Naquele Mundo de Barcos
Naquele mundo repartido por águas tecendo sobre a crosta múltiplas faces, cada porção que abrigava vida era um barco lentamente navegando sem cessar. Os principais habitantes, seres pensantes, possuíam a distrair-lhes inúmeras obrigações, pois possuíam roupas de carne que demandavam cuidados permanentes. Quem não trabalhava não vivia bem, e, mesmo assim, havia os que preferiam habitar a vadiagem das horas a serem servidores dos poderosos arquitetos dos seus destinos.
Naquela sociedade estratificada em muitas posições não faltava trabalho e nem o que fazer, mas muitos reclamavam da carência real de oportunidades, embora ¨ quem procure as encontre ¨: era a afirmação de um dito popular pintado em pedras de lei. Essas pedras, ostentadas aqui e acolá, ditas sagradas, afirmavam muitas coisas, definiam padrões de conduta e regras a ser observadas. ¨ Haviam caído do céu ¨, afirmavam os mais antigos, mas ninguém nunca mais viu caírem outras.
Há de todo tipo de gente e, em algum momento, todos deverão deixar a embarcação em que navegam em algum porto ignorado entrando por um corredor escuro sem saber ao certo o que há do lado de lá... E é esse o maior temor que habita os seres de carne.
Contam histórias terríveis sobre os portos e sobre o que há além dos portos, e alguns acreditam que, se forem bons, irão para locais onde tudo sobre e a abundância reine, mas há uma lenda que diz que os maus serão deixados em prisões e deverão arar terras onde somente brotam pedras, fogo e enxofre.
Ninguém diz saber ao certo, embora muitos tenham trazidos notícias, mas ninguém crê neles de fato a sanar todas as dúvidas, pois as novidades são trazidas por sonhos, por delírios e por conversarem com seres invisíveis que afirmam que um dia, também, usaram roupas de carne. Tudo isso, no entanto, é tão fantástico que habita os campos da incredulidade.
Em todos os portos que se atraca bate uma aflição, não sabendo quem deverá ficar. Sendo arrebatados com tal força que tudo devem deixa. E isso também gera pavor, pois se dá com qualquer um, sem aviso prévio, podendo tanto ir os úteis quanto os inúteis. E ninguém sabe o que move tal escolha e nem quem é que escolhe. E há alguns que acumularam grande fortuna, que habitam vastas cabines, que vivem no luxo. Esses são os que mais temem deixar a vida que levam, pois amam as coisas passageiras que compraram. Mas eu vos pergunto: quem é dono de quem?
Em cada novo porto, há também um mistério, pois chegam outros que nada sabem fazer e que tem de aprender de tudo. E, àqueles que se unem a outros, e fazem amor, vez por outra lhes é dado um que não sabe fazer nada, para que dele cuidem até que aprenda o essencial até que esteja forte e apto a viver por si, pois os que chegam são pequenos e famintos, frágeis, quase cegos e de tudo dependentes, sendo que somente serão livres ao completarem a maioridade, que varia de barco a barco, pois cada um criou suas leis, além das leis sagradas, mas que sempre conta muitos anos.
E perguntam os que fizeram amor por que dessa prática colhem filhos, mas ninguém sabe ao certo responder, mas há meios de evitar os filhos e descobriram que há épocas propícias para atraí-los ou não atraí-los, mas há os que gostam dessa história de ter filhos e os atraem, mesmo sabendo dos trabalhos, das dificuldades e atribulações. E outros lhes perguntam:
- Por que quereis ter filhos?
E responde mil coisas: por que terminam se parecendo conosco e nos fazem lembrar de nós mesmos. Ou então: fazem que brotem dentro da gente uma coisa esquisita, um sentimento de bem-querer, de querer doar e proteger e sofrendo por eles vamos desaprendendo a sofrer apenas por nós e isso parece ser bom... Mas ninguém sabe ao certo, pois nenhum administrador aparece para esclarecer.
E eis que o que parecia uma punição, um fardo, torna-se para muitos o motivo de vida e passam a amar os filhos como se lhes pertencessem e acreditam que deixarão os barcos antes dos filhos, mas os supostos administradores dos portos, dos navios e das terras os surpreendem e, por vezes, tomam-lhes os filhos arrebatando-os do barco e levando-os para destinos incertos. E nisso há muita dor, muito choro e até loucura. Alguns, antes não queriam os filhos, mas eis que se tornaram o seu motivo de vida. Urge que muitas vezes os filhos precisam partir antes, porém, o mais frequente é que os mais antigos o façam. De qualquer forma, quem aprende a querer bem a outro, quando é deixado, colhe muita dor.
Quem compreende os habitantes dos barcos e as suas aflições?
O fato é que todos navegam. Ninguém nunca viu um administrador, muito menos uma daquelas terras, mas como os barcos existem, também tendo as chegadas e as partidas nos portos, crê-se que alguém administra tudo isso e que além dos portos haja algo. Algumas naus são gigantescas. Delas podemos ver outras. Todas são divididas em partituras, tendo espaço suficiente para que existam montanhas, vales e até rios ou mares, sendo que resolveram chamar suas divisões de nações.
E seguem navegando. Alguns desistiram e apenas vivem, se alimentam, dormem e partem quando chega a sua hora. Outros, no entanto, cultivam em secreto uma esperança: de que um dia lhes apareça um administrador, que tudo lhes explique, para que a vida possa fazer, enfim, algum sentido além do balançar nos barcos...
Naquela sociedade estratificada em muitas posições não faltava trabalho e nem o que fazer, mas muitos reclamavam da carência real de oportunidades, embora ¨ quem procure as encontre ¨: era a afirmação de um dito popular pintado em pedras de lei. Essas pedras, ostentadas aqui e acolá, ditas sagradas, afirmavam muitas coisas, definiam padrões de conduta e regras a ser observadas. ¨ Haviam caído do céu ¨, afirmavam os mais antigos, mas ninguém nunca mais viu caírem outras.
Há de todo tipo de gente e, em algum momento, todos deverão deixar a embarcação em que navegam em algum porto ignorado entrando por um corredor escuro sem saber ao certo o que há do lado de lá... E é esse o maior temor que habita os seres de carne.
Contam histórias terríveis sobre os portos e sobre o que há além dos portos, e alguns acreditam que, se forem bons, irão para locais onde tudo sobre e a abundância reine, mas há uma lenda que diz que os maus serão deixados em prisões e deverão arar terras onde somente brotam pedras, fogo e enxofre.
Ninguém diz saber ao certo, embora muitos tenham trazidos notícias, mas ninguém crê neles de fato a sanar todas as dúvidas, pois as novidades são trazidas por sonhos, por delírios e por conversarem com seres invisíveis que afirmam que um dia, também, usaram roupas de carne. Tudo isso, no entanto, é tão fantástico que habita os campos da incredulidade.
Em todos os portos que se atraca bate uma aflição, não sabendo quem deverá ficar. Sendo arrebatados com tal força que tudo devem deixa. E isso também gera pavor, pois se dá com qualquer um, sem aviso prévio, podendo tanto ir os úteis quanto os inúteis. E ninguém sabe o que move tal escolha e nem quem é que escolhe. E há alguns que acumularam grande fortuna, que habitam vastas cabines, que vivem no luxo. Esses são os que mais temem deixar a vida que levam, pois amam as coisas passageiras que compraram. Mas eu vos pergunto: quem é dono de quem?
Em cada novo porto, há também um mistério, pois chegam outros que nada sabem fazer e que tem de aprender de tudo. E, àqueles que se unem a outros, e fazem amor, vez por outra lhes é dado um que não sabe fazer nada, para que dele cuidem até que aprenda o essencial até que esteja forte e apto a viver por si, pois os que chegam são pequenos e famintos, frágeis, quase cegos e de tudo dependentes, sendo que somente serão livres ao completarem a maioridade, que varia de barco a barco, pois cada um criou suas leis, além das leis sagradas, mas que sempre conta muitos anos.
E perguntam os que fizeram amor por que dessa prática colhem filhos, mas ninguém sabe ao certo responder, mas há meios de evitar os filhos e descobriram que há épocas propícias para atraí-los ou não atraí-los, mas há os que gostam dessa história de ter filhos e os atraem, mesmo sabendo dos trabalhos, das dificuldades e atribulações. E outros lhes perguntam:
- Por que quereis ter filhos?
E responde mil coisas: por que terminam se parecendo conosco e nos fazem lembrar de nós mesmos. Ou então: fazem que brotem dentro da gente uma coisa esquisita, um sentimento de bem-querer, de querer doar e proteger e sofrendo por eles vamos desaprendendo a sofrer apenas por nós e isso parece ser bom... Mas ninguém sabe ao certo, pois nenhum administrador aparece para esclarecer.
E eis que o que parecia uma punição, um fardo, torna-se para muitos o motivo de vida e passam a amar os filhos como se lhes pertencessem e acreditam que deixarão os barcos antes dos filhos, mas os supostos administradores dos portos, dos navios e das terras os surpreendem e, por vezes, tomam-lhes os filhos arrebatando-os do barco e levando-os para destinos incertos. E nisso há muita dor, muito choro e até loucura. Alguns, antes não queriam os filhos, mas eis que se tornaram o seu motivo de vida. Urge que muitas vezes os filhos precisam partir antes, porém, o mais frequente é que os mais antigos o façam. De qualquer forma, quem aprende a querer bem a outro, quando é deixado, colhe muita dor.
Quem compreende os habitantes dos barcos e as suas aflições?
O fato é que todos navegam. Ninguém nunca viu um administrador, muito menos uma daquelas terras, mas como os barcos existem, também tendo as chegadas e as partidas nos portos, crê-se que alguém administra tudo isso e que além dos portos haja algo. Algumas naus são gigantescas. Delas podemos ver outras. Todas são divididas em partituras, tendo espaço suficiente para que existam montanhas, vales e até rios ou mares, sendo que resolveram chamar suas divisões de nações.
E seguem navegando. Alguns desistiram e apenas vivem, se alimentam, dormem e partem quando chega a sua hora. Outros, no entanto, cultivam em secreto uma esperança: de que um dia lhes apareça um administrador, que tudo lhes explique, para que a vida possa fazer, enfim, algum sentido além do balançar nos barcos...