O coveiro
Eu estou aqui, para sempre, mas não reclamo, é meu lugar não tenho pra onde ir,
A vida pareceu passar rápido, não foi como o padre disse, estou sozinho em meu cemitério.
A noite cavo túmulos, muitos sem nomes, aqueles que caem do céu não tem nome,
A noite é fria e solitária, minha Pá é minha amiga.
Estamos sozinhos no escuro, muitas coisa passam por aqui.
Minha vida é esta aqui, não sei quando começou, apenas estou aqui, é uma praga em minha miserável vida.
Todo sujo de terra olho através de portão do cemitério, e vejo pessoas felizes e eu aqui enterrando suas famílias...
Em meio há mais uma noite triste, a vejo caminhar como uma garota perdida, devo ajuda-la, pois aqui é um lugar de muitas almas perversas.
A vejo ali, toda simpática, talvez sem saber que esta morta, sim isso acontece por aqui.
Tudo mudou, sinto prazer em vagar a noite com fantasmas e demônios, perversos, perdidos para sempre aqui comigo.
Toda noite eu caminho por ai, escutando a raiva dos outros ou a tristeza, agora escuto meu coração podre que diz para ir vê-la.
Aqui estou como um coveiro triste, mas com ela sou feliz...
Sempre cavei covas, não sei por que, enterro pessoas, as vezes vivas...mas não questiono, eu só enterro.
No meio da noite ela vem, como ela é linda, como um coveiro eu tenho chance, ai lembro que ela esta morta, conversamos por horas. Tento explicar a situação dela.
Ela toda carinhosa diz que sou um cara legal, mas eu sei onde isso vai dar.
Eu sou o coveiro, sem casa, que mora no cemitério, todo sujo de terra. Sem dinheiro.
Eu não entendo o que ela viu em mim, estou aqui a anos e o fantasma de uma bela garota diz gostar de mim, me sinto bem. Ninguém disse isso antes...
As noites passam e ela esta aqui, toda fria, mas não ligo. Meu amor vai alem da sepultura. Nunca vi ela viva, talvez ela nunca gostasse de mim.
Não sei como explicar, mas há amo, pode me chamar de tolo ou louco não me importo, estou bem, aqui nas terras da morte, solitário ninguém sabe meu nome.
Ela vem de sua sepultura para mim, o frio daqui pode matar mas estamos juntos, eu adoro isso não sou mais um esquisito sozinho.
A guerra trouxe muitos cadáveres furiosos. Devo segura-los aqui. É triste eu sei, mas é meu trabalho. Eles querem suas famílias que já estão dormindo com o inimigo. Tudo é triste e eu odeio. Queria uma noite de paz com minha paquera, queria poder conversar mais com ela.
Ela se sente mau por aqueles que não sabem para onde ir, mas nem ela sabe.
Em meu momento egoísta espero que nunca ache, sou um monstro...
Ela esta aqui há tanto tempo, se tornou parte desse velho cemitério. Caminhamos juntos pelas covas de mão dadas, eu não ligo de ela estar morta, ela não sabe onde esta.
Me sinto mau por ela, mas não quero ficar sozinho ela precisa saber sobre sua morte. É engraçado quando se esta aqui sozinho e conhece uma ótima garota, e tem que deixa-la ir além do escuro do cemitério.
Ela entrou em choque quando mostrei sua cova, foi com muita tristeza que fiz isso, ela não merecia isso.
Então ela despertou, caiu na real como vocês dizem, agora ela irá embora para sempre.
Ao menos ela sabe quem é.
Uma luz aparece no cemitério, sinto que ela irá embora mas não posso impedi-la, não seria justo, sou um coveiro, não um monstro.
No meio de muitas covas eu estou olhando ela ir, ela me olha e me da um beijo, diz “obrigada por cuidar de mim”.
Eu acho tudo muito lindo, mas só eu sei como é viver em um cemitério, é triste como já disse.
Talvez seja meu destino ficar sozinho, ela encontrou a luz eu não, deixei ela ir por que amava ela, estou sozinho aqui sujo de terra, minhas lagrimas caem no tumulo dela, ainda bem que ela conseguiu sair daqui.
Então tudo volta ao normal, eu e minhas covas, os olhares dos mortos, sua luta para não ser enterrado, todos lutam, todos deixaram coisas para traz, ninguém quer morrer.
Eu cavo varias covas, pensando nela, aquela garota que me deu luz onde meus olhos só viam escuro.
Continuo aqui cavando, enterrando, pelo menos uma vez na vida vi o amor, estou contente por isso, continuo aqui com minhas covas...
Cristiano Siqueira 24/07/16