O Abismo

Eu corri.

Como uma criança. Desesperado. Assustado. Não conseguindo equilibrar o peso de meu pequeno corpo sobre meus pés. Os passos rápidos deixavam um caminho de lágrimas para trás, ligando meu novo eu ao cume da colina.

Mas foi quando a maturidade veio me abraçar. Aos poucos meus passos iam ficando mais cautelosos, tranquilos, pensativos. As lágrimas não secavam, mas se privavam para momentos mais oportunos. Enquanto isso, meus olhos, agora calmos, se voltavam novamente para o cume.

"Estava chorando?" Pensava. "Mas... Por quê? Não era lá que queria chegar esse tempo todo?"

Voltei.

Por uma segunda vez eu precisava enxergar aquilo que havia depois da colina. Eu precisava entender. Havia entrado nessa aventura há tanto tempo, não fazia sentido simplesmente voltar chorando depois de chegar ao meu objetivo.

Eu caminhei novamente. Com mais cautela, porém com maior determinação.

Pela segunda vez então eu encarei o Abismo.

Não era um simples abismo, como outro qualquer. Não. Era infinito. Incrível. Surpreendente. Não era necessário cair nele para ser devorado pela escuridão.

Doeu.

Muito.

Minhas pupilas dilataram, os pulmões expandiram, as mãos soaram, as pernas ficaram bambas. Aquele Abismo era a representação perfeita de TODOS os abismos.

Como se tudo aquilo pelo que lutei não fazia mais sentido algum.

Sentei-me à beira do Abismo. Os pés balançando. Sabia que bastava uma brisa para me jogar de cabeça para dentro daquele gigante natural. Eu só não me importava mais.

Fechei os olhos e esperei então a tal brisa me acertar.

Antes que fosse jogado, no entanto, escutei algo diferente. Me esforcei para levantar-me com rapidez. O ponto mais alto da colina era o também o ponto mais alto do mundo. Olhei para trás e então eu vi.

Centenas de pessoas perambulavam pelos caminhos abaixo de mim. A escuridão das planícies, afastadas do brilho do Sol devido à imensidão da colina, cegava-as.

Foi quando finalmente entendi. Elas queriam seguir o mesmo caminho. Elas queriam enxergar o abismo. Mas se encontrassem ele da mesma forma que encontrei, sem realmente entender o caminho que os levou até lá... Seria a morte para muitos.

Talvez eu tenha sido forte para aguentar até aqui, mas e essas pessoas? Também serão? Não tenho tanta certeza.

Encarei então o abismo mais uma vez. Uma última vez. Para que sua imagem ficasse eternizada em minha mente.

Assim sendo, acendi uma tocha e voltei. Eu agora sou a luz para os viajantes do caminho do conhecimento.

Que um dia eu possa levar mais alguém comigo para o Abismo da Consciência! Não para nos jogarmos, mas para que possamos apreciar sua imensidão assustadora e magnífica.