PIJAMA LISTRADO
PIJAMA LISTRADO
(Conto de Carlos Freitas)
Quando vi à minha frente no meio da rua, aquela dantesca e depressiva cena, epílogo de uma tragédia que há instantes se consumara, fui dominado por sentimentos de revolta e desalento. Era quase final de tarde. Perguntei-me: - Será que o desvairado indivíduo que cometera tal atrocidade, não tivera tempo para evitá-la freando o veiculo? Talvez sim! Mas, os homens do século XXI, escravos do trabalho, das rotinas, das neuroses, das frustrações, das obsessões, das pressões dos filhos, da mulher, da família, obcecados pelo controle remoto, pelo “AIPÉDe... Socorro!”, pelo celular e, materialistas - são homens frios, à beira de um infarto, de um ataque de nervos ou cardíaco! Às vezes, peregrinos – sem metas ou horizontes. Outras vezes, perdulários por opção – sem juízo, omissos e negligentes.
Destituídos de razão e sensibilidade, desapegados da espiritualidade e da compaixão, vivem quais bestas irracionais. Concretizam, promovem e incitam atos impensados de crueldade, selvageria ou mesquinharias, sem sentir um mínimo de comiseração, ou, conflitos com suas consciências. Percebem o que perpetraram, somente quando impõem a si, segundos de reflexão e introspecção, permitindo-os retornar temporariamente às faculdades mentais de um ser, dito racional. Via- de- regra, nesses exíguos segundos, consciências recobradas, são possuídos pela dor da culpa. Viverão então, momentos de profunda instabilidade, depressão e ostracismo.
... Meus pensamentos viram-se invadidos por flashes imaginários, onde ficção, fantasia e realidade se engalfinhavam numa confusa, avassaladora e inglória batalha. A vítima indefesa fora esmagada impiedosamente pelo veiculo assassino, ou melhor: arma assassina! Restara apenas o manto natural das vestes, a cobrir o que antes, era um ser – agora sem vida – diante dos meus olhos incrédulos e lacrimejantes. E, foi exatamente isso que despertou minha atenção – suas vestes!
Extrovertidas permitiam pensar que ele estaria indo para um baile de fantasias, onde certamente encontraria outros iguais. Seria uma tarde de arromba na troca de: saudáveis energias positivas, júbilo e descontração.
Delírios meus! Poderia não ser nada disso! - Quem sabe, não seria o seu jeito debochado e despojado de se vestir, ou, o seu traje de rotina? A mistura de cores vivas, talvez tivesse a magia de propiciar-lhe independência e arrebatamento, fazendo-o ignorar comentários desairosos que por acaso ouvisse. Pouco se lixava para eles - era o seu estilo! Não devia satisfação, a quem quer que fosse. Sem querer ser grosseiro, diria ele: que fossem todos... Às putas que os pariram!
Outra possibilidade era: aquele indivíduo poderia ser um fugitivo da lei. As listras zebradas da vestimenta, também assim me permitiam deduzir. Incontáveis vezes já ás vira em filmes!
Hipóteses, conjecturas, suposições, ilações... Nada mais que isso.
Desgraçadamente, jamais saberei quem foi esse ser inanimado aos meus pés, trajando um elegante pijama listrado em preto, vermelho e branco, inexoravelmente grudado ao que restara do seu corpo. - Seria ele um fervoroso e recluso flamenguista, com uma listra branca no pijama a dissimulá-lo?
– Seu sexo? Solteiro? Casado? Desquitado? Viúvo? Filhos? - Quem saberá?
Tinha comigo uma única e absoluta certeza: O que, revoltado, via inerte à minha frente, nada mais era que os restos mortais de uma enorme, tétrica, assustadora, zebrada e horrenda... TATURANA! Que sua alma descanse em Paz!
NA: Não é mera ficção a taturana e a cena. A história? - obra da imaginação!