NASCIMENTO
Os raios chicoteavam a noite. Árvores dançavam com o vento e beijavam-se a cada toque. A sinfonia da natureza formava quadro de belas imagens, ainda que assustadoras.
Na montanha, o eco, de bocarra atenta, reverberava o trovão.
Quando mais um estrondo seguiu-se ao raio, abriu-se o ventre da terra, e o bebê misturou seu grito de vitória aos murmúrios da noite, balançando a estrutura frágil da cabana. O azul que escorria do céu pintou as paredes do quarto, onde a luz tênue bruxuleava.
O silêncio gritou. Era sua vez, cessada a voz da natureza. Agora, somente o choro suave do recém-nascido era escutado. Nem mesmo pai e mãe ousavam falar. A vez era de quem chegava, olhos ainda fechados para o mundo. Nem a parteira expunha seu veridito, ante o pasmo dos presentes e o brilho nos olhos de cada um. O ser admirado tinha faces de anjo, corpo de animal aquático, pés de árvore, pescoço de girafa.
Quando abriu os olhos, o clarão torturou os olhares. O rugido de vendaval voltou a barulhar a calada da noite.
Os assistentes quiseram gritar, mas o som rastejou pelo chão e diluiu-se pelas frestas da porta.
O menino levantou-se, soprou a parede, por ela saiu para a noite e foi engolido pela escuridão.
Somente eu vi onde se escondeu.