"VIDA LONGA!"

O início da reunião estava marcado para as dez horas da manhã. Era uma terça-feira do mês de agosto e a mesa redonda, com espesso tampo de vidro, estava guarnecida com uma toalha de feltro verde com detalhes bordados em fio dourado. Ao centro, uma espécie de ânfora, também dourada, adornada com figuras de dragões alados. Ao redor, doze cadeiras já ocupadas e uma, ainda, aguardando o participante que parecia ser a mais importante figura do grupo.

A sala fazia parte de um complexo de dependências em que se tratava de altas operações financeiras e ficava em um prédio destacado em Wall Street, uma das ruas mais movimentadas de Manhattan.

As pessoas, todas importantes, mas desconhecidas do público em geral, em especial da imprensa, aguardavam em silencioso respeito a chegada do anfitrião e das resoluções que trazia para o conhecimento e futuras ações...

As dez horas, em ponto, a maçaneta da porta fez ouvir o ruído metálico do mecanismo liberando as partes da tranca e dando entrada ao dirigente daquela reunião. Não era o mandatário-mor. Todavia, um lugar-tenente que comparecia sempre em nome do seu superior, apenas conhecido pelo honorífico título de “O Absoluto”.

Por mais importantes que fossem os componentes da mesa, nenhum conhecia ou ouvira falar da identidade do seu dirigente e, nem mesmo potentados do mundo o conheciam. Sempre que a ele se referiam ou recebiam informações, planos de ação ou decisões, o cognome “O Absoluto” era a única referência.

Como o próprio nome deixava transparecer, ninguém estava acima da sua autoridade e, portanto, nada que dele viesse poderia, sequer, ser ponderado. Nenhum dos importantes figurões que faziam parte da “Estrutura” tinha a ousadia de redarguir ou questionar seus desígnios. A subserviência respeitosa era de tal monta que a cadeia de comando não permitia retorno de qualquer espécie.

Essa personagem, deveras intrigante jamais se dera a mostrar a um outro membro da Estrutura. Até mesmo seu intermediário diante da organização nunca tivera a oportunidade de encará-lo, frente a frente. Nem mesmo sob a proteção de uma máscara, sequer um esgar fisionômico deixara escapar. As orientações eram transmitidas através de uma tela de televisor localizada em uma dependência secreta, somente conhecida pelo “Canal”.

O mesmo acontecia quando os membros da reunião, em seus respectivos campos de atuação repercutiam as instruções recebidas. Os subalternos apenas tratavam de cumprir os desígnios e o mais indevassável silêncio reinava entre eles, depois de cumpridas as suas participações no fluxo das instruções.

Embora o lugar-tenente do “Absoluto” fosse o responsável pelo contato com aqueles importantes membros da “Estrutura”, também sua identidade era completamente desconhecida. Os subalternos apenas sabiam que deveriam chamá-lo, quando estritamente, necessário de “O Canal”, aquele que intermedeia os contatos de cima para baixo, na primeira linha.

Sobre a mesa, e em frente ao lugar ocupado pelo “Canal”, destacava-se uma escultura de ouro, figurando um caduceu alado. Esse era o símbolo que identificava o poder do “Absoluto” e sua configuração traduzia a síntese do seu poder:

Um gládio alado voltado para cima, envolto em duas serpentes, cada qual dotada de um par de asas. O gládio representando um falo ereto referia-se ao poder sobre a criação, sobre a vida e sobre a morte. As duas serpentes, envolvendo o falo ereto, diziam respeito ao DNA e tratavam da absoluta sabedoria sobre as leis que regem o Universo, o total conhecimento sobre a geração a extinção da vida, tal qual a Energia Kundalini, ascensionando, enroscada, na coluna vertebral...

Sem dúvida, naquela obra de arte estavam sintetizados os caminhos que levam ao entendimento do dístico, que diz respeito aos “mistérios existentes entre o céu e a terra”.

Depois de algum silêncio e, observando as feições de cada participante, O Canal, munindo-se do caduceu, com três batidas da base, em um cepo de madeira negra, faz soar o sinal de que estava aberta a reunião.

Em seguida, fazendo um gesto secreto com a mão esquerda, observa a resposta dos demais, cada qual com uma configuração diferente, igualmente, gesticulando com a mão esquerda.

A cada membro da Estrutura correspondia uma posição diferente dos dedos da mão esquerda e um outro gesto igual para todos, com os dedos da mão direita. Com esse sinal secreto, somente conhecido pelos membros pertencentes ao alto escalão, era confirmada a veracidade da posição de cada qual na “Estrutura”.

Dando mais dois golpes com a base do caduceu, no cepo de madeira, disse o “O Canal”:

“Senhores! Falo em nome do “Absoluto”! A partir de agora estamos entrando na penúltima fase do projeto da Estrutura! Assim, cada um dos senhores receberá uma chave e uma senha alfanumérica, com o que poderão ter acesso às instruções que devem ser colocadas em prática, a partir das dezoito horas da próxima segunda-feira.

A cada um dos senhores competirá uma operação isolada que não será conhecida pelos demais. No entanto, o conjunto das ações, após realizado irá configurar o alcance do objetivo proposto. Lembro que não serão admitidas falhas, sejam elas de que abrangência forem! “O Absoluto” somente admite um desfecho! O planejado!

O grande dilema por que passa a sobrevivência da Estrutura, juntamente com a da nossa espécie, no planeta, está nas consequências catastróficas da proliferação sem controle! São mais de sete bilhões de habitantes procriando, em progressão geométrica, demandando um esforço hercúleo dos mecanismos de produção e, igualmente, do aparelhamento de controle para ser mantido!

As projeções para um futuro próximo são desastrosas e consideramos que a própria espécie esteja em vias de colapso e destruição com o controle se esvaindo das nossas rédeas!

Em síntese, as alterações ambientais e as agressões para garantir a existência das populações de superfície, de há muito, vem causando graves fenômenos de ordem meteorológica, telúrica, hídrica, adensamento urbano, etc... e os recursos planetários, avidamente tragados pela tecnologia de produção, estão exaurindo as reservas de maneira vertiginosa. Isso compromete, até mesmo, a nossa segurança!

Com esse quadro, as instâncias superiores estão, em compasso de espera, aguardando as providências que os senhores tratarão de executar para efetuarmos o saneamento global, numa urgente e necessária despopulação mundial!

Cada um dos senhores tem como área de influência um manancial de recursos para que esse objetivo seja alcançado a médio prazo. Não desfilarei aqui quais sejam eles, pois os senhores irão ser inteirados das disposições ao contatarem com as instruções a que terão acesso. As chaves e as senhas que acabam de receber lhes mostrarão o que devem fazer...

Digo-lhes, apenas, que cada chave além das instruções, lhes dará a conhecer o país e as áreas sociais, militares, econômicas, políticas, sanitárias, financeiras, midiáticas, de segurança e abastecimento em que deverão atuar fazendo com que os meios disponíveis sejam acionados em direção ao fim planejado. O planeta precisa manter, apenas, um terço da população atual. Além disso, perderemos o controle sobre o orbe!

Finalmente lhes adianto que a gestão mundial não poderá manter o controle sobre as populações se houver falência desses mecanismos de sustentação que, até agora vem permitindo um certo equilíbrio entre as necessidades e as disponibilidades. Assim, como já foram instruídos, se houver a mínima falha, não haverá condescendência do “Absoluto” e o responsável retornará, como traidor execrado ao planeta de origem...

Cabe a cada um dos senhores desfechar, a partir do seu campo de atuação, as medidas para que as estatísticas globais iniciem a indicação de que, concretamente, estão sendo efetivadas as providências para a redução populacional planetária.

Se não agirmos dentro da cronologia esperada, as massas populacionais entrarão em estado de barbárie de tal monta que não teremos meios efetivos de repressão. Isto quer dizer que iremos perder o controle e a nossa própria sobrevivência ficará inexoravelmente ameaçada. Correremos riscos de desaparecer juntamente com as hordas de assaltantes, saqueadores, assassinos, usurpadores, etc... etc...

Não haverá como garantir comida, abrigo, segurança ou qualquer tipo de instituição que seja capaz de conter a massas ensandecidas e famintas... Alem disso, não ficaremos imunes aos efeitos da desproporcional radiação disseminada...

De qualquer modo, para que a Estrutura sobreviva, as hordas excedentes precisam desaparecer. Tão logo isso aconteça, estabeleceremos novas condições e, então, estaremos no comando de uma população mais reduzida porém, com um outro estilo de vida mais consentâneo com o que se pretende para a nova civilização a nosso serviço!

Após a concretização desse episódio, “a Confederação” terá que se convencer de que, em mais esse orbe tremula a bandeira do Dragão, sob o governo do Absoluto, “A Serpente Alada”!

Sem que ninguém dissesse uma palavra sequer, “O Canal” desfere outros três golpes com o caduceu e anuncia: “Em nome do “Absoluto”, está encerrada a sessão”! Vida longa à Estrutura!

Ao que, em uníssono, respondem os doze: Vida Longa!

Em seguida, pela porta escancarada, desaparecem os doze ilustres desconhecidos...

Amelius
Enviado por Amelius em 14/09/2014
Reeditado em 14/09/2014
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