O Guardião dos Sonhos
 
¨Tenho em mim todos os sonhos do mundo.¨
(Fernando Pessoa)
 
            Sou eu o Guardador dos Sonhos do Mundo.
            Nesta minha função, nesta imensa torre que sou em mim mesmo, guardo todos os sonhos de todos os homens de todas as eras.
            Subo pelos meus calabouços e os divido em salas, alas e grupos.
            São de dois tipos principais: os bons e ruins.
            A partir dali coloco-os nas prateleiras pelos nomes dos donos, mas tenho um catálogo dos sonhos medrosos, daqueles com a morte, com vários temas, desde sonhos com barcos, animais, plantas, estrelas, celebridades, deuses e demônios.
            São todos catalogados a seguir por ordem alfabética.
            O interessante é que posso pensar em uma pessoa e, diante de uma mesa na qual me assento, vêm todos os sonhos que quero de cada pessoa ou tema.
            Minha função é interessante e não necessito de supervisão.
            Vivo assim há milênios e de alguns sonhadores gosto muito, pois são pessoas altamente criativas. Sei dos sonhos dos poetas, dos músicos e escritores. Sei que muitas obras famosas deles originaram-se e vivo a contemplá-las.
            Quando alguém para de sonhar sei que se aproxima a sua morte. Não tenho os sonhos dos mortos, pois esse não mais sonham.
            Naquele dia, como há milênios não ocorria, veio a mim o meu Superior.
            - A partir desta noite não haverá mais sonhos a guardar. Dar-te-ei nova função.
            - E quanto à Torre dos Sonhos? – Perguntei-lhe.
            - Desparecerá para sempre...
            Naquele último dia, fiquei contemplando o sonho de uma criança que via o mundo todo como se fosse de algodão doce. Quando soou a hora final, todos os sonhos sumiram, toda a Torre fora engolida por uma enorme espiral de luz vindo a habitar o nada de onde surgiram. Segui o aceno do meu Superior indo para uma nova função, não tão encantadora, mas é o preço que se paga por ser eterno...