridos de Utopias. Amores desperdiçados, desejos e frustração, tudo o que frustra é um desafio, mas o sabor do vinho nos lábios se desvanece ao primeiro gole, o alimento vira cinza e os dias enfado.

Perdemo-nos em frutos proibidos. Ganhamos a morte e a dor em meio às estradas, as bromélias passaram a ser flores carnívoras, as redes de dormir se converteram em damas de ferro, lanças afiadas prontas a talhar a carne dos desavisados e tolos.

E lá foram os Homens, os Filhos do Paraíso, tentando conquistar os mares além do horizonte, foram perder-se entre as curvas do Sol Nascente e das Índias, além do Arco-Íris. Lá onde apenas se encontra portos enferrujados e baías poluídas. Ali, onde as especiarias nunca satisfazem, o ouro acaba e o sangue se espalha sobre as cidades, rios de asfalto empurrando o tráfego de cadáveres decaídos, só não sabem para onde vão. Porque se busca fora de si o que se deveria buscar por dentro, que se perdeu porque sempre se busca longe, meu bem, Oh My, não consegue ver? que a sabedoria não mora na esquerda ou direita, o conhecimento não está na terraplana ou em Newton... Antes, mora neste desconhecido, ser que todos sabem quem é mas nunca procuram, pois está no lugar mais distante, sim, está no Outro, que está em Si mesmo.

Somos Sombra e Self. Nunca deixamos de ser.