Câmbio

Mãos lisas, pele branca, altura mediana, corpo esbelto, cabelos negros lisos e escuros contrastam com os olhos azulados, entre as mãos uma bandeja com pães e queijos. Essa jovem sou eu! Em outros tempos, em outra época, em um corpo diferente. Uso umas vestimentas ralas de lã e algodão em tom claro com detalhes em douração que cobrem meu corpo inteiro. Posso sentir a delicadeza desse tecido roçarem meus mamilos. Olho meu reflexo na bandeja de prata polida e tenho uma expressão muito jovem, no máximo 13 anos.

Olho ao redor, um medo tenebroso congela a espinha dorsal, não sei o motivo de estar nesse lugar! É um lugar ao qual jamais meus olhos viram, muitos tons de vermelho e douração. Uma música toca ao fundo, uma melodia doce que meus ouvidos nunca ouviram antes. Sigo a direção da música e ao puxar uma cortina que vem desde o teto até o chão me deparo com um salão cheio de moças e rapazes. As moças seminuas enquanto servem bebidas aos rapazes presentes. Que as cobiçam como se fossem lobos espreitando as ovelhas. É quando me dou conta de onde realmente estou. Mas porque estou aqui? Porque estou com essa vestimenta? O que sou? Preciso sair daqui!

Ao tentar retornar de onde tinha vindo me deparo com um homem de aproximadamente 50 anos que toca meu braço. Abaixo a cabeça em sinal de submissão, quando ele eleva meu queixo e retira os cabelos compridos que estão caídos sobre a bata que estou usando. Um desespero começa a tomar conta do meu corpo, ele agora estará admirando o que eu estava tentando esconder por trás dos cabelos. Neste momento deixo a bandeja cair, sujando aquele lindo tapete felpudo em tom de vermelho sangue. É quando o vejo se distanciando. De repente sinto uma dor terrível, algo me atingiu, me machucou, sou jogada com violência ao chão por uma mulher gorda, loira, olhos azuis feito hortências, mais com uma expressão diabólica. Quando tento levantar, mais uma vez sou atingida. Meu sangue derramou e enodou aquele tecido fino.

Estou no chão sangrando, lanhada e não sei a razão. Mas dói, dói muito! Fico no chão gemendo de dor, quando essa mesma mulher me agarra e me arrasta pelos cabelos. Está me dizendo algo, mas não consigo entender. Ela fala diferente, algumas coisas em português e outras em outra língua, acho que é polonês. Ela me entrega nas mãos de dois homens altos e fortes, tento correr mais é em vão. Eles me arrastaram para fora daquele ambiente e pela primeira vez consigo ver luz natural. Já está quase anoitecendo, o sol está se pondo. Quando um dos homens amarra minhas mãos para trás e segura firmemente meu pescoço e a enfia com violência dentro de um barril transbordando de água, sinto uma sensação de agonia e desespero, prendo a respiração o máximo que posso. Depois de um tempo o que era agonia passa a ser uma tranquilidade inebriante, acho que assim deve ser a morte depois disso não me lembro de nada, devo ter perdido a consciência.

Estou agora em um quarto fedido, escuro e úmido. Posso até ouvir o chiado dos ratos. Apesar de não haver luz, tateei as paredes em busca de uma fresta e para ter noção do tamanho. É pequeno!

Sinto frio, minhas pernas não obedecem mais o comando. Minhas feridas doem! Ouço passos vindo na direção da porta. O ferrolho foi destrancado! É ela a loira diabólica. Levantei mais que depressa, e ela aparentemente estava mais calma. Jogou uma outra bata dessa vez mais simples, feita de estupilha e cheirava a sabão de côco. Entendi alguma coisa que ela falava e pediu que fosse junto com ela. Tive os olhos vedados e fui guiada por um longo caminho. Ao retirarem a vedação minha pupila demorou um pouco para se adaptar, mais eu estava em uma sala, metodicamente arrumada. Os móveis eram lindos tinham muitos adornos, a madeira era escura. Atrás de uma mesa feita com madeira maciça tinha uma mini biblioteca com os livros todos enfileirados, mais não guardavam nenhuma poeira. Permaneci em pé, enquanto ela sentou-se atrás daquela mesa e revirou uns papéis. Abriu uma das gavetas com uma chave que sempre carregava no pescoço. Puxou um papel e pediu que eu lê-se.

Eu sei ler. Mas a menina do corpo em que eu estava não sabia. É como se eu olhasse por outra lente, por outra objetiva. As letras juntadas escritas uniformemente não faziam sentido. Entreguei o papel a ela e baixei a cabeça como sinal de negativo, ela entendeu que eu não sabia ler, pediu que uma das moças que estavam no salão que lessem para mim.

Não podia acreditar no que estava escrito ali. Fui negociada pelo meu próprio pai em troca de terras e alguns gados. Eu possuía um valor muito alto, pelo fato de ter a pele branca e ser virgem. Tudo começou a fazer sentido, a loira naquele fim de tarde estava negociando a minha virgindade com os fazendeiros e banqueiros locais.

Mas uma vez ela entregou-me uma bata transparente dessa vez toda branca e pediu que me arrumasse, pois já estava quase na hora do leilão começar. Fui guiada até um quarto próximo a sala dela, e as mulheres que estavam naquela noite no salão começaram a me pentear, me perfumar, puseram em mim pó de arroz, um batom levemente avermelhado. Quando levantei olhei-me no espelho, gostei da imagem refletida, mas logo me bateu um desespero horrível, pois estava presa naquele local e não saberia como fugir dali.

A noite começou e fiquei presa nesse quarto onde fui preparada. Estava sentada de costas para a porta quando ouvi a porta ser destrancada, virei-me rapidamente e me deparei com um homem alto e viril na porta do quarto, ele era bem jovem tinha os cabelos presos na brilhantina, a calça caqui tinha vinco, os sapatos pretos davam contraste com a blusa de punho branca. Vi uma aliança em seu dedo. A idade não deveria passar dos 30 anos. Ali estava eu sendo mais uma vez negociada como mercadoria.

Ele foi instruído a deixar a porta fechada para que dessa forma eu não pudesse fugir. Mas o quarto onde eu estava tinha pouca iluminação e pedi que se possível ele deixasse a porta entre aberta pois eu tinha muito medo do escuro. E foi dessa forma que sai correndo, virei a direita, corri sem olhar para trás, desci uns três lances de escadas e me deparei com um cenário oposto do que se tinha lá em cima. Um labirinto de quartinhos de madeira, fechados por cortinas velhas e empoeiradas. Um verdadeiro cortiço. Mulheres gemendo, fingindo prazer extremo. E eu só querendo sair daquele lugar a qual eu não pertencia. Ali funcionava um prostíbulo de baixa categoria, era uma entrada diferente da entrada do salão principal. Clientes daquele local não poderiam ter contato com moças do salão principal. E seria por ali que eu fugiria. Avistei uma luz que parecia ser a porta da rua... Foi quando.... Acordei!

Esse sonho foi tão real que precisei passar pro ‘’papel’’.

Yana B
Enviado por Yana B em 14/02/2015
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