327-PRÍNCIPE DESENCANTADO-Fábula da Familia Real

Era uma vez, num reino terras geladas e povo frio, um Príncipe Desencantado. Durante muito tempo fora um sapo horrendo, e, por artes do Mago Merlinho, viu-se, de repente, transformado em gente. E logo em príncipe! A surpresa de sua chegada ao reino foi motivo de muita fofoca, pois tanto o rei como a rainha, já tinham “passado do tempo” — como diziam as más línguas.

Na juventude, desajeitado e trapalhão, suas asneiras eram monumentais e tinham repercussão internacional.

Farrista, gostava de se apresentar diferente nas festas aos seus amigos do peito. Uma de suas grandes babaquices foi aparecer numa festa à fantasia vestindo uma camisa preta em cujas mangas suásticas nazistas se destacavam.

— Ora, meu príncipe, mas se foram os nazistas os inimigos mais terríveis que nosso rei já enfrentou — admoestou-o a camareira, quando foi instado a trocar de “fantasia”.

— Sorry, eu não sabia. — foi a resposta do imbecil príncipe.

Por uma desses caprichos que só acontecem em contos de fadas e bruxas, uma linda professora rural apaixonou-se pelo príncipe, sem saber que ele era um idiota consumado. O casamento foi realizado às pressas, sem muito protocolo, pois “Vai que o bestinha cisme de não querer casar”, conforme comentou o rei, conhecedor do QI e das tendências do príncipe.

Pompa e circunstância cercaram a realização do magno evento da casa real. Apesar da magnificência das cerimônias e festas, o encanto da professorinha pouco durou e a fidelidade do príncipe, menos ainda. O Príncipe Desencantado foi seduzido por uma bruxa que se transformara em nobre dama da corte. Em que pese as artes e magia da bruxa, era feia como o diabo, sem jeito, e já estava casada com outro nobre. Mais velha do que ele, o príncipe.

Vê-se bem que o Príncipe apaixonou-se pela mulher errada, na hora errada.

Mas nem tudo dá certo nas histórias, reais ou plebéias. Enquanto ele se declarava à sua amada bruxa disfarçada, a professora também aprontava das suas.

Ele estava tão cego de amor que declarou à bruxa travestida a sua grande paixão, dizendo que “desejava ser o absorvente da amada, para ficar sempre junto dela”. Nem o rei conseguiu segurar a língua, quando soube de tal declaração de amor.

— É um imbecil consumado. Ainda bem que não é meu filho.

Numa aventura amorosa, a princesa plebéia morreu em circunstâncias misteriosas. Todo mundo, mas todo mundo mesmo, viu no acidente que matou a rival, o dedo da bruxa nobre. Só o príncipe é que ficou surpreso, ou pelo menos, fingiu estar.

Apaixonado estava o príncipe pela loira matrona, a bruxa transformada em dama da corte. Mas não se decidia nunca se casar, era um lorpa consumado. Foi quando, trinta anos após se conhecerem, a bruxa deu o ultimato:

— Ou se casa comigo, ou faço você voltar a ser sapo. Melhor, vai virar rã pimenta e alguém vai gostar de saboreá-lo frito.

Ele concorda. De joelhos, a pede em casamento, depois de ter solicitado ao rei autorização para tanto. (Imaginem um homem de quase 60 anos, pedindo licença para se casar!)

Mas a bruxa, nobre dama e noiva real não consegue derrubar as regras da realeza. Como ela não é de linhagem real, isto é, não pertence a nenhuma das famílias abastardadas do reino, jamais poderá vir a ser rainha, quando o príncipe, por direito de herança, for alçado ao trono real. Embirra em ter um título, qualquer título de nobreza.

— Se não tiver um título, não caso. — Agora, quem estava em xeque era o rei.

— Ora, ora, isto é fácil de ser resolvido — O rei não titubeia em suas decisões. — Vamos dar a ela um título condigno. Vamos fazê-la duquesa.

— Mas, meu rei, duquesa de quê? — Indaga o príncipe debilóide.

— Ora, ora. Vejamos. Duquesa...duquesa. — Estalando os dedos, encontra a resposta. — É isso aí! Duquesa do Cornoalto.

E como acontece nas melhores histórias, reais ou plebéias, inventadas ou imaginadas, o Príncipe Desencantado e a Duquesa de Cornoalto casaram-se e foram felizes para sempre.

ANTONIO GOBBO = BELO HORIZONTE,

12 DE FEVEREIRODE 2005

CONTO # 327 DA SÉRIE MILISTÓRIAS

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 23/07/2014
Reeditado em 23/07/2014
Código do texto: T4893759
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